Colaboração empresarial

AGU e associações divergem sobre acordos de leniência na "lava jato"

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21 de fevereiro de 2015, 16h23

O Advogado-Geral da União, ministro Luís Inácio Adams, está confiante de que o instituto do acordo de leniência pode fortalecer as investigações iniciadas com a operação "lava jato". A vantagem vista por Adams, no entanto, não é bem vista para três associações que buscam impedir os acordos celebrados pela Controladoria-Geral da União.

Adams considera vantajoso para o país adotar o acordo de leniência, previsto na Lei de Combate à Corrupção (Lei12.846/2013). Acredita que desta forma o curso legal dos processos e as sanções definidas terão efetividade. "O acordo de leniência não gera impunidade. Pelo contrário, ele fortalece a investigação", afirma. 

Previsto na Lei de Combate à Corrupção, o acordo já foi utilizado em pelo menos 49 casos de cartelização analisados pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). De acordo com o ministro Adams, o ato administrativo é adotado no mundo todo de modo a melhorar as relações do setor privado com o Estado em situações flagrantes de crime e desvio de verba pública. 

"O acordo de leniência é uma solução para uma penalização administrativa, não tem nenhuma função na área penal, não isenta o criminoso, não impede a produção de provas. É um instrumento que na verdade potencializa a investigação porque coloca a empresa como agente colaborador para o Estado. Esse é o requisito para o acordo. Se a empresa não colaborar com a investigação, o acordo cai", destaca o Advogado-Geral da União. 

Para a União, a conduta em prol das investigações é o caminho para a recuperação dos recursos desviados. A experiência passada, segundo o ministro Adams, é de que todas as empresas consideradas inidôneas fecharam as portas. "Isso inviabilizou o ressarcimento — até agora não se obteve, porque o patrimônio (da empresa) deixou de existir —, não ajudou na investigação e apuração de responsáveis — ainda não foram sequer julgadas as ações penais e ações cíveis já propostas —, e não mudou a prática (corruptível). A prática muda com a mudança de comportamento das empresas, e as que estão aí (sendo investigadas na 'lava jato') têm que ser submetidas a essa mudança de prática", avalia.

Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr
Adams (foto) também esclarece que é a lei que prevê o afastamento da inidoneidade para as companhias investigadas, além de reduzir eventual multa que venha a ser aplicada. "Eu considero que tem um outro elemento que está adjacente ao processo de leniência que é a própria empresa buscar resgatar sua credibilidade. Ou seja, o processo de punição não é o processo de morte, é um processo de punição e é um processo de resgate", acrescenta.

Papel dos órgãos públicos
O ministro Adams considera que a discussão em torno do acordo de leniência é um grande teste para a nova legislação a fim de reverter irregularidades em obras e serviços públicos, como os casos descobertos pela "lava jato". Segundo ele, é preciso ficar claro que a Lei de Combate à Corrupção enfrenta o delito no âmbito administrativo. 

"O processo penal continua e continuará, e as provas que forem carreadas levarão à condenação ou à absolvição dos acusados. No caso do acordo de leniência, é a empresa que é o objeto de punição. A empresa responde pela ação de seus funcionários seja de que grau for, seja de que nível de comando que ele tiver. Dentro dessa dimensão é que é tratada essa novidade no âmbito do combate à corrupção", ressalta. Assim, o Advogado-Geral espera que os institutos criminais e cíveis atuem de forma colaborativa em torno do resultado das investigações.

Ele recorda, ainda, que as atribuições dos órgãos têm legislações específicas. No âmbito da improbidade administrativa, atuam a AGU e o Ministério Público Federal, conforme a Lei  8.429/1992. Já em relação à Lei de Combate à Corrupção (Lei 12.846/2013), atua a CGU, responsável por receber e analisar, inclusive, os pedidos de acordo de leniência. A competência de apuração das participações em irregularidades e ressarcimento ao erário é do Tribunal de Contas da União, de acordo com a Constituição Federal, diretamente, e a Lei 8.443/1992.

Contra os acordos
“Em defesa da operação 'lava jato'", três entidades apresentaram ao Ministério Público de Contas preocupações em relação a possíveis acordos de leniência celebrados pela CGU com as empresas investigadas. O procurador Júlio Marcelo de Oliveira, do Ministério Público de Contas junto ao TCU, acatou a argumentação e e encaminhou a representação ao presidente da corte, ministro Aroldo Cedraz.

Os questionamentos que ocasionaram a representação do procurador foram manifestados pela Associação Contas Abertas, a Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil e a Associação da Auditoria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União. O objetivo é impedir qualquer homologação de acordos que venham ser celebrados entre o Poder Executivo da União e as pessoas jurídicas de direito privado envolvidas na "lava jato".

Entre os argumentos da representação, o procurador destacou que os acordos ferem “a divisão harmônica dos poderes e competência entre os diversos órgãos da República que estando uma operação em curso, conduzida pelo Ministério Público Federal com suporte da Polícia Federal, com amplas repercussões cíveis e penais, possa um órgão do Poder Executivo, com esfera de atuação muito mais limitada, atravessar a operação para celebrar acordos de leniência que tenham por substrato fático o mesmo conjunto de fatos já investigados pelo Ministério Público Federal”,explica.

Dessa forma, para Oliveira, a possibilidade da celebração de acordos de leniência pela CGU no âmbito da "lava jato" só faz sentido para aquelas pessoas jurídicas que já fizeram acordos desse tipo com o próprio Ministério Público Federal, o que traria para o colaborador que efetivamente trouxe ganhos para investigação benefícios correspondentes e merecidos na esfera administrativa.

“Já o contrário não faz sentido”, afirma. Para o procurador, admitir uma ampla possibilidade de acordos de leniência celebrados pela Controladoria com empresas envolvidas nas operações em curso no MPF acarreta tanto insegurança jurídica para as entidades, quanto problemas em relação ao avanço e sucesso das investigações.

Tendo em vista os argumentos, Oliveira pediu que o TCU determine à CGU que se abstenha de celebrar quaisquer acordo de leniência com o Ministério Público Federal. “De modo a evitar que se celebrem acordos que possam atrapalhar o curso das investigações dessa importante operação e que se premiem as empresas que deram contribuição efetiva para o desmantelamento da organização criminosa acusada de saquear os cofres da maior empresa do Brasil”, aponta. Com informações das assessorias de imprensa da AGU e da Associação Contas Abertas.

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