Delação premiada

"Acordos de leniência são fonte de insegurança jurídica no país", diz advogado

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16 de fevereiro de 2015, 9h54

“Acordos de leniência são fonte de insegurança jurídica no país”, afirma o advogado Sebastião Tojal, professor de Direito Administrativo da Faculdade de Direito da USP.  Ele falou na quinta-feira (12.2) em evento na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

No debate, que teve como tema a comparação entre os sistemas de leniência no Brasil e nos EUA, Tojal criticou a disseminação das delações premiadas no país. Para ele, sob o pretexto de respeitar o “clamor popular” e obter resultados, algumas entidades estão passando por cima das instituições e ignorando a Constituição, as leis e os princípios jurídicos.

Como exemplo, ele citou um episódio ocorrido quando o Supremo Tribunal Federal julgava a validade da contribuição dos inativos para a previdência social. Conforme o professor da USP recordou, na ocasião, o ministro Celso de Mello fazia uma defesa intransigente de princípios dos Direitos Público e Constitucional – como o direito adquirido – para argumentar a impossibilidade de Emenda Constitucional atingir os inativos e passar a cobrar contraprestações deles. No meio dessa discussão, o então presidente da corte, Nelson Jobim, pegou uma calculadora e passou a demonstrar que, se o sistema de financiamento não mudasse, a conta não iria fechar. A divergência entre os dois ministros, segundo Torjal, simbolizava o conflito entre o respeito às formas jurídicas e a busca por resultados. E esta acabou prevalecendo, disse.

O especialista em Direito do Estado ainda apontou a fragilidade das partes que se sujeitam a acordos de leniência com relação ao órgão negociador: “A capacidade de barganha é mínima. Só há submissão”. E ele falou que é preciso criar parâmetros mínimos para as multas impostas às empresas, sob pena de prevalecer a arbitrariedade na definição das quantias.

Brasil x EUA

O outro participante da mesa de debate, o ex-procurador da República José Roberto Santoro, opinou que o problema do Brasil é que existem três sistemas de leniência que não se comunicam: o da Lei 12.850/2013, que trata das delações premiadas em âmbito penal, o da Nova Lei Antitruste (Lei 12.529/2011), que cuida dos acordos de leniência referentes a infrações concorrenciais e de mercado, e o da Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013), que diz respeito a quem comete atos contra a Administração Pública.

Para resolver esse entrave, Santoro sugeriu que o Brasil adote o instituto da “carta de leniência”, que existe nos EUA. Lá, os órgãos emitem esse documento quando celebram um acordo de colaboração, e os enviam às demais autoridades que têm competência para firmar compromissos do tipo. Dessa forma, se, por exemplo, a SEC (órgão equivalente à CVM) for oferecer benefícios em contrapartida a confissões de alguém que tem um acordo de natureza penal, deverá respeitar os termos previamente estabelecidos pelo órgão criminal.

Também é preciso definir a competência dos acordos de leniência feitos sob a Lei Anticorrupção, afirmou o ex-procurador da República: “Quem faz a leniência da Lei Anticorrupção? Sem a regulamentação, não se sabe. Por exemplo: crimes de cartel agora são apurados pela Justiça Estadual, de acordo com decisão do STF. Mas qual órgão judicial vai fazer? Em que estado? No da sede da empresa ou onde ela articulou o cartel? Precisamos de um eixo que organize esses diversos sistemas”.

Mesmo com essas ressalvas, o ex-procurador da República fez questão de dizer que o sistema brasileiro de leniência é “tão bom quanto” o norte-americano, e discordou de Tojal ao avaliar que a prática “tem se mostrado vantajosa para a acusação e para a defesa”.

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