Reflexões Trabalhistas

Questão de honorários na Justiça do Trabalho precisa ser repensada

Autor

  • Raimundo Simão de Melo

    é consultor Jurídico advogado procurador regional do Trabalho aposentado doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP professor titular do Centro Universitário do Distrito Federal-UDF/mestrado em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho e autor de livros jurídicos.

13 de fevereiro de 2015, 7h00

Spacca
A concessão dos honorários advocatícios na Justiça do Trabalho está “regulada” pela Súmula 219 do Tribunal Superior do Trabalho, que assim preceitua:

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. HIPÓTESE DE CABIMENTO
I – Na Justiça do Trabalho, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, nunca superiores a 15% (quinze por cento), não decorre pura e simplesmente da sucumbência, devendo a parte estar assistida por sindicato da categoria profissional e comprovar a percepção de salário inferior ao dobro do salário mínimo ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família.
II – É cabível a condenação ao pagamento de honorários advocatícios em ação rescisória no processo trabalhista. 
III – São devidos os honorários advocatícios nas causas em que o ente sindical figure como substituto processual e nas lides que não derivem da relação de emprego.

Como se vê, as hipóteses de concessão de honorários advocatícios na Justiça trabalhista não decorrem da sucumbência, mas, como regra, é concedida:

a) a favor do sindicato, quando o empregado estiver por ele assistido e receber  salário inferior ao dobro do salário mínimo ou, ganhando importância superior, encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família;

b) nas ações rescisórias;

c) quando o sindicato figurar como substituto processual dos trabalhadores.

Por último, o TST pacificou entendimento, assegurando a verba honorária nas ações acidentárias ajuizadas na Justiça comum, que vieram para a Justiça do Trabalho, sob o fundamento de que lá era obrigatória a contratação de advogado, como se vê da ementa seguinte:

EMENTA: DANOS MORAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AJUIZAMENTO NA JUSTIÇA COMUM. A matéria já se encontra pacificada no âmbito desta e. Subseção que, em 27/5/2010, ao apreciar o Processo nº. TST-E-ED-RR-9954400-51.2005.5.09.0091, pacificou o entendimento de que, ajuizada a ação na Justiça Comum, quando ainda havia controvérsia acerca da competência da Justiça do Trabalho para julgar os pedidos de indenização decorrentes de acidente de trabalho, a condenação em honorários advocatícios prescindiria do atendimento dos requisitos da Lei n.º 5.584/1970. Recurso de embargos conhecido e improvido (Recurso de Revista n° TST-E-RR-50200-75.2005.5.02.0221,5ª Turma, Rel. Min. Horácio Raymundo de Senna Pires, publicado em 29/04/2011).

Com a EC 45/2004 foi ampliada a competência da Justiça do Trabalho para apreciar outras matérias não estritamente trabalhistas, sendo, nelas assegurada a verba honorária pela sucumbência.

O fundamento para esse entendimento, como parece, continua sendo o jus postulandi nessa Justiça especializada, o qual não existe mais na prática, mas, apenas na teoria. Pode-se exemplificar com as complexas ações acidentárias, nas quais não é possível que as vítimas façam uso desse ultrapassado instituto nem os réus tenham condições de se defender! Como pessoas leigas não têm como fazer adequadamente os pedidos de indenizações/compensações por danos material, moral, estético e pela perda de uma chance, embasando-os no direito, na doutrina e na jurisprudência. Como vão recorrer ou contrariar o recurso da parte contrária em matéria tão técnica como a da responsabilidade civil, se até mesmo os advogados encontram dificuldades para enfrentar essa e outras novas questões que hoje são decididas pela Justiça trabalhista?

Por isso, entendo que está na hora de se repensar essa questão e mudar a clássica jurisprudência. Não dá mais para continuar pensando a atual Justiça do Trabalho como aquela de 1943, quando os pedidos eram simples e poderiam ser feitos pelos trabalhadores num balcão do fórum trabalhista. Não é mais possível continuar pensando assim, principalmente depois da EC 45/2004, que ampliou sobremaneira a competência dessa Justiça para apreciar tantas outras questões complexas, que são impossíveis de manejo pelo jus postulandi.

Hoje, pelo artigo 389 do Código Civil, o conceito de indenização integra, além dos juros de mora e da correção monetária, os honorários de advogado, exatamente para se recompor da melhor maneira possível a lesão praticada contra a vítima. Esses honorários, diferentemente da sucumbência, que tem natureza processual, fazem parte da recomposição do patrimônio lesado e têm natureza restitutiva.

O artigo 404 do mesmo Código diz que: “As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional”. Sem honorários advocatícios não há como valorizar o advogado e sem advogado não há acesso substancial ao Judiciário.        

O receio de que o trabalhador possa perder a ação e ser condenada em honorários de advogado não pode ser empecilho à concessão da verba honorária advocatícia na Justiça do Trabalho, pois é escolha dele a contratação de um advogado particular. Depois, ele pode pedir o benefício da assistência judiciária gratuita na forma da Lei 1.060/1950 — artigo 2º, parágrafo único, que inclui os honorários de advogado (artigo 3º, inciso V).

Ao contrário do entendimento restritivo do TST sobre a verba honorária, tem se posicionado o STJ, que entende que o empregado pode cobrar honorários advocatícios de empresa pela contratação de advogado, para mover uma ação trabalhista, in verbis:

EMENTA: … HONORÁRIOS CONVENCIONAIS. PERDAS E DANOS. PRINCÍPIO DA RESTITUIÇÃO INTEGRAL. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO CÓDIGO CIVIL. 1. … 2… 3… 4. Os honorários convencionais integram o valor devido a título de perdas e danos, nos termos dos arts. 389, 395 e 404 do CC/02. 5. O pagamento dos honorários extrajudiciais como parcela integrante das perdas e danos também é devido pelo inadimplemento de obrigações trabalhistas, diante da incidência dos princípios do acesso à justiça e da restituição integral dos danos e dos arts. 389, 395 e 404 do CC/02, que podem ser aplicados subsidiariamente no âmbito dos contratos trabalhistas, nos termos do art. 8º, parágrafo único, da CLT (RESp. nº 1.027.797 – MG (2008/0025078-1), Rel. Min. Nancy Andrighi).

Autores

  • Brave

    é consultor jurídico e advogado. Procurador Regional do Trabalho aposentado. Doutor e Mestre em Direito das relações sociais pela PUC/SP. Professor de Direito e de Processo do Trabalho. Membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho. Autor de livros jurídicos, entre outros Direito ambiental do trabalho e a saúde do trabalhador.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!