Justiça Tributária

A evolução do Brasil, o fim da corrupção e a união das pessoas de bem

Autor

  • Raul Haidar

    é jornalista e advogado tributarista ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

28 de dezembro de 2015, 7h00

Spacca
Em nossa coluna de 8 de dezembro de 2014 comemoramos o Dia da Justiça e afirmamos que o trabalho da deusa Themis é muito simples: basta dar a cada um o que é seu. Registramos na ocasião que as relações entre o poder público e os contribuintes implicam num rol de obrigações recíprocas, em que cada uma das partes deve cumprir o seu dever.

Exatamente um ano depois, do dia 9 deste mês, encontramos no jornal O Estado de S. Paulo manifestação denominada “O fim da corrupção”, feita pelo Sindicato dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo (Sinafresp). Através desse documento, a entidade conclama toda a sociedade para, na data que se denomina Dia Internacional Contra a Corrupção, seja promovida uma grande união em torno dos princípios de Justiça Tributária que vimos pregando neste espaço.

Todos nós sabemos ser consistente e legítimo esse manifesto. A sonegação e a corrupção são verdadeiros cancros que ao longo de nossa história tem prejudicado a todos e devem ser extirpados. Também deve ser reconhecido o fato de que a prática de atos ilícitos por parte de servidores públicos é exceção.

Parece-nos, contudo, que no relacionamento entre Fisco e contribuinte há certos procedimentos que precisam ser revistos para que seja construído um ambiente de respeito recíproco que instaure entre as partes uma harmonia ainda ausente.

O contribuinte não pode e não deve temer o agente fiscal e este não pode comportar-se como inimigo daquele. Lamentavelmente há diversas situações em que o servidor fazendário chega a afastar-se de normas legais que lhe permitem orientar o sujeito passivo da obrigação, preferindo aplicar-lhe penalidades. Seria o mesmo que o pai desejasse educar o filho apenas à custa de surras, o que por certo não é a melhor pedagogia.

Em nossa coluna de 24 de março de 2014 sob o título Autuações sobre ICMS traem Constituição e sistema legal tivemos a oportunidade de registrar que:

“Sempre foi tradição, na legislação fiscal paulista, que as eventuais irregularidades de natureza fiscal, que não impliquem em falta ou atraso no recolhimento de tributo, pudessem ser corrigidas sem qualquer penalidade, mediante prévia notificação ao contribuinte.

Essa tradição está contida na Instrução CAT 10/68 de 18/12/68 e reconhecida pelo artigo 52 do decreto 46.674/2002, que regulou a Lei 10.941/2001, que trata do processo administrativo tributário. Realmente, diz o artigo 52 do decreto 46.674, regulamentando o artigo 66 da lei 10.941/2001:

“Art. 52 – O auto de infração pode deixar de ser lavrado, nos termos de instruções expedidas pela Secretaria da Fazenda, desde que a infração não implique falta ou atraso de pagamento de imposto.”

Portanto, não poderia ser lavrado o auto, que não indica qualquer  “falta ou atraso de pagamento de imposto” , eis que o ato administrativo deve pautar-se pelas normas constitucionais já mencionadas.

Nesse sentido é a jurisprudência do Tribunal de Impostos e Taxas deste estado,  como se vê, nas seguintes decisões:

“IRREGULARIDADE DE ESCRITURAÇÃO – Falta que não redundou em não recolhimento do tributo – Apelo provido – Decisão unânime – Processo DRT-1 nº 18983/77 – 3ª. Câmara – Rel Jamil Zantut.” (Ementário TIT, 1981, Secretaria da Fazenda, pág. 178).”

Todos temos o maior interesse em trilhar o caminho da seriedade. Mas não parece razoável que para isso tenhamos que nos sujeitar a autuações injustas, desproporcionais com falhas administrativas que na maioria dos casos deve-se à excessiva burocracia das repartições fazendárias. Em nosso Estado existe a Lei Complementar Estadual 939 de 3 de abril de 2003, à qual foi dado o nome de Código de Direitos do Contribuinte e que na prática é pouco observada. Diz o seu artigo 2º:

Artigo 2º — São objetivos do Código:
I — promover o bom relacionamento entre o fisco e o contribuinte, baseado na cooperação, no respeito mútuo e na parceria, visando a fornecer ao Estado os recursos necessários ao cumprimento de suas atribuições;
II — proteger o contribuinte contra o exercício abusivo do poder de fiscalizar, de lançar e de cobrar tributo instituído em lei;
III — assegurar a ampla defesa dos direitos do contribuinte no âmbito do processo administrativo-fiscal em que tiver legítimo interesse;
IV — prevenir e reparar os danos decorrentes de abuso de poder por parte do Estado na fiscalização, no lançamento e na cobrança de tributos de sua competência;
V — assegurar a adequada e eficaz prestação de serviços gratuitos de orientação aos contribuintes;
VI — assegurar uma forma lícita de apuração, declaração e recolhimento de tributos previstos em lei, bem como a manutenção e apresentação de bens, mercadorias, livros, documentos, impressos, papéis, programas de computador ou arquivos eletrônicos a eles relativos;
VII — assegurar o regular exercício da fiscalização.

Na prática os contribuintes não estão recebendo o tratamento fixado na lei. Isso não lhes permite a prática de qualquer ato ilícito, mas fixa uma barreira de má vontade entre as partes, que precisa ser rompida a bem da harmonia social que deve prevalecer.

O Sinafresp está de parabéns pela sua posição e por cerrar fileiras em torno de outras entidades sociais empenhadas na mesma luta, como o Ministério Público, a Ordem dos Advogados do Brasil, a Maçonaria e outras mais. Acreditamos que tal manifesto poderia servir para iniciar um grande debate público que resulte na procura pelo aperfeiçoamento da legislação tributária que deve se preocupar também em incentivar o empreendedor, além, é claro, de punir uns e outros que se dediquem a ilícitos.

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    é jornalista e advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

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