Opinião

O desafio de ser um grande advogado no país dos bacharéis

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28 de dezembro de 2015, 9h56

[Artigo originalmente publicado no jornal Folha de S.Paulo desta segunda-feira (28/12) com o título O desafio de ser um grande advogado]

Calcula-se que o Brasil deveria ter 50% mais engenheiros para fazer frente às necessidades no campo da infraestrutura. Na medicina, a falta de mão de obra, agravada pela má distribuição regional, fez o governo importar profissionais. Em tecnologia de informação também falta gente.

Já em Direito somos campeões mundiais. Há mais de 900 mil advogados no Brasil. Nos últimos dez anos, período em que a população aumentou 19%, o número de advogados cresceu 56%. Estados Unidos e Índia ganham em números absolutos, mas em advogados por 100 mil habitantes dá Brasil.

Em 1990, tínhamos 200 faculdades de Direito. Agora, são 1,2 mil. Com menos de 3% da população mundial, o país possui mais escolas do que o resto do mundo — somado! Um em cada nove universitários brasileiros se forma em Direito. Ao lado de Administração, é a carreira que mais produz bacharéis.

Um dos motivos da explosão está na versão anterior do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), que, nos últimos cinco anos, praticamente custeou o curso de um quarto dos universitários. Até 2015, quando foi modificado, montar uma faculdade havia se tornado um negócio de lucro alto e risco desprezível. Várias escolas de Direito surgiram nessa fase.

Outro motivo é o sonho de prestar um concurso público de salário inicial entre R$ 15 mil e R$ 24 mil, exclusivo para bacharéis em Direito: delegado de polícia, promotor, juiz.

Há ainda as razões subjetivas. Grandes advogados, procuradores e juízes integram nosso cotidiano. Na TV, aparecem tanto na ficção quanto nos telejornais, nas coberturas das operações da Polícia Federal. Nas transações comerciais importantes, lá estão eles. Nas fusões, aquisições, liquidações. Nas disputas tributárias, societárias, nos divórcios dos ricos e famosos.

A profissão é tão sólida que a Análise Editorial criou há dez anos o anuário Análise Advocacia 500. Ele reúne os escritórios e advogados mais admirados do país, escolhidos pelos dirigentes dos departamentos jurídicos das 1,5 mil maiores empresas do país. Ali estão as 502 bancas e os 1,1 mil profissionais mais admirados em 12 especialidades do Direito.

O aumento dos cursos é bom para os donos de faculdades, é bom para os donos de cursinhos preparatórios para concursos públicos e prova da OAB e é ótimo também para os sócios dos grande escritórios, que têm mais opções no recrutamento de novos talentos.

Para os jovens advogados, no entanto, mais concorrência não significa mais oferta de emprego. Pode ser apenas sinônimo de frustração. Há dúvidas sobre a capacidade do mercado de absorver mais de 90 mil formandos por ano.

Nos EUA, o desencanto com a profissão vem derrubando o número de matrículas. Na última década, o total de inscritos em cursos de engenharia cresceu 39%. Em Direito, caiu 7%. No Canadá, o volume de serviços advocatícios tem caído tanto por conta da internet, que dá ao cidadão a chance de fazer diretamente o que antes exigia apoio de advogados, quanto pela oferta de mão de obra contratada na Índia a um preço menor.

Para os que se dispõem a enfrentar o desafio, fica um conselho. Quer ingressar no clube dos grandes advogados? Sonha um dia ser apontado como um dos mais admirados? Invista pesado na sua formação. Diferencie-se. Torne-se único.

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