Paradoxo da Corte

Novo Código de Processo Civil traz mudanças na tutela antecipada

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1 de dezembro de 2015, 7h10

A constante exigência de adequação formal da tutela jurisdicional e de seus respectivos instrumentos ao seu escopo afigura-se, em época presente, exaltada em razão da inevitável intempestividade do resultado do processo, a qual, embora também verificada em outros sistemas, repercute negativamente na efetividade daquele, determinando a criação de inúmeros mecanismos tendentes à atenuação desse indesejado fenômeno, já que muito distante a sua eliminação.

No novo CPC, ao lado dos denominados procedimentos especiais, o exemplo mais significativo do desejo de superar as agruras das sucessivas fases do procedimento comum é a nova configuração, no artigo 294 e seguintes, da denominada “tutela provisória”, que disciplinam a tutela de urgência (cautelar e antecipada) e a tutela de evidência, que propiciam, no plano teórico, o acesso a uma Justiça efetiva a todos os jurisdicionados.

Infere-se realmente que o aperfeiçoamento dessa técnica continua sendo devido às contingências peculiares à universalização do procedimento comum (inevitável demora) e ao número sempre crescente de demandas.

Não obstante, o respectivo pronunciamento judicial antecipatório continua sendo proferido no âmbito de cognição sumária e caracterizado pela provisoriedade, uma vez que fica na dependência de posterior confirmação, no bojo de ato decisório de mérito, para que seus efeitos se produzam, depois do trânsito em julgado, de forma definitiva. 

Dentre as novidades inseridas sobre essa temática no novel diploma, o artigo 304, alterando a técnica do diploma de 1973, estabelece a denominada “estabilização da tutela antecipada”, caso o requerido não interponha agravo de instrumento (ou mesmo apresente contestação[1]), situação que implica a extinção do processo, com a ratificação do provimento antecipatório, sem contudo enfrentar o mérito.

Ademais, a teor do disposto no parágrafo 5° da apontada norma legal, extingue-se o direito de ajuizar ação autônoma, visando a “rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada”, após o transcurso de dois anos, a partir da intimação da decisão que pôs fim ao processo. Esse lapso temporal tem natureza decadencial, de sorte que futura demanda ajuizada além desse prazo está sujeita à extinção do processo com fundamento no artigo 487, inciso II (CPC/2015).

Trata-se, como se observa, de técnica análoga àquela que se verifica no procedimento monitório, com a inversão do ônus de demandar. Com efeito, uma vez expedido o mandado de pagamento ou de entrega de coisa móvel, não opostos os embargos no prazo legal, a decisão liminar torna-se definitiva.

Nota-se que, diante desse contexto, o efeito ou efeitos antecipados se estabilizam por força de presumido conformismo das partes. Contudo, exatamente por não alcançar a imutabilidade e a indiscutibilidade, atributos reservados à coisa julgada material, o fenômeno que aqui se observa não se subordina a qualquer eficácia preclusiva, podendo a questão litigiosa ser reexaminada em futuras demandas entre as mesmas partes.

Nesse sentido, Heitor Sica escreve, de forma clara, que a decisão estabilizada não parece ter a função positiva (típica da coisa julgada material) de influir sobre a sentença a ser proferida em processo futuro, instaurado entre os mesmos litigantes[2].

Por fim, cabe enfatizar que, não produzindo coisa julgada material, a tutela antecipada já estabilizada não é passível de ser atacada por meio de ação rescisória. Essa conclusão não causa qualquer perplexidade, até porque a parte que deixou transcorrer o prazo de dois anos para ajuizar ação autônoma de impugnação da decisão estável não poderia mesmo ser premiada com mais um biênio para tentar rescindi-la: dormientibus non sucurrit ius!


[1] Embora a lei não faça referência à contestação, entendo que o juiz não pode desprezar a resposta do réu e simplesmente extinguir o processo se não for interposto o recurso cabível. Ademais, escapa da eficácia preclusiva decorrente do  transcurso  in albis do prazo para a interposição do recurso, a teor do artigo 485, parágrafo 3º, do novo CPC, a matéria relativa aos pressupostos processuais e às condições de admissibilidade da ação por extravasarem do poder de disposição das partes, subordinando-se à investigação de ofício pelo juiz, ainda que se constate o silêncio do demandado. 
[2] Doze problemas e onze soluções quanto à chamada “estabilização da tutela antecipada”, Revista do Ministério Público do Rio de Janeiro, 55(2015):94.

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