Promessas vazias

Candidatos à OAB têm visão embaçada
da advocacia e de seus problemas

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31 de agosto de 2015, 15h10

Esse ano serão realizadas eleições nas 27 seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil. O início do período eleitoral já se avizinha. Nessa época é costume o surgimento de candidatos propagando possuírem soluções para todos os problemas atuais e futuros da advocacia. O detalhe é que boa parte desses candidatos tem uma visão embaçada da advocacia e dos problemas atuais enfrentados pelos profissionais que a exercem.

Em quase todas as seccionais a “renovação” é um mote de campanha. Todos falam em “renovar” sem explicar direito o que pretendem renovar e para que — ou para quem — pretendem fazer essa renovação. O discurso da “renovação” vem acompanhado de velhas práticas politicas, muitas vezes escondidas pelos candidatos. É o discurso do novo acompanhado de práticas retrogradas.

Mudança é outra palavra que permeia os debates. Todo mundo propõe mudar. Alguns sem sequer saber o que já foi feito, quanto mais o que precisa ser mudado. Outros sem explicar como será feita a mudança.

É certo que algumas mudanças precisam ser feitas. Contudo é preciso saber “o que mudar”, “por que mudar”, e, principalmente, “como mudar”. Mudar é tarefa para quem sabe fazer e não para aqueles que só sabem falar.

O discurso — vazio de conteúdo em boa parte das vezes — tem como principal finalidade atrair o voto dos jovens advogados, que representam parcela expressiva da advocacia nacional. Propostas mirabolantes são apresentadas todos os dias, por aqueles que pensam que os advogados são bobos. Alguns candidatos se propõe a acabar com problemas crônicos do Judiciário, como, por exemplo, a morosidade da Justiça, como se isso fosse uma tarefa fácil e que pudesse ser realizada pelas seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil. Outros, prometem até reformar o Regimento Interno dos Tribunais, como se disputassem eleições para cargos diretivos dessas Cortes de Justiça.

As prerrogativas profissionais — e o seu desrespeito — costumam ser tema central em todos os debates. Nesse ponto a reclamação é geral. É verdade que a violações às prerrogativas profissionais têm crescido em todo o Brasil e que o problema — que é grave — precisa continuar como objeto de atenção especial da OAB. Contudo, algumas vezes o debate perde o foco. Isso porque alguns advogados confundem os problemas do judiciário — que são muitos — com os direitos dos advogados. Acham, por exemplo, que a demora na prestação jurisdicional — problema crônico no Brasil — é um desrespeito a uma prerrogativa profissional do advogado, quando na verdade a questão é muito maior e mais complexa, por estarmos diante de uma ofensa ao direito do cidadão à razoável duração do processo.

O debate, que deveria se dar em torno de ideias e propostas, boa parte das vezes gira unicamente em torno de ofensas pessoais a adversários. As propostas, que deveriam ser focadas no dia a dia da advocacia e nos problemas — e mudanças — que a profissão está enfrentando, são deixadas de lado para a discussão de temas menores, como, por exemplo, as vagas de estacionamento dos fóruns e tribunais e o funcionamento das copiadoras instaladas nesses prédios. Não que esses assuntos não mereçam atenção, até merecem, mas não podem ocupar o centro do debate nas eleições da OAB.

A tentativa de eliminação do Exame de Ordem, as mudanças legislativas em andamento no pais e seus impactos na advocacia, a problemática implantação do Processo Judicial Eletrônico (PJE), o crescimento exponencial do número de advogados e as constantes reduções do mercado de trabalho e dos valores dos honorários, são exemplos de grandes temas que precisam ser debatidos.

A politica nacional de desjudicialização de conflitos e o crescimento da utilização de meios alternativos de solução de controvérsias são também exemplos de grandes temas que precisam ser discutidos. As mudanças decorrentes da adoção de tais políticas, estimuladas pelo novo Código de Processo Civil, que entrará em vigor em poucos meses, irão impactar de forma sensível o mercado de trabalho daquela grande maioria de profissionais que sobrevive unicamente da advocacia contenciosa. Boa parte desses advogados precisará repensar sua forma de atuação profissional. Contudo, nem todos os candidatos se dedicam ao exame desses problemas. Vários sequer se aperceberam que a vigência do novo CPC mudará radicalmente o exercício da advocacia. Em razão de uma visão limitada do tema, ainda não enxergaram completamente o cenário.

Nesse momento eleitoral chama ainda atenção a forma preconceituosa com que alguns candidatos referem-se aos integrantes de sociedades de advogados, denominados por estes de “empresários da advocacia”. Tais candidatos, alguns demonstrando uma visão pequena da advocacia, parecem desconhecer que a organização dos advogados em sociedades é uma tendência mundial em razão das inúmeras vantagens decorrentes dessa forma de trabalho. Esquecem esses candidatos que os advogados que integram sociedades de advogados são tão advogados quanto aqueles que exercem a advocacia de forma individual. Esquecem ainda que boa parte daqueles que ingressam na advocacia sonham com o crescimento da sua banca de advogados. Aliás, muito desses candidatos também sonham com isso, mas as vezes lhes falta trabalho e competência para tanto.

Nos tempos atuais, o exercício da advocacia de forma individual é um desafio. Merece respeito o profissional que faz essa opção. Contudo, também merecem ser respeitados aqueles que optam por exercer a advocacia em sociedades de advogados, em departamentos jurídicos de empresas públicas ou privadas ou que abraçam as carreiras públicas ligadas à advocacia. A advocacia — é preciso que alguns candidatos se  lembrem disso — não se limita a fóruns e tribunais.

Os desafios que o futuro guarda para aqueles que pretendem seguir exercendo a advocacia como profissão são muitos. Os problemas que a profissão enfrenta são inúmeros. É hora de refletir sobre esses temas e eleger, como dirigentes da OAB, aqueles que tenham uma visão mais apurada sobre essas questões, advogados de verdade, que tenham preparo e disposição para a hercúlea tarefa de dirigir os destinos da advocacia brasileira.

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