Justiça Tributária

Não podemos nos descuidar das questões tributárias

Autor

  • Raul Haidar

    é jornalista e advogado tributarista ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

17 de agosto de 2015, 9h56

Spacca
Raul Haidar [Spacca]Quase diariamente são divulgadas notícias sobre grandes autuações sofridas pelos contribuintes, pessoas físicas e jurídicas, em relação a todo e qualquer tributo. Se basta estar vivo para morrer, também é suficiente ser inscrito no CPF ou CNPJ para nos depararmos ante um lançamento que pode de repente colocar em risco todo o nosso patrimônio e até mesmo a nossa liberdade.

De fato, estamos sujeitos a sofrer lançamentos por supostas infrações, mesmo que nos pautemos pelos mais rigorosos padrões de comportamento diante da legislação em vigor.

Se as nossas garantias constitucionais são bastante razoáveis, na vida real isso não representa muita coisa. A administração pública, em todos os seus níveis , erra com frequência e obriga-nos a enfrentar um contencioso difícil, cujo julgamento na esfera administrativa raramente é justo ou imparcial. Assim, resta-nos muitas vezes apenas o socorro ao Judiciário, sem dúvida o mais confiável de todos os poderes.

Mas acionar o Judiciário tem um custo elevado, um cronograma indefinido e uma segurança muito relativa. A jurisprudência muitas vezes se altera com grande velocidade, de forma que o direito que imaginamos ter hoje, com base em decisões tidas como mansas e pacíficas, de repente muda em sentido contrário. Ou seja: de certa forma até o passado torna-se imprevisível!

Pelo que o caro leitor já deve ter percebido até aqui e ao longo desses muitos anos em que nos prestigia com sua atenção, qualquer cuidado é pouco em relação às questões tributárias.

Mesmo a pessoa física que mantenha relação de emprego está sujeita a embaraços e problemas dessa natureza. Por isso, deve manter controle do que faz e evitar correr riscos desnecessários. Um risco comum é a pessoa física fazer ou receber empréstimos informais com amigos ou parentes. Isso pode gerar movimentação financeira incompatível com a renda e resultar em autuação. Qualquer empréstimo deve estar documentado e lastreado em recursos disponíveis comprováveis. O hábito de emprestar cartão de crédito é um perigo!

Se o contribuinte é trabalhador autônomo deve manter um controle mais rigoroso ainda, com livro caixa e documentos comprobatórios. Hoje existe a obrigação de informar o número do CPF dos clientes à Receita. Em determinadas profissões e situações o contribuinte pode a isso recusar-se, desde que tal recusa se ampare em adequado embasamento jurídico.

As pessoas jurídicas certamente são as que mais devem se preocupar com a questão tributária. Mesmo as de menor porte, aqui incluídas as optantes pelo lucro presumido ou enquadradas no “simples” devem contar com adequado assessoramento contábil.

Em qualquer ramo devem ser revistos conceitos já superados. Por exemplo: ninguém pode abrir ou manter um negócio, seja qual for, sem um prévio planejamento econômico-financeiro, por menor que seja o negócio.

Muitos negócios tornaram-se inviáveis pela simples razão de que  seus proprietários não incluíram corretamente os tributos em suas contas. Imaginam alguns desinformados que em alguns ramos de comércio varejista (bares, restaurantes etc) o lucro seja a diferença entre o faturamento menos as despesas fixas e custo de mercadorias e mão de obra. Ora, qualquer pessoa sabe que onde há cartão de crédito ou fornecimento de nota há controle de tributos. E hoje quem não aceita cartão está fora do mercado.

Imaginar que alguma atividade possa hoje prosperar ou se manter num clima de sonegação ou corrupção é caminho para o suicídio econômico, a desgraça moral  e até mesmo a perda da liberdade.

Já analisamos em coluna de 13 de maio de 2013 — clique aqui para ler  as razões pelas quais sonegação é um crime que não compensa, principalmente para quem  o comete.

Ao sonegar pode o contribuinte acreditar nas deslavadas mentiras de pessoas sem caráter que se dizem capazes de fazer milagres ou obter favores ilícitos. Estamos no século XXI, num tempo em que a tecnologia predomina e onde o sigilo praticamente não existe mais, para o bem ou para o mal.

Também labora em flagrante equivoco ou cultiva completa ignorância a pessoa que imaginar ser incompetente ou corrupta a maioria dos servidores públicos. Os auditores ou fiscais tributários em todos os níveis (federal, estadual e federal) são portadores de nível superior e admitidos através de rigorosos concursos públicos. São, em síntese, pessoas de altíssimo nível técnico, adequadamente treinadas para as funções que exercem.

Por outro lado, o serviço público já conta com eficazes sistemas de Corregedorias, capazes de detectar eventuais desvios de conduta, submetendo os suspeitos aos mecanismos de punição previstos em lei.

Enganam-se aqueles que, ao tomar conhecimento de notícias de corrupção, como as que se divulgam nos meios de comunicação atualmente, imaginam que estamos diante de um quadro de crime generalizado no serviço público. Isso não é verdade!

Por exemplo: nos últimos meses tivemos notícia de que dez fiscais estaduais de São Paulo foram envolvidos com eventos delituosos. Enquanto não condenados por sentença judicial transitada em julgado, são inocentes.

Mesmo que sejam considerados culpados, é importante lembrar que esse número de malfeitores não representa sequer 0,2% dos integrantes do quadro, o que nos permite concluir que mais de 99% desses servidores são sérios.

Corrupção e sonegação são crimes. Se não podemos admitir o primeiro, também não podemos praticar o segundo.

Caso nos seja muito difícil suportar a carga tributária a que estamos sujeitos, resta-nos a procura por mecanismos menos onerosos dentro da legalidade. Em muitos casos isso nos obriga a simplificar nossas atividades, reduzir seus custos e, sobretudo, colocar limites em sonhos de grandeza.

Realmente, não faz sentido no mundo atual, a ostentação ridícula que nos possa obrigar a abrir mão dos nossos valores éticos e até mesmo da honra.

Quanto à necessidade de que o Brasil encontre uma forma de tributação justa, parece-nos útil lembrar:

“Nenhuma nação jamais se tornou próspera por tributar seus cidadãos além de sua capacidade de pagar”. (Margareth Tatcher, na Convenção do Partidor Conservador, 1983)

Para os que pensam que o melhor seja ganhar dinheiro a qualquer preço, uma lição mais antiga e mais sábia:

“Que a boa fama, para o homem, senhor, como para a mulher, é a jóia de maior valor que possui. Quem furta a minha bolsa me desfalca de um pouco de dinheiro. É alguma coisa e é nada. Assim como era meu passa a ser de outro, após ter sido de mil outros. Mas o que me subtrai o meu bom nome defrauda-me de um bem que a ele não enriquece e a mim me torna totalmente pobre.” (Willian Shakespeare, em “Otelo, o Mouro de Veneza, ato III, cena 3).

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    é jornalista e advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

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