Opinião

Cade regulamenta notificação da celebração de contrato associativo

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16 de agosto de 2015, 11h10

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica publicou a Resolução 10, de 29/10/2014[1], disciplinando as hipóteses de notificação da celebração de contrato associativo, de que trata o inciso IV do art. 90 da Lei 12.529/2011[2]. A resolução veio regular e preencher uma lacuna que existia na nova Lei de Defesa da Concorrência, que determina que os contratos associativos entre grandes empresas devam ser notificados ao Cade, mas previa um tipo aberto e sem definição sobre a abrangência do conceito. Com a nova resolução, para fins de regulação antitruste, os contratos associativos devem ser avaliados e notificados ao Cade quando de sua celebração.

Segundo referido art. 90, IV, da Lei 12.529/2011, realiza-se um ato de concentração, dentre outras hipóteses listadas, quando duas ou mais empresas celebram contrato associativo, consórcio ou joint venture, e como regra excludente da norma geral, o parágrafo único do mesmo artigo determina que não serão considerados atos de concentração os atos descritos no inciso IV quando destinados às licitações promovidas pela administração pública direta e indireta e aos contratos delas decorrentes.

O art. 88 da Lei 12.529/2011[3] define que devem ser submetidos ao Cade os atos de concentração econômica em que, cumulativamente: I – pelo menos um dos grupos envolvidos na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 400 milhões; e II – pelo menos outro grupo envolvido na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 30 milhões. Esses valores podem ser adequados por indicação do Plenário do Cade ou por portaria interministerial dos ministros da Fazenda e da Justiça[4].

A Lei 12.529/2011 determina que esse controle dos atos de concentração seja prévio e seja realizado em, no máximo, 240 dias, a contar do protocolo de petição ou de sua emenda[5], sendo que, até a decisão final sobre a operação, deverão ser preservadas todas as condições de concorrência entre as empresas envolvidas, sob pena de aplicação das sanções previstas na lei[6]. Esse prazo poderá (somente) ser dilatado: I – por até 60 dias, improrrogáveis, mediante requisição das partes envolvidas na operação; ou II – por até 90 dias, mediante decisão fundamentada do tribunal, em que sejam especificadas as razões para a extensão, o prazo da prorrogação, que será não renovável, e as providências cuja realização seja necessária para o julgamento do processo[7].

A Resolução 10/2014 estabelece que são considerados associativos quaisquer contratos com duração superior a dois anos em que houver cooperação horizontal ou vertical ou compartilhamento de risco que acarretem, entre as partes contratantes, relação de interdependência, respeitados os critérios objetivos estabelecidos no artigo 88 da Lei 12.529/2011[8]. Contratos com duração inferior a dois anos devem ser notificados nos termos da resolução quando, mediante sua renovação, o período de dois anos for atingido ou ultrapassado (art. 2º, §3º).

Para fins desta disposição, considera-se que há cooperação horizontal ou vertical ou compartilhamento de risco que acarretam relação de interdependência: I – quando partes estiverem horizontalmente relacionadas no objeto do contrato cuja soma de suas participações no mercado relevante afetado pelo contrato for igual ou superior a vinte por cento (20%); ou II – quando partes estiverem verticalmente relacionadas no objeto do contrato, sempre que pelo menos uma delas detiver trinta por cento (30%) ou mais dos mercados relevantes afetados pelo contrato, desde que preenchida pelo menos uma das seguintes condições: a) o contrato estabeleça o compartilhamento de receitas ou prejuízos entre as partes; b) do contrato decorra relação de exclusividade (art. 2º, §1º).

Vale lembrar que os atos que se subsumirem ao disposto no caput do art. 88[9] da Lei 12.529/2011 não podem ser consumados antes de apreciados, nos termos do procedimento previsto no art. 53 e seguintes, sob pena de nulidade, sendo ainda imposta multa pecuniária, de valor não inferior a R$ 60 mil nem superior a R$ 60 milhões, sem prejuízo da abertura de processo administrativo[10].

Para compreender o escopo da aplicação das obrigações da Resolução 10/2014, devem ser verificadas as características e elementos formadores e informadores de um contrato associativo. A regulação trazida pela resolução resolveu uma lacuna e o problema criado por divergências de entendimentos, pois, frente à indefinição do que deveria ser considerado como contrato associativo, muitas empresas e operações estavam sujeitas e corriam alto risco de penalização por parte do Cade, porque a falta da notificação pode resultar em pesadíssimas multas, ao considerar que não houve a devida comunicação ao órgão no devido tempo – situação conhecida por gun jumping (queima de largada), que se verifica quando uma empresa ou grupo de empresas leva a cabo uma operação antes da aprovação do Cade.

Por fim, quanto ao escopo do contrato associativo, verificamos que ele deve reunir interesses convergentes das partes visando a consecução de uma atividade comum, com a definição da forma e modo de repartição de prejuízos e riscos bem como dos lucros e resultados, sendo ainda considerada a distribuição de poder e forma de exercício do poder decisório entre as partes.

Ainda que passível de discussão (a norma não é clara e não se pode taxativamente excluir), podemos afirmar que contratos associativos que contemplem direitos de propriedade industrial ou intelectual estariam incluídos na obrigação de notificação (especialmente se levarmos em consideração que o próprio Cade já avaliou casos concretos envolvendo direitos de propriedade intelectual (que foram apresentados voluntariamente), sendo que inclusive houve caso de operações aprovadas com restrições).

 


[1]     Resolução Cade 10, de 29 de outubro de 2014 (publicada no Diário Oficial da União de 04 de novembro de 2014, nº 213, seção 1, página 112). A referida norma está disponível no seguinte website: http://www.cade.gov.br/upload/Resolu%C3%A7%C3%A3o%2010%20-%2004%20de%20novembro%20de%202014.pdf . Acesso em 24/03/2015

[2]     Lei 12.529, de 30 de novembro de 2011. “Art. 90. Para os efeitos do art. 88 desta Lei, realiza-se um ato de concentração quando: I – 2 (duas) ou mais empresas anteriormente independentes se fundem; II – 1 (uma) ou mais empresas adquirem, direta ou indiretamente, por compra ou permuta de ações, quotas, títulos ou valores mobiliários conversíveis em ações, ou ativos, tangíveis ou intangíveis, por via contratual ou por qualquer outro meio ou forma, o controle ou partes de uma ou outras empresas; III – 1 (uma) ou mais empresas incorporam outra ou outras empresas; ou IV – 2 (duas) ou mais empresas celebram contrato associativo, consórcio ou joint venture. Parágrafo único. Não serão considerados atos de concentração, para os efeitos do disposto no art. 88 desta Lei, os descritos no inciso IV do caput, quando destinados às licitações promovidas pela administração pública direta e indireta e aos contratos delas decorrentes.”. A referida norma está disponível no seguinte website: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Lei/L12529.htm. Acesso em 24/03/2015

[3]     Lei 12.529, de 30 de novembro de 2011. “Art. 88. Serão submetidos ao Cade pelas partes envolvidas na operação os atos de concentração econômica em que, cumulativamente: I – pelo menos um dos grupos envolvidos na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 400.000.000,00 (quatrocentos milhões de reais); e II – pelo menos um outro grupo envolvido na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de reais). § 1o Os valores mencionados nos incisos I e II do caput deste artigo poderão ser adequados, simultânea ou independentemente, por indicação do Plenário do Cade, por portaria interministerial dos Ministros de Estado da Fazenda e da Justiça. § 2o  O controle dos atos de concentração de que trata o caput deste artigo será prévio e realizado em, no máximo, 240 (duzentos e quarenta) dias, a contar do protocolo de petição ou de sua emenda. § 3o Os atos que se subsumirem ao disposto no caput deste artigo não podem ser consumados antes de apreciados, nos termos deste artigo e do procedimento previsto no Capítulo II do Título VI desta Lei, sob pena de nulidade, sendo ainda imposta multa pecuniária, de valor não inferior a R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) nem superior a R$ 60.000.000,00 (sessenta milhões de reais), a ser aplicada nos termos da regulamentação, sem prejuízo da abertura de processo administrativo, nos termos do art. 69 desta Lei. § 4o  Até a decisão final sobre a operação, deverão ser preservadas as condições de concorrência entre as empresas envolvidas, sob pena de aplicação das sanções previstas no § 3o deste artigo. § 5o Serão proibidos os atos de concentração que impliquem eliminação da concorrência em parte substancial de mercado relevante, que possam criar ou reforçar uma posição dominante ou que possam resultar na dominação de mercado relevante de bens ou serviços, ressalvado o disposto no § 6o deste artigo. § 6o  Os atos a que se refere o § 5o deste artigo poderão ser autorizados, desde que sejam observados os limites estritamente necessários para atingir os seguintes objetivos:  I – cumulada ou alternativamente:  a) aumentar a produtividade ou a competitividade; b) melhorar a qualidade de bens ou serviços; ou c) propiciar a eficiência e o desenvolvimento tecnológico ou econômico; e II – sejam repassados aos consumidores parte relevante dos benefícios decorrentes. § 7o  É facultado ao Cade, no prazo de 1 (um) ano a contar da respectiva data de consumação, requerer a submissão dos atos de concentração que não se enquadrem no disposto neste artigo. § 8o  As mudanças de controle acionário de companhias abertas e os registros de fusão, sem prejuízo da obrigação das partes envolvidas, devem ser comunicados ao Cade pela Comissão de Valores Mobiliários – CVM e pelo Departamento Nacional do Registro do Comércio do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, respectivamente, no prazo de 5 (cinco) dias úteis para, se for o caso, ser examinados. § 9o  O prazo mencionado no § 2o deste artigo somente poderá ser dilatado: I – por até 60 (sessenta) dias, improrrogáveis, mediante requisição das partes envolvidas na operação; ou II – por até 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada do Tribunal, em que sejam especificados as razões para a extensão, o prazo da prorrogação, que será não renovável, e as providências cuja realização seja necessária para o julgamento do processo.”. A referida norma está disponível no seguinte website: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Lei/L12529.htm. Acesso em 24/03/2015

[4]     Lei 12.529, de 30 de novembro de 2011. “Art. 88. (…) § 1o Os valores mencionados nos incisos I e II do caput deste artigo poderão ser adequados, simultânea ou independentemente, por indicação do Plenário do Cade, por portaria interministerial dos Ministros de Estado da Fazenda e da Justiça.”. A referida norma está disponível no seguinte website: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Lei/L12529.htm. Acesso em 24/03/2015

[5]     Lei 12.529, de 30 de novembro de 2011. “Art. 88. (…) § 2o  O controle dos atos de concentração de que trata o caput deste artigo será prévio e realizado em, no máximo, 240 (duzentos e quarenta) dias, a contar do protocolo de petição ou de sua emenda.”. A referida norma está disponível no seguinte website: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Lei/L12529.htm. Acesso em 24/03/2015

[6]     Lei 12.529, de 30 de novembro de 2011. “Art. 88. (…) § 4o  Até a decisão final sobre a operação, deverão ser preservadas as condições de concorrência entre as empresas envolvidas, sob pena de aplicação das sanções previstas no § 3o deste artigo.”. A referida norma está disponível no seguinte website: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Lei/L12529.htm. Acesso em 24/03/2015

[7]     Lei 12.529, de 30 de novembro de 2011. “Art. 88. (…)§ 9o  O prazo mencionado no § 2o deste artigo somente poderá ser dilatado: I – por até 60 (sessenta) dias, improrrogáveis, mediante requisição das partes envolvidas na operação; ou II – por até 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada do Tribunal, em que sejam especificados as razões para a extensão, o prazo da prorrogação, que será não renovável, e as providências cuja realização seja necessária para o julgamento do processo.”. A referida norma está disponível no seguinte website: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Lei/L12529.htm. Acesso em 24/03/2015

[8]     Resolução CADE nº 10, de 29 de outubro de 2014. “Art. 2º Respeitados os critérios objetivos estabelecidos no artigo 88 da Lei nº 12.529, de 2011, e para fins do disposto nesta lei, consideram-se associativos quaisquer contratos com duração superior a 2 (dois) anos em que houver cooperação horizontal ou vertical ou compartilhamento de risco que acarretem, entre as partes contratantes, relação de interdependência. § 1o Para fins do disposto no caput deste artigo, considera-se que há cooperação horizontal ou vertical ou compartilhamento de risco que acarretam relação de interdependência: I – nos contratos em que as partes estiverem horizontalmente relacionadas no objeto do contrato sempre que a soma de suas participações no mercado relevante afetado pelo contrato for igual ou superior a vinte por cento (20%); ou II – nos contratos em que as partes contratantes estiverem verticalmente relacionadas no objeto do contrato, sempre que pelo menos uma delas detiver trinta por cento (30%) ou mais dos mercados relevantes afetados pelo contrato, desde que preenchida pelo menos uma das seguintes condições: a) o contrato estabeleça o compartilhamento de receitas ou prejuízos entre as partes; b) do contrato decorra relação de exclusividade. § 2º Para fins dos incisos I e II deste artigo, consideram-se partes contratantes as entidades diretamente envolvidas no negócio jurídico sendo notificado e os respectivos grupos econômicos, conforme definição do artigo 4º da Resolução nº 2, de 29 de maio de 2012. § 3º Os contratos com duração inferior a dois anos devem ser notificados nos termos desta Resolução quando, mediante sua renovação, o período de 2 (dois) anos for atingido ou ultrapassado”. A referida norma está disponível no seguinte website: http://www.cade.gov.br/upload/Resolu%C3%A7%C3%A3o%2010%20-%2004%20de%20novembro%20de%202014.pdf . Acesso em 24/03/2015

[9]     Lei 12.529, de 30 de novembro de 2011. “Art. 88. Serão submetidos ao Cade pelas partes envolvidas na operação os atos de concentração econômica em que, cumulativamente: I – pelo menos um dos grupos envolvidos na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 400.000.000,00 (quatrocentos milhões de reais); e II – pelo menos um outro grupo envolvido na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de reais).”. A referida norma está disponível no seguinte website: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Lei/L12529.htm. Acesso em 24/03/2015

[10]    Lei 12.529, de 30 de novembro de 2011. “Art. 88. (…)§ 3o Os atos que se subsumirem ao disposto no caput deste artigo não podem ser consumados antes de apreciados, nos termos deste artigo e do procedimento previsto no Capítulo II do Título VI desta Lei, sob pena de nulidade, sendo ainda imposta multa pecuniária, de valor não inferior a R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) nem superior a R$ 60.000.000,00 (sessenta milhões de reais), a ser aplicada nos termos da regulamentação, sem prejuízo da abertura de processo administrativo, nos termos do art. 69 desta Lei.”. A referida norma está disponível no seguinte website: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Lei/L12529.htm. Acesso em 24/03/2015

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    é advogado e consultor em São Paulo. Sócio do Cruz & Creuz Advogados, bacharel em Direito pela PUC-SP; pós-graduado em Direito Societário pelo Insper; mestre em Relações Internacionais (Programa Santiago Dantas, convênio Unesp/Unicamp/PUC-SP) e mestre em Direito e Integração da América Latina pelo Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina da USP. É autor do livro Acordo de Quotistas - Análise do instituto do Acordo de Acionistas previsto na Lei 6.404/1976 e sua aplicabilidade nas Sociedades Limitadas à Luz do Novo Código Civil brasileiro, com contribuições da Teoria dos Jogos (IOB-Thomson, 2007).

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