Alívio pros gargalos

Decreto paulista sobre manifestação de interesse pode estimular investimentos

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1 de agosto de 2015, 7h30

A fim de estimular o setor privado a contribuir para o desenvolvimento de estudos em projetos de infraestrutura e serviços públicos, o Estado de São Paulo publicou, em 22 de julho de 2015, o Decreto 61.371/2015, o qual regula os PMIs, abreviação da expressão Procedimento de Manifestação de Interesse (embora a sigla e a expressão não sejam utilizadas no texto normativo).

O Decreto estadual representa um dos atos normativos mais modernos e completos do país, no que concerne à regulação normativa da participação da iniciativa privada nesse processo. Muito provavelmente servirá de parâmetro para outros Estados e Municípios elaborarem os seus respectivos Decretos quando da regulamentação dos PMIs nas suas respectivas esferas de competência.

A grande inovação, sem dúvidas, ficou por conta da Plataforma Digital criada para essa finalidade, a qual receberá, de maneira concentrada e informatizada, as propostas formuladas por parte do mercado, o que constitui um excelente avanço em termos de transparência e gestão pública. Com isso, o espectro de participação de interessados nesses procedimentos, o que vai exatamente ao encontro do princípio da publicidade dentro da Administração Pública.

Alguns pontos que podem causar alguns questionamentos jurídicos foram observados em uma análise preliminar, os quais passam a ser sintetizados a seguir.É importante mencionar que muitas das discussões suscitadas poderão ser dirimidas por atos normativos complementares durante os próprios PMIs (como nos Editais de Chamamento), ou mesmo no certame a ser realizado com o resultado dos estudos. Tudo isso para que o procedimento traga o maior nível de segurança jurídica, tanto para a Administração quanto para os administradores, evitando-se, assim, as inúmeras contestações administrativas e judiciais que costumam atrasar os grandes projetos de infraestrutura e serviços públicos no Brasil.

1) Seleção de proponentes (exclusividade) ou seleção de projetos (“swiss challenge”)

Autorização é termo definido no Decreto como ato administrativo discricionário outorgado, com ou sem exclusividade, a fim de que o destinatário possa elaborar estudos para subsidiar a Administração Pública na elaboração de parcerias. Pelo Decreto, fica dentro da discricionariedade da Administração Pública realizar uma seleção de proponentes (no caso da Autorização com exclusividade) ou uma seleção de projetos (que ocorreria nas autorizações sem exclusividade, possibilitando uma competição de projetos – swiss challenge).

O uso sem critérios da autorização com exclusividade pode reduzir a oferta de boas ideias para a Administração Pública, contrariando a finalidade do Decreto, que é estimular a participação da iniciativa privada no processo. Por conta disso, entendemos que a exclusividade deveria estar plenamente motivada no bojo do processo, de acordo com a complexidade do projeto, a fim de justificar a seleção de proponentes previamente à seleção de projetos. Ou seja, a não exclusividade seria a regra, enquanto que a exclusividade seria a exceção.

2) O “silêncio letal” da Administração Pública

Também passível de crítica é a presumida rejeição da proposta por conta do silêncio da Administração. A regra geral quanto à inércia da Administração é que, transcursos quaisquer prazos sem a adoção de providência por parte de órgãos e entidades da Administração Pública, será caracterizada falta de interesse do Poder Público no projeto apresentado, o qual será extinto de ofício pela Administração.

Isso tende a causar insegurança jurídica aos proponentes privados à medida que,hipoteticamente, não seria desarrazoado vislumbrar qualquer situação em que, por razões políticas, determinada proposta viesse ser colocada na “geladeira”, sendo posteriormente arquivada sem a necessária justificativa fundamentada.

Talvez, a fim de se evitar questionamentos judiciais quanto à motivação do ato administrativo de extinção do procedimento por parte dos particulares, adotou-se a consequência negativa que ora se comenta. O silêncio da Administração passou a sacramentar qualquer discussão ulterior, sobretudo em razão de carecer elementos ao particular para questionar, judicialmente, a decisão administrativa.

3) Experiência ou expertise: qual seria a melhor opção?

É polêmica também a exigência de “demonstração de experiência na realização de estudos similares aos solicitados”, que deverá conter nos requerimentos de autorização disciplinados pelo Decreto. Em tese, acredita-se que o termo experiência, nesse contexto, designa exigência demasiadamente específica e documental (os já conhecidos “atestados”), razão pela qual poderia ser substituída pela expressão em inglês “expertise” ou outra equivalente, já que o proponente pode comprovar experiência real apenas em estudos diferentes dos propostos. Isso é relevante, sobretudo, para empresas que desejam ampliar seus ramos de atividades junto ao setor público.

Ademais, como a associação de consultores pode se dar tanto como uma consultoria “externa” (hipótese em que a responsabilidades pelo estudo será exclusiva da autorizada, e não dos consultores contratados) como dentro do empreendimento (uma espécie de joint venture entre consultores e a empresa que opera no setor), certo é que a exigência de experiência prévia poderá acarretar um tipo de “associação por atestados”, ou seja, empresas grandes tentarão se associar com outras que sejam especializadas em apresentar estudos a fim de suprir a impossibilidade de comprovação de experiência no setor.

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