Premeditado ou não

Entendimento sobre cobertura de suicídios em seguros de vida é alterado no STJ

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16 de abril de 2015, 21h46

A seguradora não tem obrigação de indenizar suicídio cometido dentro do prazo de carência de dois anos da assinatura do contrato de seguro de vida. A decisão é da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça. Por 7 votos a 1, o colegiado entendeu que o dispositivo do Código Civil de 2002 que trata do tema traz um critério temporal objetivo, que não dá margem a interpretações subjetivas quanto à premeditação ou à boa-fé do segurado.

A decisão muda o entendimento que vinha sendo aplicado pelo STJ desde 2011 a respeito do período de carência, que está previsto no artigo 798 do Código Civil: “O beneficiário não tem direito ao capital estipulado quando o segurado se suicida nos primeiros dois anos de vigência inicial do contrato, ou da sua recondução depois de suspenso.” Nesse caso, segundo o código, a seguradora é obrigada a devolver ao beneficiário o montante da reserva técnica já formada.

Relatora do caso, a ministra Isabel Gallotti, afirmou que nos primeiros dois anos de vigência da apólice, “há cobertura para outros tipos de morte, mas não para o suicídio”. Segundo ela, ao contrário do Código Civil de 1916, que foi revogado, o novo Código Civil não possui referência à premeditação ou não do suicídio.

De acordo com a ministra, a intenção do novo código é justamente evitar a difícil prova de premeditação. No entanto, a ministra ressaltou que, por mais evidente isso seja, a seguradora não poderá se recusar a pagar o valor estipulado ao fim do prazo de carência, em caso de suicídio. Ela foi acompanhada pelos ministros João Otávio Noronha, Raul Araújo, Antonio Carlos Ferreira, Villas Bôas Cueva, Marco Buzzi e Marco Aurélio Bellizze

O recurso analisado na 2ª Seção foi afetado pela 3ª Turma, sob a relatoria do ministro Paulo de Tarso Sanseverino. O ministro votou para que fosse mantida a tese firmada em abril de 2011, no julgamento do Agravo de Instrumento 1.244.022, contrária à que agora prevaleceu.

Naquela ocasião, por 6 votos a 3, o colegiado havia definido que, em caso de suicídio cometido nos dois primeiros anos de vigência do contrato de seguro de vida, a seguradora só estaria isenta do pagamento se comprovasse que a contratação foi premeditada por quem já pretendia se matar e deixar a indenização para os beneficiários.

Em referência ao artigo 798, o ministro João Otávio de Noronha ressaltou que o texto legal não traz nem sequer discussão sobre o ônus da prova da premeditação. “Nós não negamos que o suicídio decorre de uma crise mental, mas o que não pode é isso causar uma crise no sistema securitário. Vamos ter pessoas que não constituíram o mínimo de reserva gerando pagamento de valores para os beneficiários”, complementou Noronha.

Pedido negado
O caso que originou a mudança de entendimento é referente a um beneficiário que contratou seguro de vida do banco Santander no valor de R$ 303 mil no dia 19 de abril de 2005 e se suicidou em 15 de maio, apenas 25 dias depois.

Desse modo, a seguradora não pagou a indenização, e as beneficiárias ingressaram com ação de cobrança. Em primeiro grau, o juiz entendeu que não havia o direito ao valor do seguro. Porém, o banco se viu obrigado ao pagamento por conta de decisão do Tribunal de Justiça de Goiás. No STJ, o recurso é da seguradora, que conseguiu se exonerar da indenização.

Favorecimento às seguradoras
O presidente do Instituto Brasileiro de Direito do Seguro (IBDS), advogado especialista em Direito Securitário Ernesto Tzirulnik, criticou a decisão do STJ. “A mudança súbita na orientação quase centenária e sumulada no STF e no STJ, sobre a cobertura do suicídio não premeditado, prova que uma insegurança permeia o ambiente jurídico securitário e que, agora, o Superior Tribunal de Justiça vai a favor do poder econômico e contra os consumidores”, disse Tzirulnik.

De acordo com o advogado, as seguradoras se fizeram representar por sua federação na condição de amicus curiae, enquanto consumidores não tiveram ninguém para zelar por seus interesses. "Uma das questões que incomodavam os seguradores, que faziam seguros individuais de vida e não grupais, era a súmula do STF favorável aos suicidas casuais", comentou.

Para Tzirulnik, a afirmação, feita no STJ, que o suicídio não premeditado desestabilizaria a operação das seguradoras é falaciosa. Segundo ele, uma das maiores seguradoras de vida do país teve 25 mil sinistros de morte no ano passado, mas apenas 30 suicídios.

“Esta nova orientação do STJ põe no mesmo saco aquele que se mata casualmente, por uma forte emoção ou pelo medo de sofrer — quem salta de edifício em chamas comete suicídio — e aquele que planifica desde a contratação do seguro por valor elevado, até os atos de execução”, comentou o advogado. Com informação da Assessoria de Imprensa do STJ.

REsp 1.334.005

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