Enterrado como indigente

Auxílio só deixa de ser pago a representante se morte de titular é conhecida

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10 de abril de 2015, 19h57

Auxílio-acidente pago a mulher que representa o irmão, sem saber que ele, o titular do benefício, morreu, não configura pagamento indevido. Com base nesse entendimento, o Juizado Especial Federal de Guaratinguetá (SP) decidiu que a irmã de um homem enterrado como indigente não precisará devolver ao Instituto Nacional do Seguro Social valores recebidos após a sua morte.

A mulher moveu ação contra a cobrança de R$ 5.730,99 pelo INSS, em razão do recebimento, como procuradora do irmão, do auxílio-acidente no período de 1º de dezembro de 2011 a 30 de novembro de 2012.

No processo, ela alegou que o irmão era usuário de drogas e não tinha notícias dele desde dezembro de 2011. O segurado havia se deslocado para a cidade de São José dos Campos para tratamento clínico. A mulher afirmou que só descobriu o seu paradeiro em novembro de 2012, após o INSS solicitar o recadastramento do beneficiário para a continuidade do auxílio. Na ocasião, obteve informações que o irmão havia falecido há um ano e sido enterrado como indigente.

Apesar de ter fundamento a cobrança pelo INSS, já que ocorreu o recebimento do benefício após a morte do segurado, o juiz federal Leandro Gonsalves Ferreira considerou que o caso apresenta peculiaridades que o distingue dos demais, como a falta de conhecimento do óbito pelas partes durante o período que o auxílio foi pago.

“No caso, no período em que a demandante recebeu o benefício do irmão na qualidade de sua procuradora, não havia qualquer notícia do óbito do segurado, ao que consta dos autos”, afirmou. Segundo Ferreira, a devolução do benefício pressupõe pagamento indevido, o que segundo ele, não ocorreu.

“Seja pelo aspecto objetivo (existência do vínculo obrigacional) ou pelo aspecto subjetivo (ciência do erro), não se pode falar, quando da realização dos efetivos depósitos do benefício, em pagamento indevido, à luz da teoria da aparência, porque tanto por parte do INSS quanto da autora existia causa jurídica justificadora da prestação previdenciária”, disse.

Para o juiz federal, tanto o INSS quanto a autora tinham a falsa percepção da realidade no sentido de existência de uma obrigação. De acordo com a decisão, isso ficou evidente, já que o INSS somente atualizou seu sistema com a informação do óbito em 26 de novembro de 2014, após a lavratura da certidão de óbito ocorrida em 14/08/2014. Já a autora, na época dos pagamentos em questão, não tinha ciência do óbito do irmão, visto que o conhecimento dos fatos ocorreu posteriormente, com a identificação do cadáver.

“Considerando que o mandato cessa com o óbito (artigo 682, inciso II, do Código Civil), o desconhecimento da morte justificou o recebimento do benefício. Não se pode atribuir má-fé à autora, porque tal conduta não se presume, deve ser provada”.

Na decisão, o Ferreira apresentou julgado do Superior Tribunal de Justiça (AgRg no AREsp 152.344) que, de acordo com ele, pode ser aplicado no caso por analogia. “Apesar de o INSS cumprir, com a cobrança, o princípio da estrita legalidade, reputo que o mais adequado na espécie é a aplicação da teoria da aparência, com esteio na qual o STJ tem entendido que, embora o recebimento de determinado valor não seja devido, se o servidor público o recebeu de boa-fé, não se pode exigir sua restituição”, analisou, ao proferir decisão favorável à mulher. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRF-3.

Processo 0000069-77.2015.4.03.6340

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