“Descompasso” no MPF

Ministro Marco Aurélio critica PGR por mudar de ideia sobre denúncia

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30 de setembro de 2014, 17h05

O ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, criticou o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, por ter pedido o arquivamento de uma denúncia apresentada pelo seu antecessor no cargo. O ministro avaliou que a acusação tinha indícios suficientes e apontou a existência de um “nefasto descompasso na atuação do Ministério Público”. A informação foi divulgada pela Folha de S.Paulo.

Fellipe Sampaio/SCO/STF
O caso envolve uma denúncia apresentada em 2013 pelo ex-chefe da PGR, Roberto Gurgel (foto), contra o deputado federal Paulo Cesar Quartiero (DEM-RR). O parlamentar foi acusado dos crimes de contrabando de gasolina e de óleo diesel, além de armazenamento ilegal do material em uma casa. Segundo a denúncia, os fatos ocorreram em 2008 e eram usados para fins eleitorais, pois Quartiero tentava na época se reeleger como prefeito de Pacaraima (RR), na fronteira com a Venezuela.

Wilson Dias/ABr
A análise sobre a abertura de Ação Penal ainda está suspensa na 1ª Turma do STF porque o ministro Luiz Fux pediu vista do processo, em junho. Marco Aurélio é o relator do caso e votou a favor, mesmo com parecer contrário de Janot (foto). Para o ministro, a atuação do procurador-geral revelou um “descompasso indesejável a contrariar a impessoalidade e a indivisibilidade próprias ao Ministério Público Federal”.

Ele apontou uma série de informações presentes na denúncia: a polícia apreendeu combustíveis em uma residência que seria usada pela campanha; a perícia concluiu que o material tinha alto risco de explosão; depoimentos associaram os produtos ao deputado; a nota fiscal apresentada não comprovou que a origem era brasileira — somente a União pode importar combustíveis. Além disso, segundo o relator, o acusado foi notificado para se defender.

Reprodução
“Como, então, em sã consciência e a partir do exame dos elementos coligidos, assentar a inexistência de dados suficientes a receber a denúncia, viabilizando-se a atuação do Ministério Público Federal?”, questionou Marco Aurélio (foto). “Não procede o que veiculado em termos de atipicidade da conduta, presentes os dois delitos, e a ausência de indícios de autoria e materialidade dos crimes, valendo notar que o estágio não é o de definição da culpa do denunciado.”

Outros casos
Não é a primeira vez que há mudança de posicionamento do MPF após a troca de comando na instituição. Em maio, a revista Consultor Jurídico revelou que Janot havia solicitado a rejeição de uma ação que questiona isenções tributárias concedidas pelo Brasil à Fifa durante a Copa do Mundo. Gurgel apontava a existência de “privilégios indevidos” nos benefícios, enquanto o atual chefe da PGR alegou que as isenções foram dadas “em prol de interesses públicos relevantes”.

Outro parecer do procurador-geral avalia que cabe ao STF fixar regras para criminalizar a homofobia diante da excessiva demora do Congresso em aprovar uma proposta sobre o tema, declarando-se favorável a um processo apresentado pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneres (ABGLT). Gurgel defendera que o pedido fosse extinto.

O ex-procurador-geral também considerava inconstitucionais resoluções que só permitem o ingresso na pré-escola de alunos que completarem quatro anos de idade até o dia 31 de março do ano em que fizer a matrícula. Janot, porém, disse que o Supremo deveria rejeitar a ação.

A assessoria de Janot disse à Folha que as mudanças nas convicções são normais durante um processo, pois integrantes do Ministério Público têm independência funcional.

Clique aqui para ler o voto do ministro.

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