Consequências práticas

Pedido de remoção de conteúdo da internet pode ter efeito inverso

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11 de setembro de 2014, 6h33

O presente artigo, de dimensões e pretensões igualmente singelas, pretende se debruçar sobre ponto de considerável relevância prática, todavia, de reduzido estudo por parte dos profissionais do Direito, relacionado com as consequências práticas que um pedido judicial de remoção de conteúdo inserido na internet pode causar. É o que se pode denominar efeito inverso, ou “efeito colateral”.

Para delimitar ainda mais o tema objeto do presente artigo: imagine-se que o pedido de remoção se volte contra conteúdo de caráter jornalístico, ou mesmo crítico a respeito de certa conduta praticada por pessoa pública. O mais provável é que o debate recaia sobre a necessidade de balanceamento entre os direitos fundamentais relacionados à liberdade de expressão e aqueles relacionados à honra, imagem e privacidade do indivíduo envolvido.

Mas, e os efeitos práticos e, em certas situações, de certo modo até perversos, da veiculação de pedido nesse sentido? A respeito disso, pouquíssimo se debate. Pretende-se, ao final da presente exposição, demonstrar que tal postura pode se mostrar equivocada.

Um caso prático: Barbra Streisand, personalidade famosa por seu talento enquanto atriz, cantora e compositora, agora também empresta seu nome ao efeito inverso que um pedido de remoção de conteúdo inserto na internet pode carregar. A notícia da existência de um processo judicial promovido contra fotógrafo que inseriu, em álbum virtual de imagens da Costa da Califórnia, fotografia em que constante a mansão da atriz, foi capaz de fazer com que mais de 420 mil pessoas visualizassem referida imagem no mês seguinte[1].

Os exemplos podem facilmente ser trazidos para o âmbito nacional. A insistência em pedidos de remoção de conteúdo na internet fez com que o candidato Aécio Neves fosse personagem inclusive de editorial publicado pela Folha de S.Paulo. O título é verdadeiramente emblemático: De Minas a Pequim[2]. A derrota da atual presidente da República na representação eleitoral em que se pretendia a remoção de opiniões econômicas divulgadas por consultoria repercutiu em um número incontável de publicações, sendo compartilhada 420 vezes somente pelos leitores do ConJur[3].

A surpreendente quantidade de pedidos que revelam, na realidade, uma incapacidade de se debater na arena pública fez com que a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) lançasse, em conjunto com diversos órgãos de imprensa, o portal Eleição Transparente. Trata-se de um “monitor com dados sobre ordens judiciais contra publicação de conteúdo[4]”, que divulga, em tempo real, a quantidade representações eleitorais em que se pretende a remoção de conteúdo inserido na internet. Há, inclusive, um ranking, em que elencados os candidatos que mais apresentaram pedidos judiciais de remoção[5].

A verdade é que certas tentativas de esconder — com o perdão de eventual excesso de estilo — podem culminar por ressaltar ainda mais existência de certo conteúdo, por vezes singelo e inofensivo, inserido na internet. Há casos em que, obviamente, a remoção representa a medida que mais se alinha aos ditames estatuídos pela Constituição Federal brasileira. O que parece existir, todavia, é uma aparente ausência de cautela na veiculação de certos pedidos, que podem revelar, em última análise, uma tentativa velada de censura.

A situação pode se mostrar ainda mais delicada quando o que se pretende é impossibilitar que certo endereço virtual possa ser descoberto por intermédio da utilização de ferramentas de busca, tais como o Search, da Google, e o Bing, da Microsoft. O fato[6] é que o Superior Tribunal de Justiça vem consolidando entendimento no sentido de que impossibilitar o acesso a certo conteúdo no âmbito dos mecanismos de busca representa medida inútil para o fim a que se dirige[7]. Aqui, trazendo a investigação para o âmbito jurídico, há carência de ação por ausência de interesse de agir. Desconhecer o referido entendimento pode ser traumático a quem pretenda fazer valer seu hipotético direito à privacidade.

Muito mais do que problematizar e apresentar conclusões profundas e abalizadas a respeito do tema — certamente inalcançáveis pelos autores —, a intenção do presente artigo foi a de realçar certos pontos que a marginalidade do argumento pragmático no dia a dia forense pode ser capaz esconder. Tal objetivo, modéstia à parte, espera-se tenha sido alcançado.


[2] Conteúdo disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2014/03/1425910-editorial-de-minas-a-pequim.shtml

[3] Conteúdo disponível em: http://www.conjur.com.br/2014-ago-20/consultoria-anunciar-avaliacoes-dilma-decide-tse

[4] Conteúdo disponível em: http://www.eleicaotransparente.com.br/#/infografico/estado

[5] Conteúdo disponível em: http://www.eleicaotransparente.com.br/ranking

[6] Tal constatação não necessariamente revela a opinião dos autores a respeito do tema

[7] Cite-se, por exemplo: Rcl. 18.685/ES, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, J. 05.08.2014; Rcl 5.072, Rel. Min. Marco Buzzi, Rel. Para Acórdão Min. Nancy Andrighi, 2ª Seção, J. 11.12.2013; REsp 1316921/RJ, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª Turma, DJe 29.06.2012

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