Cuidados básicos

Lei Anticorrupção atinge pequenos e grandes escritórios de advocacia

Autor

  • Daniel Arruda de Farias

    é sócio do Urbano Vitalino Advogados membro da Comissão Nacional de Sociedades de Advogados (CNSA) Diretor do Centro de Estudos de Sociedade de Advogados da Paraíba L.LM em Direito Corporativo do IBMEC e Consultor de Gestão de Serviços Jurídicos.

7 de setembro de 2014, 9h43

A Lei 12.846/13 (Lei Anticorrupção) entrou em vigor no dia 29 de janeiro de 2014 e estabeleceu a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica, no âmbito administrativo e civil, alterando substancialmente esse regime de responsabilização daqueles envolvidos em atos de corrupção contra a Administração Pública.

Trouxe já no parágrafo único do seu primeiro artigo, as espécies sujeitas à norma, alcançando todas as sociedades “personificadas ou não”, “independentemente da forma de organização ou modelo societário adotado”. As penas previstas na lei variam de 20% do faturamento das sociedades no exercício anterior ao da instauração do processo, dano de imagem com publicação da decisão da sentença condenatória em principais veículos de comunicação, até a dissolução compulsória da sociedade envolvida em corrupção.

Não exclui, em qualquer hipótese, a obrigação de reparação integral do dano causado, tampouco a aplicação das penas previstas em outros ordenamentos jurídicos, como a Lei de Improbidade Administrativa e Licitações. Aliás, a responsabilidade persiste mesmo nos casos em que o administrador ou cliente não tenha prévio conhecimento ou autorizado à prática do ato corruptivo.

Também não é mais necessário à comprovação de dolo ou culpa da pessoa jurídica e de seus diretores, alcançando ainda, casos de alteração contratual, transformação, incorporação, fusão ou cisão societária após a prática do ato de corrupção. São amplos os poderes outorgados às autoridades administrativas, algo preocupante, já que em nosso país, muitos agentes públicos estão sujeitos a influências politicas, havendo risco real de politização da Lei.

Não há duvidas que a Lei Anticorrupção se aplica às sociedades de advogados, ou seja, se um advogado, estagiário, ou correspondente terceirizado do seu escritório, praticar algum ato de corrupção no interesse ou em benefício de um cliente, este poderá ser responsabilizado pelas autoridades, como também a sociedade de advogados e seus integrantes poderão em conjunto com o cliente, pouco importando se o ato foi praticado por conta e risco exclusivo do terceiro, e se houve efetivo beneficio por parte do cliente.

Por mais louvável que seja a intenção do Legislador, o fato é que a nova Lei Anticorrupção preocupa os escritórios de advocacia, pois a maioria dos advogados foi pega de surpresa. E agora, precisa no curto prazo, adequar-se à nova legislação, inovando práticas nunca antes conhecidas, tendo que criar códigos de condutas dos seus próprios “negócios”, além de executar programas de controle e prevenção de atos de corrupção (compliance), com regras de relacionamento com profissionais, clientes, Poder Público, correspondentes, etc.

Não é um processo rápido, fácil e muito menos barato! Esse controle de condutas deverá alcançar inclusive, pessoas que não estão no quadro interno da sociedade. E como prevenir meu escritório de advocacia das penas severas da Lei Anticorrupção? Estabelecer um manual com padrão de regras de relacionamento e condutas internas na sociedade é o primeiro e mais importante passo.

Um código de conduta abordará pontos como os princípios que regem a sociedade, missão e visão de futuro, valores, as responsabilidades de cada integrante, relacionamento com terceiros, condutas profissionais e pessoais esperadas das pessoas, condutas não aceitáveis, suas respectivas investigações e punições através de canais de denúncias, enfim, todos esses pontos constituem a base para a aplicação de medidas disciplinares, inclusive, o término do vinculo contratual de trabalho ou societário, em caso de desvios éticos por parte de quaisquer integrantes.

O segundo passo é estruturar processos internos de controle que possam fiscalizar o respeito continuado do código de conduta, que deve ser sempre claro o suficiente para facilitar sua transmissão, compreensão e aplicação por todos colaboradores.  Sua efetiva aplicação dependerá também de treinamentos periódicos que devem ser submetidos todos os profissionais visando à manutenção e reiteração dos padrões de conduta pré-estabelecidos. E por fim, abrir amplos canais para denúncias de práticas duvidosas, a fim de que exista uma comunicação eficiente, sigilosa e assegurada a todos os integrantes da sociedade à sua mais alta administração, geralmente composta pelos próprios sócios diretores ou por um comitê de ética e disciplina, a depender do porte da sociedade de advogados.

O fato é que, o alcance da Lei Anticorrupção, independe do tamanho do escritório de advocacia. Mesmo aquelas pequenas bancas compostas de dois a cinco advogados também estão sujeitas à Lei Anticorrupção e deverão adotar cuidados básicos para se precaver das sanções previstas na Lei. Qualquer que seja o porte da sociedade terá que dedicar horas preciosas dos sócios na montagem da proposta inicial de um código, se possível, com o acompanhamento de profissionais com conhecimento de gestão de pessoas e familiaridade com as melhores práticas de compliance adotadas pelo mercado.

O projeto do código de conduta, uma vez aprovado pelos sócios da gestão da sociedade, deverá ser apresentado a cada integrante do Escritório, com a assinatura ao final de um Termo de Compromisso. É uma ferramenta poderosa na tomada de decisões da alta administração, naquelas situações não claras, em que o conflito de opiniões possa surgir, inclusive, entre sócios. Aliás, a demonstração cabal da aplicação efetiva do código de conduta dentro da sociedade representará uma das principais atenuantes no arbitramento de penalidades por parte das autoridades administrativas.

É preciso ainda conhecer os riscos envolvidos na prestação de serviços jurídicos, e da atuação dos profissionais e de correspondentes, sobretudo, perante autoridades públicas. E, principalmente, redigir instrumentos de prestação de serviços com cláusulas em que os contratantes se comprometam cumprir a política anticorrupção aplicável; previsão do direito de regresso e pena de rescisão imediata do contrato; direito recíproco do cliente ou da sociedade de advogados de realizar auditorias periódicas durante a prestação dos serviços; previsão de ações de programas de compliance; mecanismos de controle da informação e dos arquivos das sociedades de advogados.

E por fim, a participação em treinamentos e a prestação de informações periódicas a respeito do grau de parentesco dos integrantes da sociedade com funcionários e autoridades públicas, e advogados que eventualmente exerçam cargos públicos efetivos ou comissionados, a fim de identificar previamente, possíveis conflitos de interesses ou impedimentos. Tudo isto, com o acompanhamento efetivo por parte dos gestores das sociedades de advogados na aplicação do código de conduta de seus escritórios.

Delegar tal missão a profissionais experts em complaince pode ser outra saída, mas é a opção mais cara no mercado, e só funcionará se estes tiverem autonomia, meios e instrumentos suficientes para que possam apurar, identificar e submeter eventual punição daqueles que incorram em desvios éticos nas sociedades. Há muito a ser feito, e no curto prazo. O real impacto da Lei Anticorrupção na atuação das sociedades de advogados somente poderá ser avaliado no curso de sua aplicação prática pelas autoridades competentes e pela Jurisprudência ainda inserta dos Tribunais. A prevenção custa muito caro, mas pode ser um preço ao seu favor.

Autores

  • é sócio do Urbano Vitalino Advogados, membro da Comissão Nacional de Sociedades de Advogados (CNSA), Diretor do Centro de Estudos de Sociedade de Advogados da Paraíba, L.LM em Direito Corporativo do IBMEC e Consultor de Gestão de Serviços Jurídicos.

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