A teoria do domínio do fato entrou no noticiário brasileiro durante o julgamento da Ação Penal 470, o processo do mensalão, quando o então procurador-geral da República Roberto Gurgel pediu a condenação de ex-ministro da Casa Civil José Dirceu. Em razão da dificuldade de se estabelecer evidências, já que a denúncia era amparada essencialmente no cruzamento de depoimentos, Gurgel evocou a Teoria do Domínio do Fato. A justificativa foi que, embora operadores do crime organizado moderno deixem poucos rastros, são eles quem têm controle sobre o resultado final da atividade criminosa.
Mais de um ano depois, o relator, Joaquim Barbosa, usou a teoria para condenar Dirceu. O revisor da ação, ministro Ricardo Lewandowski, disse, no julgamento, que a teoria estava sendo "banalizada". Já Luiz Fux defendeu o uso da tese e disse que ela surgiu "justamente para coibir crimes econômicos" e que a prova indireta ganha importância no plano do que chamou de "delitos associativos" e da dificuldade de comprová-los.
Em seu discurso no Congresso Internacional de Direito Penal que aconteceu na Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, o jurista reclamou inclusive de a teoria do domínio do fato ser usada em crimes empresariais. Segundo ele, não se pode transferir a tese para estruturas do poder que atuam dentro da lei.
Um exemplo citado por ele foi a tentativa de punir um presidente de empresa pelo crime cometido por um funcionário, sob o argumento de que o presidente é responsável por dar o comando. Roxin afirma que o presidente da companhia não está em uma situação de ilicitude. Quando ele passa uma tarefa, não pode ser responsabilizado pela atuação do funcionário, a não ser que ele tenha conhecimento que a ordem será cumprida de forma ilícita.
Durante o evento, o jurista alemão e professor universitário recebeu o título de Doctor Scientiae et Honoris Causa, por suas contribuições ao Direito Penal.
Em sua participação no evento desta segunda-feira, o ministro Ricardo Lewandowski afirmou que a punição no Direito Penal não pode servir como vingança. "Pune-se para proteger bens jurídicos". Segundo Lewandowski (foto), a pena no Direito Criminal não é uma retribuição que a sociedade faz a alguém que “produziu o mal”. A pena deve ser sempre preventiva, ela deve buscar evitar o crime, mas sempre "no limite da culpabilidade do agente".
O ministro citou a teoria de Roxin segundo a qual a pena só pode ser aplicada contra as pessoas que lesionam bens jurídicos. O pensamento impossibilita a utilização do Direito Penal para punições de caráter moral e religioso, que, segundo o jurista, não são problemas da área penal.
Lewandowski falou ainda sobre a aplicação da teoria do domínio do fato: "A teoria só pode ser utilizada num momento de exceção ou para organizações criminosas que atuem à margem da ordem jurídica, não basta supor que alguém tinha ciência do delito cometido".
Organizador do evento, o professor Humberto Barrionuevo Fabretti aponta Roxin como o responsável pelo Direito Penal moderno. “Ele é o autor de Direito Penal vivo mais importante que nós temos. Não podemos dizer que há um caso se relevância penal, como o processo do mensalão, que não tenha uma citação de Claus Roxin."
O congresso foi organizado também pelos professores José Francisco Siqueira Neto, Alexis Couto de Brito, Gianpaolo Poggio Smanio e contou ainda com a participação dos juristas e professores, Ives Gandra Martins e Claudio Lembo.
*Notícia alterada às 11h19 do dia 2/9 para acréscimo de informações.