Mensagem subliminar

Propaganda não precisa mencionar candidato para se caracterizar como eleitoral

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29 de outubro de 2014, 13h42

É propaganda eleitoral antecipada a veiculação institucional com propósito de relacionar programas de uma entidade a programas de governo, ainda que a propaganda não faça menção direta à disputa eleitoral ou a candidato. O entendimento é do Tribunal Superior Eleitoral ao condenar a Caixa Econômica Federal a multa de R$ 25 mil por propaganda eleitoral feita fora do prazo legal, com uso inadequado de propaganda institucional.

Na corte, a ação gerou um debate entre os ministros sobre a necessidade de menção expressa à eleição ou ao candidato para que fosse caracterizada a propaganda eleitoral. Venceu o entendimento do ministro Gilmar Mendes, de que não é necessária a menção direta. No caso específico, o ministro concluiu que houve mensagem subliminar.

A representação foi apresentada pelo Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), que alegou que a Caixa veiculou propaganda com intuito de influenciar as eleições de 2014 em benefício da presidente Dilma Rousseff, ao enaltecer os programas do governo federal "Minha Casa, Minha Vida" e "Minha Casa Melhor".

O PSDB sustentou que a expressão "eu espero pelo futuro do programa Minha Casa, Minha Vida e Minha casa Melhor, que eles continuem fazendo o que eles ‘tá’ fazendo hoje, porque ‘vai’ tirar muita gente da miséria", dito por uma beneficiária dos programas, se refere à Dilma Rousseff. Disse ainda que a Caixa "abriu mão de promover seus próprios méritos enquanto instituição financeira para propagandear verdadeiro marketing político a favor da atual gestão".

O pedido de liminar foi negado pelo relator, ministro Admar Gonzaga. Citando precedentes do TSE, o ministro afirmou que para que seja configurada a propaganda eleitoral antecipada, é necessária a presença, “ainda que de forma dissimulada, de menção a pleito futuro, pedido de votos ou exaltação das qualidades de futuro candidato, o que deve ser averiguado segundo critérios objetivos". O ministro manteve seu entendimento ao julgar recurso apresentado pelo PSDB.

Após o voto do relator, o ministro Gilmar Mendes pediu vista. Porém, decidiu declarar seu voto após a ministra Laurita Vaz e o ministro Dias Toffoli, presidente do TSE, inciarem um debate sobre a corte eleitoral permitir que o governo divulgue seus feitos em propaganda institucional, mas proíba nos programas de governo.

“Quanto aos programas partidários dos governos, todos eles, de qualquer governo, tenho ficado vencido nesta corte, porque entendo poder o partido, em seu programa, divulgar os feitos de seu governo. Esta corte, contrariamente ao meu posicionamento, vem suspendendo a veiculação dos programas partidários”, registrou Toffoli.

Diante do debate, o ministro Gilmar Mendes cancelou seu pedido de vista e votou em sentido contrário ao do relator, Admar Gonzaga. Para Mendes, é notória a identificação da posição veiculada no filmete com a posição governamental. “‘Permita a continuidade deste governo’ é a mensagem que se passa”, disse.

Para ele, houve um propósito subliminar na propaganda, com desvio de finalidade, o que poderia ampliar a desigualdade entre os candidatos. “Aqui não há referência ao governo expressamente, mas diz que esse programa precisa ter continuidade, inclusive com a referência indeterminada a eles”, complementou.

“Hoje sabemos, inclusive, as técnicas usadas nos filmes: colocam um carro da marca ‘X’, exatamente, porque induz que aquele artista usa o carro da marca ‘X’. O merchandising é, de certa forma, aberto. No caso, isso pode ser observado de maneira muito clara nessa frase que já foi múltiplas vezes lida, ‘que eles continuem fazendo o que eles ‘tá’ fazendo hoje, porque ‘vai’ tirar muita gente da miséria’”, registrou o ministro durante o julgamento.

O voto de Gilmar Mendes foi seguido pelo ministro Teori Zavascki, que lembrou que, no Supremo Tribunal Federal, ao julgar um caso de propaganda institucional dessa natureza, o próprio Gilmar Mendes disse que só um marqueteiro ruim faria uma propaganda citando o nome do candidato, “porque hoje se faz propaganda muito mais eficiente, do ponto de vista eleitoral, sem citar o candidato ou sem citar o pleito eleitoral próximo”. 

“Se o Poder Judiciário, a Justiça Eleitoral, abrir as portas e permitir propaganda desse tipo, vamos ampliar a desigualdade manifesta em favor dos detentores do poder político, tanto no âmbito federal, quanto no estadual e no municipal. A propaganda institucional será o veículo poderoso de desequilíbrio entre as correntes concorrentes, que é a base de um pleito eleitoral”, concluiu Teori Zavascki.

O ministro João Otávio de Noronha também seguiu a divergência. “No presente caso, está bem claro que a expressão ‘que eles continuem fazendo o que eles ‘tá’ fazendo hoje, porque ‘vai’ tirar muita gente da miséria’ não é papel da Caixa Econômica Federal, com a devida vênia. Não tem nenhum programa da Caixa tirando ninguém da miséria. A Caixa tem programa habitacional”, afirmou.

A ministra Luciana Lossio, votou de acordo com o relator, ministro Admar Gonzaga. “Considero que devemos ter um mínimo de objetividade ao dizer e ao julgar o que vem a ser ou deixar de ser uma propaganda antecipada. Por essa razão é que a jurisprudência caminha no sentido da exigência do famoso trinômio que é a referência ao pleito, ao candidato e ao pedido de votos”, afirmou.

Para a ministra, a subjetividade gera insegurança para os candidatos que não têm como saber, a depender do julgador e sua interpretação dos fatos, o que virá a ser uma propaganda antecipada. “Ao ficarmos neste subjetivismo extremado, isso me preocupa, porque a Justiça Eleitoral não conseguirá dar o mínimo de segurança aos candidatos para que possam saber o que se pode ou não fazer”, complementou.

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