Garantia de igualdade

Se não for por acordo, depoimento no exterior será por carta rogatória

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17 de outubro de 2014, 15h52

A Justiça brasileira garante a produção de prova em favor da defesa e da acusação. Sendo assim, acordo de cooperação entre Brasil e Estados Unidos, que só permite que se produzam provas solicitadas pela acusação ou pelo próprio juiz, não impede uso de carta rogatória para depoimento de testemunha da defesa no exterior.

Esse foi o entendimento do ministro Jorge Mussi da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao conceder Habeas Corpus para cassar decisão que indeferiu a oitiva de uma testemunha de defesa que mora nos Estados Unidos. No caso, um americano está sendo acusado de delitos cometidos na República Dominicana.

O réu é representado pelos advogados Daniel Zaclis e Helena Regina Lobo da Costa, sócios do Costa, Coelho Araujo e Zaclis Advogados. Ao pedir Habeas Corpus, eles alegaram que a Justiça norte-americana não pode permitir apenas a oitiva de testemunha que forem arroladas pela acusação. O direito deve abranger também o pedido da defesa. "Um acordo que impossibilita a defesa de produzir provas nos EUA não está permitindo a ela uma ampla defesa; em verdade, está amputando esta garantia", afirma Zaclis.

O acordo em questão é o Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal (MLAT ou Mutual Legal Assistence Treaty), assinado pelo Brasil e Estados Unidos e internacionalizado pelo Decreto 3.810/2001. Segundo Zaclis, não há nada nele que impossibilite os EUA de produzirem provas em favor da defesa.

Mas, explica, sempre que há um pedido de colheita de provas em favor da defesa, o DRCI (departamento, do Ministério da Justiça, responsável por centralizar esses pedidos) se nega a fazer esse requerimento. Eles argumentam que os Estados Unidos apenas concedem cooperação internacional a pedido de entidades estatais (juiz e MP), deixando de atender qualquer diligência solicitada pela defesa.

Zaclis aponta para uma possível inconstitucionalidade do acordo. “O Brasil não pode aceitar um acordo bilateral que permite apenas a uma das partes produzir provas. Vigora em nosso país a garantia constitucional da igualdade, por meio da qual todos os indivíduos devem ser tratados igualitariamente”, afirma. Além disso, argumenta que a Constituição Federal garante ao acusado o contraditório e a ampla defesa dentro do processo judicial.

Acontece que o sistema de produzir provas nos EUA é diferente do brasileiro. Lá, as partes são responsáveis por produzir as próprias provas e levá-las ao juiz. Ainda, a oitiva de testemunhas normalmente não ocorre em uma audiência, com a presença de um juiz. Já no Brasil, os depoimentos das testemunhas ocorrem em audiência, na frente do juiz.

Provas no exterior
Existem duas formas de conseguir produzir provas no exterior. Quando há um acordo bilateral entre os países (como o MLAT entre Brasil e EUA) essa prova é feita por cooperação direta. Isso é, o DRCI se comunica diretamente com a autoridade central dos EUA.

Já nos países que não mantêm acordo bilateral ou multilateral, o requerimento é feito pelo sistema de carta rogatória. No caso, os ministros do STJ concluíram que se não é possível fazer por acordo bilateral (MLAT), porque os EUA não cumprem o pedido, então que se faça o pedido por rogatória.

Segundo o relator, os acordos coexistem com o sistema das cartas rogatórias, que tramitam pela via diplomática e dependem da cortesia internacional. Já o pedido via MLAT é mais rápido e menos dispendioso que o regime de rogatórias. Daí porque o juiz deve preferir os acordos, quando houver.

“A existência de acordo bilateral ou multilateral de assistência jurídica entre determinados países não exclui, por si só, a possibilidade de se utilizar a carta rogatória como meio ordinário para a prática de atos processuais no estrangeiro, já que se trata de institutos distintos”, escreveu o ministro Mussi.

Clique aqui para ler o acórdão.

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