Serviço imune

Prédios dos Correios não pagam IPTU, define Supremo Tribunal Federal

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15 de outubro de 2014, 20h54

O Supremo Tribunal Federal manteve sua jurisprudência de que os Correios têm imunidade tributária por serem obrigados a prestar serviços postais no Brasil inteiro. Nesta quarta-feira (15/10), o Plenário da corte decidiu, por sete votos a dois, que os prédios de propriedades da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) não precisam pagar IPTU.

Nelson Jr./SCO/STF
Seguindo voto do ministro Dias Toffoli (foto), relator da matéria, o tribunal entendeu que, por imposição constitucional, os Correios prestam serviço de natureza pública de responsabilidade da União e sob o regime de monopólio em relação à entrega de cartas. Por isso, estaria incluído na situação descrita no artigo 150 da Constituição Federal, segundo o qual União, estados e municípios não podem tributar bens, patrimônio e serviços uns dos outros. É o princípio da imunidade tributária recíproca.

A decisão foi tomada em Recurso Extraordinário interposto pelo município de Salvador. A alegação era de que a isenção tributária só se aplica a autarquias e fundações públicas, e não a empresas públicas que atuam no mercado privado como é o caso dos Correios.

O município afirma que conceder a imunidade tributária aos Correios seria conceder vantagem concorrencial à empresa, já que a estatal visa lucro como se fosse uma companhia privada. São Paulo é um dos oito municípios que entrou no processo como amicus curiae. E alegou no caso que tributar os prédios de propriedade da ECT seria inclusive importante para a arrecadação. A Procuradoria-Geral paulistana informou que, se fosse entendido que os Correios não têm imunidade, a empresa deveria ao município mais de R$ 170 milhões em IPTU.

Relator do recurso, o ministro Dias Toffoli reafirmou a jurisprudência do Supremo de que empresas públicas, autarquias e fundações exploradoras de atividade econômica gozam da mesma imunidade concedida às empresas estatais. Ressalvou seu entendimento, de que o artigo 150 da Constituição é exaustivo, então somente os entes ali descritos seriam imune. Mas se rendeu à conclusão de que a ECT é prestadora de serviços públicos de prestação obrigatória e exclusiva.

Nelson Jr./SCO/STF
Serviços pagos
O ministro Marco Aurélio (foto), vice-decano, adiantou seu voto para divergir. Disse que a jurisprudência do Supremo fez “a opção pelo privado, e não pelo público”. “Não me consta que empresa pública ou sociedade de economia mista seja ente político”, afirmou

Ele concordou com o entendimento de que o artigo 150 da Constituição deve ter leitura exaustiva, e não exemplificativa. E mesmo o artigo 150, disse, trata da imunidade tributária de entes não políticos: templos de quaisquer religiões ou cultos. “Creio que a ECT ainda não adentrou esse campo. Mas não sei. As atividades são tão diversificadas que daqui a pouco teremos a exploração quanto a templos de qualquer culto. Quem sabe?”, brincou.

Marco Aurélio também discordou da tese do monopólio. Segundo ele a Constituição de 1988 herdou um dispositivo do Império que tratava da obrigatoriedade de os Correios manterem o serviço postal e correio aéreo. Mas isso, segundo o ministro, “vem de uma época em que a iniciativa privada não tinha interesse de chegar a certas localidades”. “Daí a obrigatoriedade, inconfundível com o monopólio.”

Ele citou doutrina de Celso Antônio Bandeira de Melo, “mestre dos mestres”, que diz que empresas estatais prestadoras de serviços públicos, quando houver pagamento pelos serviços, não podem gozar de imunidade tributária.

Nelson Jr./SCO/STF
Fim do monopólio
O ministro Luís Roberto Barroso (foto) também divergiu do relator. Para ele, os serviços postais não são definidos pela Constituição como serviço público, só diz que a União deve mantê-lo. O ministro afirmou que os serviços postais já foram públicos “no início do século XIX”, quando só o Estado tinha a infraestrutura para prestá-lo.

“A jurisprudência precisa refletir essa transformação”, disse. O ministro defendeu que o Brasil saísse do modelo francês de serviço público, em que o Estado detém o monopólio, para o modelo norte-americano, em que não há monopólio: ou só empresas privadas o prestam em regime de concessão ou empresas públicas competem com companhias privadas.

Barroso afirmou que 65% das receitas dos Correios vêm de outros serviços, e não da entrega de cartas. Por isso, para ele, não faz sentido continuar com o regime de monopólio do serviço.

Realidade brasileira
Toffoli combateu os argumentos dos colegas. Ele disse que o Brasil tem 200 milhões de habitantes, mas apenas 90 milhões de IPs — número que identifica uma conexão à internet. “E mesmo assim, nós todos aqui temos uns quatro cada um. Um em casa, no gabinete, no Plenário etc. Então esses 90 milhões não devem representar nem 50 milhões de pessoas.”

Isso quer dizer, segundo Toffoli, que os Correios ainda prestam serviço importante para grande parte da população. E principalmente porque, por obrigação constitucional, os Correios devem ir até lugares que a iniciativa privada não vai por falta de interesse econômico ou até inviabilidade operacional.

A ministra Cármen Lúcia completou com um exemplo pessoal para concordar com Toffoli. Natural de Montes Claros, no norte de Minas Gerais, ela contou que “às vezes passamos até dias sem telefone, e o único meio de comunicação que tenho com meu pai são as cartas, que trocamos toda semana”.

No fim do julgamento, a maioria dos ministros acompanhou o relator. Só não votou o ministro Gilmar Mendes, que está em São Paulo para um evento e não compareceu ao julgamento.

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