"Outro expediente"

Uso de documento falso frauda caráter competitivo de licitação, decide TJ-RS

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11 de outubro de 2014, 5h58

O uso de documento falso para fraudar o caráter competitivo de uma licitação está previsto no tipo penal do artigo 90 da Lei das Licitações, a Lei 8.666/1993. Foi com esse enquadramento que a 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul classificou crime cometido por empresário que tentou se habilitar numa licitação por meio de documento falso. A corte confirmou sentença condenatória que levou à desclassificação da empresa da qual o réu é sócio. 

O relator das Apelações tanto do Ministério Público quanto da defesa, desembargador Gaspar Marques Batista, entendeu que a conduta do empresário tipifica o crime previsto no artigo 304 do Código Penal — documento falso —, na modalidade "uso de documento particular". Por isso, deu provimento à Apelação para desclassificar o fato imputado, o que poderia beneficiá-lo com a proposta de suspensão condicional do processo-crime, ajuizado pelo Ministério Público.

Mas o desembargador Rogério Gesta Leal, autor do voto vencedor, afirmou que a caracterização de fraude à licitação não exige, apenas, conluio entre participantes ou mesmo com o poder público, visando violar a competitividade. ‘‘O tipo penal, ao incluir na sua redação ‘outro expediente’, admite que a realização da conduta seja feita por apenas uma pessoa, e essa ação é compatível com a utilização de documentos falsos, utilizando subterfúgios ilícitos para que a empresa consagre-se vencedora’’, explicou no acórdão.

‘‘Assim, tenho que a ação do réu de buscar a falsificação de um documento para fins de habilitação em certame público visa a um só fim: lograr-se vencedor na disputa, não passando de um meio necessário ao fim perseguido, qual seja a de frustrar ou fraudar o caráter competitivo da licitação’’, concluiu. O acórdão foi lavrado na sessão do dia 28 de agosto.

O Ministério Público estadual afirmou, na denúncia, que o autor — sócio-gerente de empresa de produtos químicos — tentou fraudar o procedimento licitatório promovido pela Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan). O edital exigia que os participantes comprovassem qualificação técnica por meio de documento emitido por pessoa jurídica, atestando fornecimento anterior de cloro líquido, objeto da licitação.

O empresário, então, providenciou atestado, assinado por engenheiro químico, de uma empresa de saneamento ambiental. Para dar veracidade ao documento, anexou no procedimento administrativo as notas fiscais — emitidas pela sua empresa —, que atestavam venda e transporte do produto químico.

Os membros da comissão de licitação, no entanto, desconfiaram da autenticidade do documento, em função de rasura na assinatura, e foram investigar o caso. Em diligência feita na Secretaria Estadual da Fazenda, descobriram que a empresa havia cancelado as referidas notas. Assim, elas não representavam as operações descritas no documento, como exigia o edital. Por isso, a empresa foi considerada inabilitada para a concorrência pública.

Como foi o empresário que apresentou o documento falso para comprovar a qualificação técnica, foi incurso na conduta descrita no artigo 90 da Lei Federal 8.666/1993, combinado com o artigo 14, inciso II, do Código Penal — tentativa de frustrar o caráter da licitação, com o intuito de obter vantagem.

Sentença condenatória
O titular da 7ª Vara Criminal do Foro Central de Porto Alegre, juiz Honorio Gonçalves da Silva Neto, julgou procedente a ação penal. Segundo fez constar na sentença, o próprio dono da empresa de engenharia ambiental, em duas oportunidades no curso do processo, garantiu não ter firmado tal declaração, negando, também, a operação de venda do produto químico.

"Não bastasse isso para evidenciar o propósito do denunciado, tem-se que as notas fiscais apresentadas foram canceladas, o que reforça a conclusão que não houve o fornecimento do produto a que alude a falsa declaração", registrou na sentença.

Com a fundamentação, o réu acabou condenado à pena de um ano de reclusão, em regime aberto, bem como ao pagamento de 10 dias-multa, à razão de um trigésimo do salário-mínimo vigente à época do fato. Na dosimetria, a pena privativa de liberdade foi substituída por restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade.

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