Honorários de sucumbência

O direito de ressarcimento de despesas do vencedor do processo

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27 de novembro de 2014, 14h00

Recentemente a ConJur noticiou que os honorários de sucumbência devem ser pagos à parte e não ao seu advogado, citando o meu nome na matéria Sucumbência deve ser paga à parte, não ao advogado, diz juíza federal. Dado o respeito e admiração que tenho pela advocacia, e considerando que venho escrevendo sobre o tema há alguns anos, sinto que devo tecer alguns comentários e apresentar preocupações a respeito desse assunto.

Parto do pressuposto que os advogados devem ser dignamente remunerados, assim como todos os demais profissionais, respeitados os direitos das demais pessoas. Cada parte escolhe e contrata seu advogado, ficando obrigado a remunerá-lo, conforme combinado. Penso haver consenso de que o vencedor do processo tem o direito de ser ressarcido pelo vencido das despesas do processo, entre elas o valor gasto com advogado.

O artigo 20 do CPC em vigor, temperado pelos princípios da reparação integral, sucumbência e devido processo legal substantivo, permite razoavelmente esse ressarcimento. O vencido no processo paga o direito reconhecido judicialmente, as despesas com seu próprio advogado e as despesas que o vencedor teve com o processo, incluídos os honorários do advogado do vencedor.

Para evitar que o vencido fique obrigatoriamente atrelado ao valor dos honorários contratuais estipulados entre o vencedor e seu advogado, o CPC determina que o juiz arbitre os honorários de sucumbência a serem pagos pelo vencido ao vencedor, como ressarcimento razoável, ditando critérios variados, considerando especificidades do processo, chegando até 20% do valor da condenação.

O esperado, então, seria o procurador judicial cobrar seu preço, fixo, parcelado ou percentual, conforme entende certo e, assim como faz com as demais despesas do processo, juntar o contrato de honorários no processo e pedir ressarcimento em favor de seu cliente, cumprindo integralmente a representação processual, em busca de completa justiça. A juntada do contrato, além da transparência própria do processo judicial, permite justificação do ressarcimento pretendido e maior debate sobre esse ponto.

Esse procedimento não tem sido adotado, salvo exceções. A situação chegou ao ponto do Estatuto da OAB declarar solenemente que os honorários de sucumbência pertencem ao advogado. A verba indenizatória da parte vencedora, necessária para realização do processo justo, num passe de lei corporativa, é transferida para o advogado, que normalmente já cobra honorários contratuais.

A regra de transferência, com relação aos advogados autônomos, escapou de declaração de inconstitucionalidade no Supremo, escudada em preliminar processual interessante: pertinência temática. Com relação aos advogados empregados, houve modificação pelo Supremo. O artigo Desvio inconstitucional – Advogado não tem de receber verba indenizatória, publicado em março de 2012, trata amplamente do assunto.

A apropriação da verba indenizatória do jurisdicionado continua. A mudança está sendo programada também para o novo CPC e para a reforma da CLT, ambos em andamento no Parlamento. Como operadores do direito defendemos o devido processo legal justo e os princípios de justiça, mas parece que estamos levando o processo civil e trabalhista para um caminho de injustiça, com prejuízo certo para o jurisdicionado.

Os argumentos relacionados com os ganhos necessários do advogado, não justificam a transferência institucional da verba indenizatória da parte. A suficiência dos ganhos tem que ser resolvida na contratação dos honorários, nos limites do mercado. Eventuais honorários de sucumbência irrisórios tem que ser resolvido na via recursal. A juntada do contrato de honorários e pedido de ressarcimento em favor do cliente, certamente muda a visão que se tem dessa verba.

O não ressarcimento dos honorários ao vencedor no próprio processo tem levado a uma situação bizarra e irracional. Milhares de novos processos estão sendo abertos para ressarcimento de honorários de processo anterior. Se temos 20 milhões de processos civis e trabalhista, poderemos ter outros 20 milhões para ressarcimento de despesas dos anteriores, um processo gerando outro numa circularidade infinita. O STJ já tem decisão reconhecendo o direito do vencedor receber honorários de processo anterior, confirmando esse paradoxo processual (Resp. 1134725/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi).

A preocupação fica por conta desse quadro duplamente cruel: negação do direito de ressarcimento de despesas ao vencedor no respectivo processo, obrigando-o a aventurar-se em novo processo para realização de seu direito e o acúmulo de milhares de processos repetitivos, ocorrentes por falta de solução correta no anterior, congestionando ainda mais o nosso lento Judiciário. Este é um triste quadro que está preste a ser institucionalizado e legado às próximas gerações. É urgente e necessário rever essa desconformidade.

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