Homem inigualável

Márcio Thomaz Bastos, o cidadão Estado de Direito

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26 de novembro de 2014, 14h20

Há menos de 10 dias recebi a última ligação telefônica de um brasileiro exemplar: Márcio Thomaz Bastos, a quem sempre me referi como o cidadão Estado de Direito.

Preocupado com o respeito à profissão do advogado como essencial à prevalência dos direitos fundamentais, disse-me: “pouco adianta a existência de garantias constitucionais quando o profissional responsável por assegurá-las, o advogado, não é compreendido em sua indispensável missão”.

Márcio Thomaz Bastos foi um exemplo de competência e dedicação às causas da cidadania e da advocacia, sempre vigilante quanto ao direito de defesa. Exteriorizou seu amor pela Justiça em diversos momentos, inclusive como presidente nacional da OAB, liderando a sociedade civil durante a Constituinte e participando da elaboração do texto responsável pela estabilidade da Nação nos últimos 26 anos.

Em março deste ano, tomou posse como presidente de honra da Comissão Especial de Garantia do Direito de Defesa da OAB nacional, reafirmando o papel da entidade como defensora dos grandes valores constitucionais, da presunção de inocência, da existência do contraditório, da proibição das provas ilícitas e do respeito ao devido processo legal.

Foi peça fundamental na articulação das Diretas Já. A maior mobilização política até então feita no país, com vital participação desse grande advogado, reuniu forças para que as eleições realizadas para a escolha do sucessor presidencial do último governo militar ocorressem nas urnas, onde verdadeiramente reside a legitimação popular. Era um entusiasta do projeto de reforma política, destacando a participação dos advogados para a formulação das mudanças.

Márcio Thomaz Bastos era defensor das medidas afirmativas, como as cotas raciais. Ponderava que a adoção de tais políticas se faz necessária para corrigir os desvios históricos cometidos no passado, especialmente com os negros. "Trata-se do resgate de uma condição histórica. Ao manter apenas um segmento étnico na construção do pensamento dos problemas nacionais, a oferta de soluções se torna limitada”, afirmava.

Não importando o cargo ocupado, a democracia e a defesa pelas causas da República sempre estiveram em sua pauta cidadã.

As maiores lutas do passado sempre foram para proteger o cidadão contra os mais variados tipos de arbítrio, de modo que a função do processo judicial se justifica no sentido de disciplinar o poder de julgamento para a garantia da própria defesa do cidadão, que não pode ser atingido, sobretudo pelo Estado, em sua esfera de liberdade.

O respeito às prerrogativas constitucionais do indivíduo se faz necessário para a manutenção do sistema jurídico como um todo, pois, na prática, a ofensa dirigida a uma única pessoa compromete fundamentalmente toda a sociedade.

Márcio Thomaz Bastos acreditava na força das prerrogativas profissionais dos advogados. Em 2004, afirmou que “incumbe a cada advogado o dever de lutar pelas suas prerrogativas com tanta intransigência, como se elas fossem prerrogativas de todos os cidadãos e toda a classe dos advogados”.

O Brasil perdeu um homem inigualável, que continuará sempre nos inspirando a defender a Constituição, o Estado de Direito, os valores que devem sedimentar uma sociedade civilizada e a defesa das liberdades públicas.

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