Suporte a Litígios

Metodologias e tecnologias para analisar documentos e fatos

Autor

  • Marcelo Stopanovski

    é diretor de produção da i-luminas – suporte a litígios especializada em análise de quebras judiciais de sigilos. Doutor em Ciência da Informação pela Universidade de Brasília mestre em Inteligência Aplicada na Engenharia de Produção e Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina.

24 de novembro de 2014, 14h29

Spacca
Chegou um caso novo! Vamos atacá-lo, iniciar seu estudo, verificar se todas as informações estão presentes, organizar os documentos e identificar os caminhos para análise do material, o chamado document review.

A complexidade de um litígio pode ser medida pelo volume de informações a serem processadas ou pela matéria em si. Nesse contexto, o litígio refere-se às relações entre partes com interesses a serem equalizados.

Em linhas gerais, a informação é trabalhada em três fases: coleta, análise e difusão. Cada fase pode comportar determinadas particularidades — como é o caso da coleta, sinônimo de reunião e que pode englobar o planejamento, a coleta propriamente dita, a busca e o armazenamento de dados.

Na fase de coleta, juntam-se os documentos relevantes para o caso, com especial preocupação com o formato dos arquivos, eventuais cópias de documentos, a digitalização de material impresso, autenticidade das informações, a exportação dos dados, as senhas e o armazenamento de tudo. Na era da informação, ou do excesso de informação, é fácil constatar que se trata de uma fase que tende a rapidamente reunir muitos dados. A outra ponta da rotina, a difusão, refere-se aos produtos da análise, isto é, às peças produzidas. Uma das estratégias de difusão foi abordada no texto da semana passada, aqui na coluna: os infográficos.

A coluna de hoje é focada na fase denominada análise. Analisar informações é a tarefa de extrair metadados de objetos informacionais. Explico: metadados são os dados sobre os dados. Em um exemplo simples, temos o registro de uma bibliografia: ali podem ser encontrados o nome do autor e o da obra, a quantidade de páginas, a editora e por aí vamos. O livro é o objeto informacional e seus metadados são suas referências bibliográficas. Para se ter uma ideia de onde isso pode ir parar, a metodologia de catalogação de metadados denominada Dublin Core é usada, atualmente, para identificar quase mil metadados padronizados. Ou seja, em alguns casos, os metadados poderão conter mais informações que o próprio objeto informacional.

Na análise de um caso jurídico, a análise compreende também a avaliação do conteúdo dos documentos, envolvendo a extração dos trechos mais relevantes e a sua contextualização com a doutrina, a jurisprudência, as normas e as boas práticas jurídicas. Uma frase pode ser importante, um documento em si pode ser um fato e várias questões necessitarão de novas informações para serem resolvidas.

E como a tecnologia pode nos ajudar neste estudo? Ahá! Eis o assunto real deste artigo.

Tenho um colega que sempre nos diz, no início de um trabalho: “temos que fazer o mapa do caso!”

Ele está se referindo ao uso do CaseMap, software de suporte à análise de casos produzido pela LexisNexis, a maior provedora de conteúdo jurídico do planeta.

O CaseMap não é localizado, jargão técnico que indica que ele está traduzido e adaptado para o Brasil. Nosso foco de atenção será a metodologia utilizada para a análise do caso, para que, em tese, você possa realizar a mesma tarefa mesmo sem o uso dessa ferramenta.

A tela abaixo apresenta uma visualização geral da interface do programa. Para facilitar, selecionei o caso de exemplo que é instalado junto com a versão de demonstração.

A primeira condição para que tudo funcione direito é uma organização dos documentos do ponto de vista da coleta. Fatie a informação! Separe os documentos que foram digitalizados em conjunto, deixando-os em arquivos separados. Faça o reconhecimento de caracteres (OCR — optical character recognition) e deixe tudo em PDFs, de preferência. Estruture uma árvore de diretórios (pastas), levando em conta onde seus arquivos devem ficar em definitivo.

Agora comece a leitura como você faria na era do livro, página a página. Indico a utilização de dois monitores (telas) para essa tarefa. O primeiro deitado, ou seja, em modo paisagem, Wide Screen de preferência, com o CaseMap aberto. O segundo, como modo estendido da área de trabalho, em pé, modo retrato, onde você pode ver a folha A4 inteira em um bom tamanho (como exemplo uma tela portátil USB da empresa AOC).

À medida que a leitura se desenvolve, você vai catalogando os documentos de acordo com as categorias da figura ao lado, que é a ampliação da lateral esquerda da tela da interface apresentada acima.

Normalmente, são cadastrados primeiro o que o software denomina objetos (Objects). Comece cadastrando o documento (Documents) que você está lendo: nele serão identificadas pessoas físicas (Persons), por exemplo, o juiz do caso, e o nome dos advogados, bem como o de outras pessoas citadas que, neste momento, você nem sabe quem são. Talvez apareçam pessoas jurídicas (Organizations), cujos sócios são pessoas físicas já catalogadas.

Aqui, a análise começa a tomar contexto. Em minha opinião, o CaseMap possui, como principal funcionalidade, a possibilidade de construir hipertexto enquanto digitamos nossas anotações. Cada objeto ganha um apelido e toda vez que eu digitar esse apelido em campos que possuam o símbolo de elos de uma corrente, representando um link (‘), automaticamente é feita uma ligação com o objeto do apelido.

Se eu estou descrevendo uma empresa, posso indicar que meu cliente trabalhou lá, como no exemplo abaixo do caso modelo, onde digito HawkinsP e ABI, o software entende como Philip Hawkins e Anstar Biotech Industries, ficando a pessoa ligada à organização.

Reprodução

 

 

 

 

 

 

Quando um acontecimento for relevante para o entendimento do caso, ele se tornará um fato (Facts), que representam as principais extrações para a análise. Um fato pode ser representado por um trecho de documento. Este pedaço pode ser exportado para o CaseMap direto do Adobe Reader, bastando sublinhá-lo e apertar o botão correspondente. Depois é possível abrir o documento e localizar o trecho que representa o fato direto nos registros do CaseMap. Um fato pode, também, ser uma descrição redigida pelo próprio usuário do software, podendo se referir a diversos documentos.

Interessantes são as possibilidades de anotação das datas e das normas envolvidas. Não é preciso saber datas exatas de fatos, é possível colocar pontos de interrogação no dia, mês e ano por exemplo ou indicar períodos e datas aproximadas. Quanto às normas, existe um cadastro específico para elas. Pode-se colocar uma lei e, depois, os artigos relevantes. O sistema funciona melhor nos EUA, onde os precedentes são atualizados constantemente, à medida que o conteúdo da LexisNexis é atualizado.

Conforme corre a leitura, as relações vão sendo construídas pelas descrições dos fatos que citam os objetos e pelos ajustes e complementos destes a cada novo documento lido.

Quando o contexto começa a ficar mais claro, é o momento da criação das questões (Issues) principais do caso, as quais vão permitir que todo o material ganhe uma taxonomia, sendo agrupada pelos tipos de questões às quais está ligada. Basta selecionar um termo para cada fato ou objeto, como na figura ao lado, que é a ampliação da parte lateral direita da primeira interface apresentada. Com base nas questões é possível fazer, ainda, uma reflexão sobre as prioridades do caso. Tudo isso armazenado em campos com números, setas e marcações, com cliques que permitem anotações constantes sobre cada registro feito.

A medida que você se familiariza com o programa, a velocidade de leitura e anotações ficará parecida com a gasta em outras metodologias de análise. Mas o investimento de todo esse tempo cadastrando, descrevendo e ajustando os registros dos objetos, dos fatos e das questões, gera outros frutos, como a facilidade de cruzar as informações em relatórios.

Existem diversos tipos de relatórios que podem ser gerados pelo software. Quer saber todos os documentos relevantes para determinada pessoa ou organização? Pronto! Quer saber quais as questões mais importantes para o seu cliente e para a parte contrária? É pra já! Quer gerar um PDF do caso e o enviar para um cliente? Feito! Veja o exemplo abaixo com base no caso modelo:

Outras funcionalidades podem ser encontradas no CaseMap, como pesquisa nos registros, possibilidade de uso compartilhado por várias pessoas e integração com outras ferramentas da suíte de aplicativos para análise de casos da LexisNexis — como o TimeMap, que transforma o conteúdo do CaseMap em uma linha do tempo para navegação visual.

O software possui, ainda, ferramentas para o tratamento de documentos em lotes, como carimbar todas as páginas para garantir a sequência — como em um cartório; importar vários documentos numa mesma ação e automatizar procedimentos repetitivos com scripts programados.

No mercado, em língua inglesa, é possível encontrar ferramentas de concorrentes com funcionalidades semelhantes, como o MasterFile e, especialmente, o Case Notebook, da Thomson Reuters, também uma provedora mundial de conteúdo jurídico.

A intenção, como explicitei, muito mais do que demonstrar um software, é indicar que uma boa estratégia de abordagem das informações de um caso, seja volumoso ou não, pode significar a condição de resposta efetiva para a perguntas que receberemos, ou melhor, que teremos que descobrir.

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    é bacharel em Direito, especialista em Gestão de Sistemas de Informações e, atualmente, mestrando em Mídia e Conhecimento pela Engenharia de Produção da UFSC. Orientado pelo Professor Hugo Hoeschl, Dr..

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