Contingenciamento da verba

Desvio de finalidade da CIDE combustíveis pode ser questionado no STF

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19 de novembro de 2014, 5h37

Diante do aperto do Tesouro, anuncia-se o retorno da cobrança da contribuição de intervenção no domínio econômico (CIDE) sobre os combustíveis para reforço da arrecadação federal em época de desequilíbrio fiscal finalmente reconhecido pelo Governo.

A CIDE foi introduzida na Constituição pela Emenda Constitucional 33/2001, que, ademais, previu a possibilidade de ela ser reduzida e restabelecida não por lei, mas por decreto (e sem obedecer a anterioridade tributária). Concentra assim demasiado poder no Executivo, o que já é de legitimidade questionável.

As finalidades da CIDE-combustíveis estão no artigo 177 da Constituição e não contemplam acertos contábeis ao fim do exercício financeiro. São três as destinações: subsidiar preços de combustíveis, financiar projetos ambientais nesse setor e financiar a infraestrutura de transportes.

As finalidades constitucionais determinam o desenvolvimento de políticas públicas que implicam em despesas a serem custeadas pela tributação de que se trata. Políticas públicas são ações do Estado, legislativas e administrativas, tendo como meta a produção de certos resultados. No caso, estes estão previamente definidos pela Lei Maior, que é a Constituição.

É de lembrar que o Supremo Tribunal Federal já procedeu a interpretação conforme da lei orçamentária de molde a impedir que o contingenciamento da mesma CIDE-combustíveis pudesse ensejar o risco de emprego da sua arrecadação em outras finalidades que não as previstas na Constituição (ADI 2.925).

Um tema que poderá ser levado ao Supremo Tribunal Federal é exatamente esse da validade do contingenciamento de verbas afetadas a uma política pública constitucional, pois neste caso o bloqueio de recursos já soa a desvio de finalidade. Mais ainda, quando se demonstrar que não há projetos para emprego constitucionalmente válido da CIDE, a própria cobrança da CIDE seria ilegítima. E se, não existirem projetos em volume suficiente para se alcançar o montante arrecadado com a CIDE, então será o caso de se reduzir o tributo ou suspender a sua cobrança. Tudo isso porque a CIDE tem um fato gerador acessório que é a sua destinação constitucional.

E o fato gerador principal da CIDE? É a saída do combustível da usina, portanto próprio do IPI-imposto sobre produtos industrializados. É de se perguntar: porque, então existir uma CIDE? A resposta a essa questão há que ser buscada nos Anais do Congresso Nacional, mas uma coisa é certa: não sendo formalmente considerada um IPI, a CIDE não integra os Fundos de Participação de Estados e Municípios — problema federativo grave que, em outras circunstâncias, já levado ao STF.

Aguarde-se, portanto, o desenrolar do processo legislativo, que poderá por à prova a constitucionalidade da CIDE e de sua cobrança, e ensejar o controle do STF sobre questões que estão a clamar por exame com lupa, pois que a sua gestão, nem sempre transparente, pode configurar uma afronta à Carta Magna e à cidadania fiscal. Pena de desvio de finalidade, a CIDE não é instrumento válido para fechar as contas públicas.

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