Direito autoral

Audiência pública começa a definir limites de atuação do Ecad

Autor

  • Gonzaga Adolfo

    é doutor em Direito pela Unisinos e pesquisador na área dos Direitos Autorais professor da Ulbra Gravataí e do Programa de Pós-Graduação em Direito (Mestrado e Doutorado) da Unisc e ex-presidente (gestão 2011/2013) da Comissão Especial de Propriedade Intelectual da OAB-RS.

17 de março de 2014, 14h16

O sistema autoral legislado é fruto do final do século XIX. É dele a Convenção de Berna, que já no quase século XX regulou num primeiro instante, em plano internacional, a construção do modelo de Direitos Autorais que se espalhou mundo afora, mormente naquele oriundo do sistema francês que imperou na Europa continental.

Este cânone hoje está em apuros por vários fatores, desde a regulação, que deve ser urgentemente atualizada em decorrência, principalmente, do verdadeiro tsunami ocorrido no modelo a partir da nova realidade imposta pela tecnologia, até a adequação das previsões infraconstitucionais aos princípios emanados da Constituição Federal.

Os focos e os níveis de conflitos, então, são inúmeros. E não são restritos às obras musicais, vão muito além e para criações de outros naipes.

O trato dos cuidados com os interesses daqueles que vivem de suas criações intelectuais em nível de obras musicais e lítero-musicais tem um bom sustentáculo na gestão coletiva de direitos autorais.

Esta modelagem, no entanto, enfrenta ao mesmo tempo igual crise, como no que pertine ao modelo global de Direitos Autorais. De um lado, o extasiamento com o que a técnica de possibilidades cada vez mais infinitas mostra ser possível alcançar com os novos mecanismos em instantes, e de outro, um sistema que, de certo modo, se configura como injusto ao tirar de seu epicentro aquele que deveria ser sempre a figura principal, o autor.

Inacreditavelmente, foi construído um Direito Autoral no qual se tem a impressão de que o sujeito menos importante é o autor. Dito de outro modo, se poderia falar em Direitos Autorais sem autores. E isso, é claro, é inadmissível.

Nesta linha de mira, e para melhor e mais eficazmente proteger os autores, especialmente aqueles que sobrevivem desta atuação cultural, a denominada gestão coletiva dos Direitos Autorais é, indubitavelmente, uma boa solução para a proteção dos titulares, seja de direitos de autor de forma estrita ou dos direitos conexos (particularemente os dos artistas, intérpretes e executantes musicais).

A técnica fantástica destes anos, sem incredulidade, muito agregará nesta perspectiva.

A atuação desde 1973 (com a Lei de então, a de nº 5.988) de uma corporação central arrecadadora única, o ECAD, no entanto, sempre foi alvo de críticas de vários atores deste teatro, de titulares de direitos autorais a empresas e passando pelo público consumidor. Em alguns instantes chegou a ser unanimidade.

Observe-se, ainda, como uma boa ideia pode se perder em um emaranhado burocrático e econômico de várias significações. A gestão coletiva, e nela o ECAD, sem desconfiança, são excelentes idealizações e estampam várias possibilidades.

Agora, a crise é a mesma: o ECAD não pode ser maior que o autor. Ou sufocá-lo. E a gestão coletiva não pode deixar de levar em conta interesses outros do público consumidor, muitas vezes garantidos por sustentáculos também constitucionais como são os Direitos Autorais. O direito à educação, à cultura e à informação são alguns deles.

Passados 40 anos, após Comissões Parlamentares de Investigação de sua atuação, e ainda de ter sido parte passiva em demanda administrativa no CADE com imposição de multa significativa, a gestão coletiva em geral e o ECAD particularmente têm novo formato no Brasil em 15 de dezembro de 2013, com a entrada em vigor da Lei nº 12.853.

Os dispositivos do novo regramento legal demonstram que, ao menos em tese e na construção legal, os autores estarão no centro do sistema, que observa também com olhar atento o interesse dos consumidores.

Democracia e transparência são valores que emergem cristalinamente no novo sistema construído na Lei de Direitos Autorais com as alterações introduzidas.

Em novembro último, a Abramus e outras instituições ligadas à gestão coletiva distribuíram ação direta de insconstitucionalidade – ADIN, contra anova lei.

O parecer do Procurador-Geral da República nesta Adin demonstrou concordância com as alterações profundas na sistemática de arrecadação e distribuição. Embora não vincule a decisão final, é um indicativo.

Nesta segunda-feira, dia 17 de março, o Supremo Tribunal Federal realizará audiência pública em Brasília, para ouvir os interessados na matéria, e assim fortalecer a decisão mais democrática possível sobre a constitucionalidade ou não da nova forma de regulação da gestão coletiva de direitos autorais em nosso país. Foi convocada pelo relator da referida Adin, Ministro Luiz Fux.

Oxalá os dados estatísticos e a prática do porvir comprovem que estávamos certos ao assim elaborar. E os autores que sobrevivem de sua arte possam ser o verdadeiro centro do sistema autoralista pátrio, continuando no futuro cada vez mais a construir um país de mais paz, harmonia e justiça social com sua arte transformadora e libertadora.

Consigna-se, por oportuno, a posição deste pesquisador pela constitucionalidade plena da Lei nº 12.853.

Com a palavra, o Supremo Tribunal Federal.

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