Eleição direta

Juízes e desembargadores devem escolher presidente de TRF

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2 de março de 2014, 9h05

Durante a pujança do Governo Castello Branco, onde se verificou o ápice do movimento ditatorial no Brasil, nasceu a Lei Ordinária Federal 5.010/1966, cujo título traduzia uma falsa expressão das liberdades individuais, eis que logo no seu cabeçalho se alertava: “Organiza a Justiça Federal de primeira instância e dá outras providências”. Rememoro que no mesmo ano houve o fechamento do Congresso Nacional.

Por incrível que possa parecer, esta ainda é a lei máxima da Justiça Federal dos dias modernos.

Dos tempos do crime organizado, dos crimes cibernéticos, dos tempos da acentuada corrupção, dos tempos das novas relações consumistas, previdenciárias, administrativas, ambientais, de saúde e tantos outros temas que tocam diretamente nos lares de todos os brasileiros. Vale citar, por exemplo, que partiu da Justiça Federal o reconhecimento do confisco da poupança nacional logo nos idos dos anos 1990, berço da democracia atual.

Pois bem, essa pequena introdução se presta para localizar o leitor no tempo, para que possa perceber que algo de vetusto está no ar. Justiça Federal que é a responsável por autorizar as várias operações da Polícia Federal para defesa do povo brasileiro, que tanto se aplaude, disciplinadas nos limites das decisões judiciais. E esta respeitada instituição está submetida aos termos da Lei 9.266/96, que organiza seu funcionamento. Pontua-se, lei esta promulgada após o advento da Constituição Federal de 1988, estando a Polícia (judiciária) Federal devidamente democratizada.

E não é só, a Lei 8.112/90 democratizou o serviço público federal como um todo; a Lei 8.625/93 organizou o Ministério Público; a Lei 9.020/95 tratou das Defensorias Públicas da União; a Lei 8.443/92 disciplinou o serviço prestado pelo Tribunal de Contas da União, e poder-se-ia citar tantas carreiras de Estado que hoje estão organizadas sob os pressupostos democráticos.

Mas os juízes federais, responsáveis primeiros pela democracia, pelas garantias individuais apregoadas no próprio art. 5º da CF/88, são regidos pelas normas da ditadura militar. O que explica isso? 

Sem medo de errar, o reconhecimento pelos próprios fatos da existência de uma espécie de ditadura judiciária. Aqui não se pretende abordá-la em todos os seus termos, senão relacionada quanto ao funcionamento dos Tribunais Regionais e a eleição das suas cúpulas, hoje plenamente restrita e fechada.

Acontece que tramita no Conselho Nacional de Justiça o Pedido de Providência 0004458-36.2013.2.00.0000 para os fins de se determinar um prosseguimento célere no encaminhamento do anteprojeto da nova Lei de Organização Judiciária da Justiça Federal ao Congresso Nacional, estando hoje no Superior Tribunal de Justiça — Proc. nº CF-PPN-2012/00115 —, já que foi trazida pela Lei 7.729/89 a ordem de sua atualização, art. 11 , fixando o prazo de 90 dias para sua implementação servindo tanto para o primeiro grau como para o segundo grau, é dizer, aos Juízes e Desembargadores Federais.

Passaram-se 23 anos até que alguns assumissem a responsabilidade de Democratizar a Justiça Federal.

Com efeito, a Constituição Federal de 1988, ao extinguir o Tribunal Federal de Recursos e dar um tratamento diferenciado entre a Justiça Federal e a Justiça dos Estados , revogou grande parte da Lei Orgânica da Magistratura “Federal” — hoje recepcionada pela Constituição Federal — especialmente na parte que trata da eleição dos órgãos de cúpula — Presidências, Vice-Presidências, corregedorias, etc — referidas no art. 89, inc. I, parágrafo 2º , “e” , fazendo incidir apenas as linhas gerais do art. 21, inc. I , que estabelece ser da competência dos Tribunais eleger “seus presidentes e demais titulares de sua direção, observado o disposto na presente Lei”. 

Acontece que não há mais o que se observar na Loman para os Tribunais Regionais Federais (…observado o disposto na presente Lei), simplesmente porque o Tribunal Federal de Recurso deixou de existir!

De fato, como se vê na parte que se refere aos Tribunais Regionais Federais, não previstos ao tempo da Loman, criados que foram pela Constituição de 1988, os mesmos devem ser regidos pela Lei de Organização Judiciária da Justiça Federal, que nada dispõe a respeito sobre a eleição de seus membros, porquanto anacrônica.

No ponto, estão regidos os TRFs apenas por seus regimentos, que não possuem força de lei, em uma situação provisória e dissonante dos pressupostos democráticos colacionados pela Constituição Federal, inclusive tratado pelo referido art. 5º da Constituição de 1988 donde “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. É esdrúxula a situação.

E para dirimir quaisquer dúvidas, a própria CF, ao dispor sobre a organização dos Tribunais, não fez incluir a reserva legal da lei complementar para disciplinar a questão, prevendo seu funcionamento genericamente no art. 96, I, “a” , de modo que a Lei Ordinária pode — e deve — disciplinar as formas de eleição dos órgãos diretivos, em especial dos presidentes dos Tribunais Regionais Federais. Vale ressalvar que para os Tribunais Estaduais ainda prevalece os termos do art. 102 da Loman, cuja capacidade eleitoral é restrita aos seus Desembargadores.

Pontua-se que tramitam no Congresso Nacional diversas propostas de emendas à Constituição para democratizar a Justiça no Brasil, onde se destaca a renomada PEC 187/2012 , do ilustre deputado Wellignton Fagundes.

Para a Justiça Federal basta sua Lei de Organização Judiciária.

Portanto, cabe ao Superior Tribunal de Justiça, o Tribunal da Cidadania, mediante a indução do Conselho Nacional de Justiça, fazer valer sua autodenominação para disciplinar o início do processo de democratização de todo o Poder Judiciário, pela exemplaridade na Justiça Federal, mediante o estabelecimento de eleições diretas para os presidentes dos Tribunais Regionais Federais por todos os desembargadores e juízes Federais.

Que venha a democracia no Poder Judiciário.


Referências
[1] Art. 11. O Conselho da Justiça Federal, no prazo de 90 (noventa) dias, elaborará anteprojeto de lei, dispondo sobre a organização da Justiça Federal de primeiro e segundo graus.
[2] Vide MS 23.337 do Supremo Tribunal Federal.
[3] Art. 89, § 2º, “e” da Loman: Art. 89 – O Tribunal Federal de Recursos funciona: § 2º – Compete, ainda, ao Tribunal Pleno: e) dar posse aos seus Ministros e aos titulares da sua direção.
[4] Art. 21 – Compete aos Tribunais, privativamente: I – eleger seus Presidentes e demais titulares de sua direção, observado o disposto na presente Lei;
[5] Art. 96. Compete privativamente: I – aos tribunais: a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos;
[6] Art. 102 : Os Tribunais, pela maioria dos seus membros efetivos, por votação secreta, elegerão dentre seus Juízes mais antigos, em número correspondente ao dos cargos de direção, os titulares destes, com mandato por dois anos, proibida a reeleição.
[7] Altera o Art. 96 passando a seguinte redação: Compete privativamente: I – aos tribunais: a) eleger seus órgãos diretivos, por maioria absoluta e voto direto e secreto, dentre os membros do tribunal pleno, exceto os cargos de corregedoria, por todos os magistrados vitalícios em atividade, de primeiro e segundo graus, da respectiva jurisdição, para um mandato de dois anos, permitida uma recondução.

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