Artigo produzido no âmbito das pesquisas desenvolvidas no Núcleo de Estudos Fiscais (NEF) da Direito GV. As opiniões emitidas são de responsabilidade exclusiva de seus autores.
O sistema federativo brasileiro está ameaçado por parecer recentemente adotado pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. A prosperar o relatório do senador Luiz Henrique ao projeto de lei complementar PLS 130/2014, já não será mais necessário o voto unânime dos estados no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) para validar isenções, incentivos e outros benefícios criados pelos estados em desacordo com a Constituição, que constituem a chamada “guerra fiscal” do ICMS.
O projeto original, da senadora Lúcia Vânia, simplesmente convalidaria todos os incentivos existentes. Mas o relator, dando-se conta de que o texto estava em flagrante violação da competência dos estados e seria certamente repelido pelo Supremo, propõe, ao invés, método indireto de alcançar o mesmo fim: o relaxamento do critério de unanimidade no Confaz.
A rapidez com que o projeto está tramitando — o projeto data de 16 do mês passado — decorre da possível adoção, pelo STF, do projeto de Súmula Vinculante 69, que extinguiria todos os incentivos fiscais estabelecidos à revelia do Confaz. O projeto, pensam os senadores, daria base legal aos atuais incentivos do ICMS e abortaria a emissão da súmula.
A ideia de impor a um ou a alguns estados, por decisão de maioria ainda que qualificada de outros estados, mudanças tributárias substantivas, implicando perda de receitas fiscais, é inconcebível num regime federativo. O espaço fiscal do estado, como definido na Constituição, não pode ser violado. Assim é nos países de federação robusta, os Estados Unidos por exemplo. E também na União Europeia onde, não obstante existir ampla harmonização legislativa e regulatória, mudanças tributárias que afetem outros estados membros somente podem ser adotadas com aprovação unânime dos membros.
Ao contrário do que pregam os defensores do projeto, sua adoção não acabaria com a guerra fiscal; antes, iria tornar pior o que já está ruim. Até o judicioso coordenador do Confaz, José Barroso Tostes Neto, manifestou-se contrário ao projeto. Para acabar com a guerra fiscal, bastaria uma regra simples: vedar a um estado tributar residentes de outro estado. Ou seja, nas vendas interestaduais, eliminar a tributação na origem. Claro que com regras de transição.
Comentários de leitores
2 comentários
ICMS devido no destino
J. Ribeiro (Advogado Autônomo - Empresarial)
A tal guerra fiscal somente será drasticamente reduzida se houver mudança na sistemática de tributação do ICMS e transformá-lo definitivamente no IVA, cobrado sempre no destino, ou seja, devido ao Estado onde está localizado o consumidor/comprador.
Dar maior autonomia(e responsabilidade) aos Estados para a realização de suas políticas fiscais e orçamentárias.
Com as mudanças na comercialização de produtos, principalmente de consumo, operações de compras de mercadorias crescentes por meio das empresas "ponto.com" (internet), não há volta.
O entrave maior é o governo de São Paulo, mesmo tendo o maior mercado consumidor, que não quer abrir mão de sua parcela nas vendas para outros Estados, o que é lamentável.
Diagnóstico Correto, Remédio Errado
Jorge Bezerra (Defensor Público Estadual)
De fato, a proposta que tramita no Senado tende a acirrar a guerra fiscal. Perfeita análise do professor Isaías Coelho.
Contudo, a proposta para acabar com a guerra fiscal é, ao meu ver, simplória e se não tivesse tantas implicações negativa já teria sido aprovada há 20 anos atrás, quando começou a ser ventilada.
A gênese da guerra fiscal está da diferenciação das alíquotas pelo critério da distinção geográfica - separação pais em duas grandes regiões: Região rica (S e SE) e Região Pobre (N, NE e CO). Em termos tributários, é mais interessante estabelecer indústria ou distribuição nos estados do S e SE, cuja alíquota do ICMS para as regiões ditas consumidoras é de 7% (o que considerando a tributação por dentro do imposto também impacta nas contribuições que incidem sobre o faturamento). Assim, os estados das regiões N, NE e CO tem que oferecer vantagens adidicionais para atrair atividade industrial e de distribuição.
A solução proposta, por simples que seja, não resolve o problema das desigualdades regionais, que se procurou corrigir com as alíquotas regionais.
Para acabar com a guerra fiscal deve-se: Acabar com a distinção de alíquotas por critério geográfico, estabelecendo alíquotas uniformes em todo o país. Utilizar a diferenciação de alíquotas por produto [ou classes de produtos], em razão da essencialidade [mantida a uniformidade nacional]. Estabelecer critério de repartição de receita dos estados ditos desenvolvidos [regiões sul e suldeste] para os demais, nas operações interestaduais, o que pode ser feito facilmente com a base de dados da Nota Fiscal Eletrônica, mantido o mesmo nível de rateio de receitas que se consegue as alíquotas regionais.
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