Referência para empresas

Prefeitura de São Paulo fixa regras para Lei Anticorrupção

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14 de maio de 2014, 21h41

Enquanto a Presidência da República ainda estuda como será aplicada a Lei Anticorrupção em âmbito federal, a Prefeitura de São Paulo publicou, nesta quarta-feira (14/5), critérios para avaliar como os casos serão analisados na esfera administrativa municipal. A regulamentação centraliza os processos na Controladoria-Geral do Município, fixa prazos, dá descontos para quem fizer acordos de leniência e aponta quais mecanismos de compliance pesarão no momento de avaliar a conduta de empresas.

A Lei 12.846/2013, em vigor desde janeiro deste ano, responsabiliza pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, tanto nacional quanto estrangeira, nas áreas civil e administrativa. O texto tem gerado preocupação em empresas e escritórios de advocacia, já que as penas são duras — podem chegar a 20% do faturamento bruto do exercício anterior — e o governo federal ainda não editou sua regulamentação, que deve servir de modelo para que municípios e estados de todo o país façam normas próprias.

Segundo o decreto paulistano, quaisquer agentes públicos que tiverem conhecimento de atos ilícitos deverão comunicar a Controladoria-Geral do Município, órgão responsável pela instauração da sindicância e do processo administrativo. “Todo mundo reclama da lei, inclusive eu, por atribuir competência muito difusa a quem vai aplicá-la. A Prefeitura de São Paulo acertou ao concentrar tudo na CGM. Outros órgãos podem até investigar, mas quem vai instaurar o procedimento administrativo é a CGM”, avalia o advogado Giovanni Falcetta, responsável pela área de compliance do escritório Aidar SBZ.

A instauração do processo será publicada no Diário Oficial da cidade, com dados da pessoa jurídica e da comissão processante que vai analisar o caso. Haverá prazo de 30 dias para apresentação de defesa, a partir da citação. A comissão processante, formada por três servidores estáveis, deverá concluir o processo em 180 dias — prazo sujeito a prorrogação — e apresentar relatórios com as conclusões e propostas de sanções quando for constatada irregularidade. Só depois de um período para alegações finais será proferida a decisão da autoridade instauradora, sujeita a interposição de um único recurso.

O artigo 21 do decreto municipal estabelece nove pontos que serão levados em conta para a aplicação de sanções, como o grau de lesão, a situação econômica do infrator e a existência de “mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades”, incluindo-se a efetividade dos sistemas adotados, a utilização de códigos de ética e conduta para funcionários e colaboradores, a proteção ao anonimato em caso de denúncias e a realização periódica de treinamentos. Os parâmetros podem ser mudados quando o governo federal publicar seu regulamento.

Acordos de leniência
Foi definida uma espécie de “bônus” quando empresas firmarem acordos de leniência para cooperar com as autoridades. Haverá desconto de até dois terços da multa devida se pessoas jurídicas denunciarem envolvimento em casos de corrupção antes que uma investigação seja aberta, sendo possível ainda a isenção ou a atenuação de sanções administrativas estabelecidas nos artigos 86 a 88 da Lei de Licitações (8.666/1993). Quando as empresas apresentarem proposta de acordo após a ciência da instauração de procedimentos, só será possível reduzir no máximo um terço da multa aplicável. A lei federal não permite a isenção total da pena.

Caso a pessoa jurídica forneça provas falsas, omita ou destrua provas, os benefícios serão extintos. A negociação do acordo de leniência será confidencial e pode durar até 60 dias da apresentação da proposta — o prazo pode ser prorrogado. Mas não haverá acordo após a comissão processante encaminhar o relatório com sugestões de sanções. Os valores arrecadados com as penalidades deverão ser encaminhados a um fundo para ações nas áreas de saúde e educação.

O advogado Giovanni Falcetta destaca ainda outros dois pontos do decreto. Um deles é a possibilidade de cumulação das penalidades, caso a pessoa jurídica cometa simultaneamente duas ou mais infrações. Outro é a possibilidade de que a aplicação de penas ocorra antes do direito à defesa em casos específicos, com um dispositivo que estabelece o cumprimento do disposto no artigo 48 de outra lei, a 14.141/2006: “Quando se tratar de infrações administrativas que possam resultar na aplicação de pena de caráter pecuniário não contratual, bem como naquelas que possam acarretar risco à saúde, à segurança e à integridade física de pessoas e bens, o direito à ampla defesa será exercitado após a imposição da penalidade.”

À espera
O governo de São Paulo também já tem regulamentação específica, publicada um dia após a Lei Anticorrupção ter entrado em vigor. O julgamento de processos administrativos fica sob a responsabilidade de autoridades diferentes: na administração direta, pode ser feito por secretários estaduais, pelo procurador-geral do estado ou pelo presidente da Corregedoria-Geral da Administração; na administração indireta, o responsável é o dirigente superior de cada entidade. Não há descontos expressos para quem fizer acordos de leniência.

Questionada pela revista Consultor Jurídico, a Controladoria-Geral da União (CGU) disse não ter levantamento de municípios e estados que já possuem decretos próprios sobre o tema. No âmbito federal, a regulamentação está na Casa Civil, após receber sinal verde do Ministério da Justiça e da Advocacia-Geral da União. O ministro-chefe da CGU, Jorge Hage, reconhece a demora na edição do decreto, mas afirma que a falta dele “não impede a vigência da lei, até porque o legislador não colocou o decreto como pré-condição para a sua vigência”.

Clique aqui para ler o decreto municipal.

* Texto atualizado às 16h50 do dia 15/5/2014 para acréscimo de informação.

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