Jogo sujo

Advogados "armam" prisão de adversário nos EUA

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13 de maio de 2014, 11h32

Em janeiro de 2013, o advogado Charles Campbell Jr., da banca Shumaker, Loop & Kendrick, saiu do tribunal, no final da tarde, e foi para um bar-restaurante que frequentava assiduamente, nas cercanias da corte. Sentou-se no bar e, logo depois, uma assistente jurídica — paralegal, nos EUA — da banca Adams & Diaco, se aproximou com dois drinques não mão.

Os dois conversaram e beberam por mais de duas horas. Melissa Personius se apresentou como paralegal de outra banca — não da Adams & Diaco — que era adversária de Campbell em um julgamento em andamento. Quando saíram, ela pediu a Campbell para dirigir o carro dela. O advogado resistiu, mas foi convencido. Mal deixou o estacionamento, foi parado pela Polícia. Foi preso por dirigir embriagado.

O policial algemou o advogado e o colocou na viatura, sem sequer permitir que apanhasse sua pasta e todo o material que carregava. Tudo o que ficou no carro da paralegal era o material que Campbell usava no julgamento em curso.

Ele representava um radialista que moveu uma ação, por calúnia e difamação, contra outro radialista concorrente. Os dois tinham shows em que o humor, o drama e as agressões verbais eram a tônica. O demandado no processo civil era defendido pelos advogados Robert Adams, Stephen Diaco e Adam Filthaut, todos da Adams & Diaco.

A história foi contada no Jornal da ABA e nos jornais Tampa Tribune e Tampa Bay Times. De acordo com as investigações do comitê regional da ABA, dos promotores e da própria Polícia, pelo menos um dos advogados da Adams & Diaco foi até o carro da paralegal do escritório e manuseou todo o material que o colega oponente deixou no carro. Não se esclareceu, ainda, que uso os três advogados fizeram disso.

Enquanto estavam no bar, a paralegal fez telefonemas para os advogados do escritório, que se comunicaram com um sargento da Polícia de Tampa, amigo pessoal de um dos advogados. O sargento estacionou nas cercanias do bar-restaurante e esperou Campbell dirigir o carro da paralegal por uma curta distância, para pará-lo e prendê-lo. Depois que a história saiu na imprensa, a Polícia demitiu o sargento.

A Promotoria, por sua vez, desistiu do processo por embriaguez ao volante contra Campbell. Em seu relatório, a Promotoria afirmou que os advogados prepararam uma armadilha para prender seu oponente e examinar seus documentos e provas.

O passo seguinte foi abrir investigações, com a ajuda da Polícia e do FBI, contra os três advogados da Adams & Diaco. No processo, conseguiram mandado judicial para apreender os celulares dos advogados, da paralegal e do sargento. Assim confirmaram que mensagens foram trocadas e telefonemas foram feitos, no horário em que a paralegal estava no bar.

ABA em ação
Por seu lado, a seccional da Flórida da American Bar Association (ABA) — a OAB local — anunciou que uma investigação, que durou um ano, encontrou “causa provável” para abrir um processo por violação da ética profissional contra três advogados de Tampa. A seccional também acredita que os advogados “armaram” para que a Polícia prendesse o advogado da outra parte, a fim de levar vantagens no julgamento em curso.

O comitê de queixas da ABA pediu ao Tribunal Superior da Flórida a indicação de um juiz para servir como árbitro no processo disciplinar que vai mover contra os advogados da Adams & Diaco. Se considerados culpados, o juiz encaminhará o caso ao Tribunal Superior, que tomará a decisão final. As penas podem ser de advertência, suspensão ou cancelamento da licença para advogar.

Os advogados estão sendo acusados pelo comitê da seccional da ABA de violar as seguintes regras do Código de Ética dos advogados:

– Obstruir ilegalmente o acesso de uma pessoa a provas ou alterar, destruir ou esconder um documento ou outro material que um advogado deve saber que é relevante em um julgamento pendente ou vindouro;

– Apresentar, participar na apresentação ou ameaçar apresentar ação criminal com o fim de levar vantagem em um processo civil;

– Usar de meios, ao representar um cliente, com o propósito principal de embaraçar, atrasar ou oprimir outra pessoa ou, conscientemente, usar métodos para obter provas que violam os direitos jurídicos de tal pessoa;

– Violar ou tentar violar as regras da ordem dos advogados de conduta profissional ou, conscientemente, auxiliar ou induzir alguém a quebrar as regras;

– Praticar fraude, desonestidade, logro ou declaração falsa concernente;

– Envolver-se em conduta prejudicial à administração da Justiça, incluindo, conscientemente ou através de indiferença insensível, depreciação, humilhação ou discriminação, em uma ação judicial, contra as partes, jurados, testemunhas, pessoal do tribunal ou outros advogados.

Complicação com cliente
O caso entre os dois radialistas terminou em acordo e não haverá recurso. A única novidade, no que se relaciona a essa ação, é que o cliente de Campbell o está processando. O novo advogado do radialista Todd “MJ” Schnitt, Wil Florin, está exigindo, na Justiça, que Campbell retorne a seu cliente US$ 1 milhão, que recebeu adiantado para defendê-lo, e que cancele uma dívida de outro US$ 1 milhão. No total, Campbell cobrou US$ 2 milhões em honorários.

Depois do acordo no julgamento contra o outro radialista, Shnitt descobriu que, se ganhasse a causa, receberia uma indenização por danos que poderia variar de US$ 15 mil a US$ 25 mil. Segundo Schnitt, Campbell tirou proveito da raiva que sentia do radialista concorrente e não o advertiu que não valeria a pena gastar US$ 2 milhões para receber, na melhor das hipóteses, US$ 25 mil.

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