Danos a residência

Falha de bombeiros em apagar incêndio gera indenização

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10 de maio de 2014, 7h57

A experiência mostra que é improvável um imóvel ser atingido por incêndio duas vezes na mesma noite, sem que haja nexo de causalidade entre os eventos. Assim, se o Estado não faz prova dessa improbabilidade, já que é seu dever legal, tem de indenizar o proprietário pelo deficiente serviço em caso de apuração de prejuízo.

O entendimento levou os integrantes da 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul a reconhecer a responsabilidade do Estado no combate ineficiente de um incêndio ocorrido em Caxias do Sul. Como não houve o chamado ‘‘rescaldo’’, após o primeiro registro de incêndio, o fogo voltou horas depois e consumiu inteiramente a residência.

Conforme o acórdão, que reformou a decisão da primeira instância, a família irá receber R$ 35 mil a título de reparação moral. Os danos materiais deverão ser apurados em liquidação de sentença no juízo de origem, até o valor máximo de R$ 55 mil, como informado na inicial da ação indenizatória.

O relator da Apelação, desembargador Eugênio Fachini Neto, disse que o Estado não trouxe nem mesmo um laudo que apontasse as causas do incêndio. Sequer as fotografias, que foram tiradas quando do atendimento da ocorrência do evento, vieram aos autos.

‘‘Nesse contexto, a ausência de adoção de medidas preventivas de recidiva do incêndio no local ou à certificação da sua completa extinção, o que se conclui inclusive em razão do pouco tempo em que a unidade de socorro lá permaneceu, é o que basta à caracterização do defeito na prestação do serviço público e, portanto, da responsabilidade do Estado pelos danos decorrentes do segundo incêndio na casa dos autores’’, disse o relator. O acórdão foi lavrado na sessão de 30 de abril.

O caso
A casa dos autores, localizada na comarca de Caxias do Sul, foi tomada pelo fogo por volta das 21 horas do dia 5 de junho de 2006. Chamados ao local, os bombeiros teriam demorado cerca de 30 a 40 minutos. O fogo acabou debelado por vizinhos e populares. A guarnição se retirou do local sem, contudo, fazer o ‘‘rescaldo’’, para evitar a volta do fogo.

Durante a madrugada, um novo foco incêndio foi registrado na residência. Dessa vez, porém, os  bombeiros chegaram rapidamente ao local. A presteza, entretanto, não livrou a casa da destruição total. Os autores atribuíram a falha ao fato do trabalho não ter sido bem-feito na primeira vez e ao uso equipamentos de combate a incêndio danificados na segunda.

Em função da perda total da casa, a família ingressou em juízo com ação indenizatória contra o estado do Rio Grande do Sul. Pediu danos materiais no valor de R$ 55 mil, para compensar a perda total da casa; e danos morais no valor de R$ 5 mil para cada um dos três membros — o casal e uma filha menor.

Já o Estado alegou a inexistência de nexo entre o fogo surgido na madrugada e o evento anterior, o que afastaria a relação de causa e consequência. Disse que a causa provável seria um curto-circuito ocorrido num dos quartos da residência, o que demonstra a negligência dos autores com a rede elétrica. Logo, o evento danoso seria culpa exclusiva da vítima.

A sentença
A 2ª Vara da Fazenda Pública da comarca julgou improcedente a ação indenizatória por entender que não foi provado o nexo de causalidade entre a ação/omissão do Estado e o evento danoso, inexistindo, portanto, conduta ilícita a ensejar reparação.

A juíza Maria Aline Vieira Fonseca esclareceu que as ações reparatórias envolvendo pessoas jurídicas de Direito Público, como regra, atraem a responsabilidade civil objetiva, assentada na Teoria do Risco Administrativo, nos termos do artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição. Entretanto, se o dano se deu por suposta omissão do Estado, a responsabilidade passa a ser subjetiva; isto é, deve ser demonstrada a ocorrência de uma das modalidades da culpa: negligência, imperícia ou imprudência.

Nessa linha, analisando o conjunto de provas, disse que não é possível determinar, ‘‘de forma contundente’’, qual o grau de destruição do imóvel se o atendimento tivesse sido efetuado na forma e no tempo alegado pelos autores. Em síntese: não dá para afirmar que a demora tenha sido determinante para a ocorrência do evento danoso.

O segundo foco de incêndio — discorreu a sentença — ocorreu no piso superior da residência, diferentemente do primeiro. Além disso, segundo a documentação anexada aos autos, não foi constatado nexo causal entre o primeiro foco de incêndio e o segundo.

Para a julgadora, no momento em que a guarnição chegou ao local, após o segundo chamado, a casa já estava totalmente consumida pelas chamas na parte superior, onde a construção era de madeira. ‘‘Portanto, independentemente de haver ou não danos no equipamento de combate ao incêndio, o que não restou comprovado nos autos, não se pode afirmar que o fogo seria combatido de forma a não ensejar o grau de prejuízo ocasionado’’, escreveu na sentença.

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