Culpa solidária

Instituição financeira pode ser responsabilizada por dano ambiental

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24 de junho de 2014, 11h08

Em 28 de abril de 2014, foi publicada, pelo Conselho Monetário Nacional, a Resolução Bacen 4.327, de 25 de abril de 2014, que dispõe sobre as diretrizes que devem ser observadas no estabelecimento e na implementação da Política de Responsabilidade Socioambiental – PRSA pelas instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco do Brasil.

Entende-se por “risco socioambiental” como a possibilidade de ocorrência de perdas das instituições financeiras e daquelas demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil decorrentes de danos socioambientais. Tais danos devem ser identificados pelas referidas instituições como um componente das diversas modalidades de riscos a que estão expostas.

A resolução traz dois princípios que devem ser observados pelas instituições para fins de estabelecer e implementar a PRSA. São eles:

i)   princípio da relevância, que seria o grau de exposição ao risco socioambiental das atividades e das operações da instituição; e

ii)  princípio da proporcionalidade, que se revela na compatibilidade da PRSA com a natureza da instituição e com a complexidade de suas atividades e de seus serviços e produtos financeiros.

A PSRA, assim que estabelecida e implementada pela instituição, deve apontar diretrizes que norteiem as ações de natureza socioambiental nos negócios e nas relações com as partes interessadas — clientes e usuários dos produtos e serviços oferecidos pela instituição, a comunidade interna à sua organização e as demais pessoas que, conforme avaliação da instituição, sejam impactadas por suas atividades.

Devem ser estabelecidas, também, diretrizes sobre as ações estratégicas relacionadas à governança da instituição, inclusive para fins de gerenciamento do risco socioambiental.

A resolução permite que as partes interessadas na PRSA sejam estimuladas a participar do seu processo de elaboração a ser estabelecido.

Foi estipulado que, a cada cinco anos, a PRSA seja objeto de avaliação da diretoria e do conselho de administração, se houver.

A resolução trouxe o dever das instituições de manterem estrutura de governança compatível com o seu porte, natureza do negócio, complexidade de serviços e produtos oferecidos, bem como com as atividades, processos e sistemas adotados, para assegurar o cumprimento das diretrizes e dos objetivos da PRSA.

Tal governança deve prover condições para o exercício das atividades de: a) implementação das ações no âmbito da PRSA; b) monitoramento do cumprimento das ações estabelecidas no PRSA; c) avaliação da efetividade das ações implementadas; d) verificação da adequação do gerenciamento do risco socioambiental estabelecido na PRSA; e e) identificação de eventuais deficiências na implementação das ações.

É possível, inclusive, a constituição de um comitê de responsabilidade socioambiental, de natureza consultiva, vinculado ao conselho de administração ou à diretoria executiva com a atribuição de monitorar e avaliar a PRSA, podendo, até, propor aprimoramentos.

Para gerenciamento do risco socioambiental das instituições, devem ser observados alguns pontos, como:

i)       sistemas, rotinas e procedimentos que possibilitem identificar, classificar, avaliar, monitorar, mitigar e controlar o risco socioambiental presente nas atividades e nas operações das instituições;

ii)      registro de dados referentes às pardas efetivas em função de danos socioambientais, pelo período mínimo de cinco anos, incluindo valores, tipo, localização e setor econômico objeto da operação;

ii)      avaliação prévia dos potenciais impactos socioambientais negativos de novas modalidades de produtos e serviços, inclusive em relação ao risco de reputação; e

iv)      procedimentos para adequação do gerenciamento do risco socioambiental às mudanças legais, regulamentares e de mercado.

Tais ações estarão subordinadas a uma unidade de gerenciamento de risco da instituição.

A resolução prevê que as instituições, nos casos de operações que envolvam atividades econômicas com maior potencial de causar danos socioambientais, devem estabelecer critérios e mecanismos específicos de avaliação de risco.

Foi imposta, também, o dever das instituições de estabelecer um plano de ação visando a implementação da PRSA, definindo as ações para adequação da estrutura organizacional e operacional da instituição, se necessário, bem como as rotinas e os procedimentos a serem executados em conformidade com as diretrizes da PRSA, segundo o próprio cronograma especificado pela instituição.

O plano de ação citado deve ser aprovado pela diretoria e, quando houver, pelo conselho de administração, assegurando, sempre, a adequada integração com as demais políticas da instituição, tais como a de crédito, a de gestão de recursos humanos e de gestão de risco.

A resolução determinou que a aprovação da PRSA e o respectivo plano de ação devem ser iniciados conforme o cronograma a seguir:

i)   até 28 de fevereiro de 2015, por parte das instituições obrigadas a implementar o Processo Interno de Avaliação da Adequação de Capital (Icaap), conforme regulamentação em vigor; e

ii)      até 31 de julho de 2015, pelas demais instituições.

As instituições, ao implementarem a PRSA, devem designar diretor responsável pelo seu cumprimento, além de formalizá-la e assegurar sua divulgação interna e externa, bem como manter sua documentação à disposição do Banco Central do Brasil. Este, inclusive, poderá determinar a adoção de controles e procedimentos relativos à PRSA, estabelecendo prazo para sua implementação.

Não há, no entanto, previsão de punição para as instituições que não cumprirem com os prazos ou não implementarem a PRSA.

A resolução está em vigor desde sua publicação.

A norma visa que as instituições financeiras demonstrem como considerarão os riscos socioambientais no processo de gerenciamento das diversas modalidades de risco a que estão expostas.

A implementação da PRSA, na prática, abre portas para um objetivo que vem crescendo na doutrina e na jurisprudência em matérias ambientais, qual seja, a responsabilização solidária das instituições financeiras em casos de ocorrência de danos ambientais em obras financiadas com capital disponibilizado por tais instituições, seja por meio de empréstimos, linhas de créditos, financiamentos ou qualquer tipo de transação econômica figurando como financiadora da obra em que ocorrera o dano, a instituição financeira.

A resolução não traz aspectos de responsabilização solidária das instituições em casos de danos ambientais em obras por ela financiadas, sendo apenas uma diretriz prática de como deverá ser implementada a PRSA, porém, acende um sinal de alerta para as mudanças que estão ocorrendo nesse sentido.

Cresce cada vez mais a mobilização legislativa, jurisprudencial e doutrinária no sentido de que todos os envolvidos em um dano ambiental sejam responsabilizados e compelidos a proceder à remediação, compensação ou, até mesmo, sofrerem punições cíveis e criminais pelos danos ocorridos.

Quanto à situação dos empreendedores, vale o alerta de que, com a implantação da PRSA, as instituições financeiras se revelarão mais um obstáculo a ser vencido para a continuidade do empreendimento, pois deverão ser igualmente convencidas da viabilidade ambiental do empreendimento, mediante a demonstração de todas as licenças e estudos feitos, para que o empréstimo seja autorizado — sem prejuízo de maiores exigências das instituições, pois, uma vez aprovada a liberação de valores, poderá haver uma configuração de nexo de causalidade para um eventual dano na obra financiada e a consequente responsabilização da instituição financeira por tal dano.

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