Mangás e animes

Japão aprova lei contra pornografia infantil, mas não restringe quadrinhos

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20 de junho de 2014, 9h43

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Depois de uma considerável pressão internacional, a Câmara Alta do Parlamento japonês aprovou uma lei, nesta quarta-feira (18/6), que proíbe a posse de pornografia infantil. A produção e a distribuição já haviam sido proibidas anteriormente. Porém, a legislação não proíbe a pornografia infantil em “mangás”, as histórias em quadrinhos japonesas, provavelmente as mais bem-sucedidas do mundo. Nem em “animes”, os populares desenhos animados japoneses.

A nova lei, que vem sendo proposta há dez anos, estabelece que a posse de imagens explícitas de crianças é um delito, punível com até um ano de prisão e multa de até US$ 10 mil. Isso pode ser considerado “um avanço em direção aos padrões internacionais”, disse à CNN Shihoko Fujiwara, da Lighthouse, uma organização sem fins lucrativos que ajuda crianças exploradas. Agora, pessoas em posse de pornografia infantil têm um ano para se livrar dela ou podem ser processadas.

A aprovação da lei foi uma tarefa complexa para o Parlamento japonês devido, em boa parte, a questões jurídicas conflitantes e interesses econômicos pesando nas discussões. Do ponto de vista jurídico, a principal discussão foi sobre o que pesava mais na balança: a proteção às crianças ou a liberdade de expressão das editoras de “mangás” e “animes”.

Mas a presunção geral é a de que o maior peso foi, realmente, o fator econômico: a produção e distribuição de “mangás” e “animes” é uma indústria multibilionária, com negócios em todo o mundo. Segundo o Publishing Science Institute, em 2013, a indústria de “mangás” foi avaliada em US$ 3,6 bilhões, em vendas de revistas e livros. E a indústria de “animes” foi avaliada em US$ 2,3 bilhões, de acordo com o Media Development Research Institute.

A pornografia infantil em histórias em quadrinhos representa apenas uma pequena parcela das publicações caracterizadas como “mangás”. Também há violência, poesia, romance, ação, aventuras, esportes, jogos, dramas históricos, comédia, ficção científica, fantasia, mistério, suspense, histórias de detetive, horror, negócios e sexualidade — e, nesse caso, mais do que isso, o sexo explícito, um costume que, segundo os países que pressionam o Japão, está impregnado na cultura do país.

O Departamento de Estado dos EUA, por exemplo, rotulou o Japão, em um relatório de 2013 sobre práticas de direitos humanos, como “um centro internacional de produção e tráfico de pornografia infantil”.

Na verdade, a própria Polícia do Japão se preocupa com o crescimento da exploração sexual de crianças e adolescentes. Dados da Agência Nacional da Polícia japonesa indicam que o abuso sexual infantil cresceu 20% de 2011 para 2012. As investigações de pornografia infantil, por sua vez, cresceram 9,7% no mesmo período. Foram registrados 1.596 casos, envolvendo 1.264 vítimas, todas crianças, segundo a CNN.

A nova lei japonesa exclui a pornografia infantil em “mangás” e “animes” porque a proibição se refere apenas a crianças reais. Isso deu margem, por exemplo, para o lobista da Associação dos Caricaturistas do Japão, Ken Akamatsu, justificar a exclusão dos desenhos: “Os personagens são imaginários. E como esse tipo de pornografia infantil não envolve crianças reais, ninguém é prejudicado”, disse à CNN.

“Não é aceitável ver crianças de verdade sofrendo e chorando. Porém os “mangás” e “animes” não envolvem crianças reais, de forma que não existem vítimas reais”, declarou.

Mas esse não é bem o caso, diz Shihoko Fujiwara, da Lighthouse: “Predadores sexuais de menores usam os “mangás” para convencer meninas e meninos de que é normal crianças fazerem sexo com homens mais velhos”. Além disso, essas publicações reforçam a noção de que o abuso sexual de crianças é uma coisa normal, que faz parte da cultura do país.

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