10 anos de Reforma

É tempo de evolução no sistema de justiça brasileiro

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13 de junho de 2014, 6h49

No limiar dos 10 anos da Reforma do Judiciário, é possível identificar avanços e desafios para o horizonte de atuação e, principalmente, estruturação do sistema de justiça brasileiro. Os avanços, verdadeiras conquistas da sociedade brasileira, devem ser reconhecidos como esforços para o desenvolvimento da cidadania brasileira, contudo, é preciso identificar e enfrentar, criticamente, os desafios para a promoção do acesso à justiça no Brasil.

A Secretaria de Reforma do Judiciário (SRJ) é um órgão específico e singular vinculado ao Ministério da Justiça (MJ) que foi criado há 10 anos, tendo como inspiração inicial estruturar, no Brasil, órgãos e instituições competentes para promover e planejar, no âmbito nacional, políticas de acesso à justiça.

Em um primeiro momento, a SRJ canalizou esforços para promulgar a Emenda Constitucional 45, de 2004, que serviu como marco normativo a nortear a reforma do Judiciário e das instituições do sistema de justiça. Com a EC 45/04 muitos avanços foram alcançados em termos de qualificação no acesso. A previsão da “razoável duração do processo” como direito fundamental, a (re) organização judiciária, incluindo a alteração de competências de tribunais superiores e a criação de órgãos específicos, como o Conselho Nacional da Justiça (CNJ) e o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), e a federalização das causas de graves violações a direitos humanos são alguns dos exemplos de alterações viabilizadas pela EC 45/04 e que significaram avanços para a tutela adequada de direitos no Brasil.

No segundo momento, a SRJ concentrou esforços para aprimorar o sistema de justiça, por meio da atualização normativa e compreensão, aprofundada, sobre o acesso à justiça no Brasil. Nesse sentido, foram desenvolvidos estudos de diagnósticos que permitiram a identificação de três principais problemas ou desafios para o sistema de justiça: (a) o excesso de processos judiciais (segundo dados do recente relatório Justiça em números, tramitaram, no ano de 2013, aproximadamente 92 milhões de processos no Poder Judiciário brasileiro, em todas as instâncias), que faz com que a litigiosidade no Brasil atinja praticamente metade da população brasileira (segundo o Censo demográfico realizado em 2010, o Brasil possui mais de 190 milhões de habitantes); (b) a morosidade na prestação jurisdicional (o tempo médio de tramitação de processos é de 10 anos, fazendo com que a resolução de conflitos, no Brasil, ocorra de forma tardia e, consequentemente, intempestiva); e (c) existe um déficit de acesso à justiça no Brasil, decorrente da falta de informações sobre direitos à população e, principalmente, pela deficiência na rede de proteção e garantia de direitos.

O enfoque na formulação de processos de modernização da administração da justiça brasileira e a sua competência para promover a articulação com o sistema de justiça, são pressupostos que permitiram à SRJ avançar, nos últimos anos, em termos de produção de dados e informações sobre o sistema de justiça brasileiro. O diálogo interinstitucional permanente que é estabelecido pela SRJ com outros atores do sistema de justiça permitiu que fossem compilados dados sobre as unidades de atendimento, os serviços prestados e os operadores do direito que são responsáveis pela promoção do acesso à justiça no Brasil. Esses dados, disponibilizados pela rede mundial de computadores pelo Atlas de acesso à justiça, permitem a identificação de um retrato do sistema de justiça brasileiro. São mais de 17 mil magistrados, mais de 12 mil promotores de justiça e pouco mais de 6 mil defensores públicos. De imediato, percebe-se o desequilíbrio de um sistema, que privilegia os órgãos de julgamento e acusação, em detrimento da defesa. Em um Estado Democrático de Direito, que possui, como premissa, o contraditório, esse desequilíbrio não pode prosperar.

Na terceira fase, experimentada atualmente, os desafios são no sentido de projetar políticas públicas de acesso à justiça, qualificando e garantindo a efetividade do sistema.

Como estratégias para superação dos desafios, desses verdadeiros obstáculos para o acesso à justiça no Brasil, é possível destacar algumas inovações, que estão sendo concebidas e defendidas pela SRJ-MJ.

A primeira estratégia é nivelar as instituições, conferindo autonomia e independência a todos os órgãos e instituições essenciais à Justiça, além de estruturá-las de modo que em todo o território nacional seja encontrado um defensor público para cada promotor de justiça e magistrado. Nesse sentido, destaca-se a Emenda Constitucional 80, recém-promulgada, que prevê a existência de um defensor público para cada unidade de jurisdição brasileira. A existência de defensores públicos em todas as comarcas do Brasil com certeza significará avanço significativo na tutela de direitos. Ainda no tocante à estruturação da instituição, faz-se essencial enfrentar um segundo desafio: o de criar e estruturar um Conselho Superior da Defensoria Pública, que possibilite representação adequada para que essa instituição essencial à democracia brasileira faça-se presente nas diferentes instâncias de discussão interinstitucional e de políticas públicas.

Na segunda estratégia ressaltam-se, como fortalecimento do acesso à justiça no Brasil, as iniciativas que visam mitigar a cultura do litígio. Fundamental e urgente é a aprovação do projeto de lei que disciplina a mediação judicial, extrajudicial e pública em nosso país.

Integram ainda essa gama de ações, a definição da estratégia nacional para redução de litígios, a instalação de centros de mediação e resolução extrajudicial de conflitos nas diferentes localidades do Brasil (de que são exemplos as Casas de direito e os projetos de Justiça comunitária em desenvolvimento), e a consolidação dos meios alternativos de solução de conflitos.

Por último, mas não menos importante, é o aprimoramento na gestão judiciária. Há que se estimular a implantação do processo judicial eletrônico em todo o país, garantindo maior transparência, controle e rapidez na tramitação processual. Também nos parece fundamental a criação de um corpo de profissionais que consiga dedicar-se, exclusivamente, à função de administração judiciária. Nesse sentido, a estruturação das carreiras de gestor de política judiciária e a de administrador judicial figuram como alternativas possíveis. A carreira de gestor de política judiciária é similar à existente no Poder Executivo, tendo como função ajudar na elaboração e execução do planejamento estratégico do Judiciário. Quanto ao administrador judicial, trata-se de carreira que conta com profissionais com formação técnica específica, e que são encarregados de auxiliar os juízes na administração dos cartórios judiciais.

Um país com menos processos, com menos litígios, com mais diálogo e com mais direitos. Esse é o desafio colocado no limiar do decênio da reforma do Judiciário.

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