Pagamento de precatórios

Quando a cautela da Justiça ofende o contribuinte

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  • Ana Paula Siqueira Lazzareschi de Mesquita

    é sócia-fundadora do Siqueira Lazzareschi de Mesquita Advogados mestre em Direito Civil Comparado pela PUC-SP pós-graduada em Direito Empresarial pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e membro da Comissão de Direito Digital e Compliance e da Coordenadoria dos Crimes contra a Inocência da OAB-SP.

13 de junho de 2014, 8h23

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, determinou a suspensão de mandado de segurança em tramitação no Tribunal de Justiça de São Paulo que trata do pagamento de precatórios. A decisão foi tomada, em caráter liminar, nos autos da Reclamação (RCL) 17471, ajuizada pelo governo paulista, e vale até o julgamento de mérito da ação.

Quando isso vai acontecer? Não há qualquer previsão. O que está em jogo? O pagamento de dívidas do Estado de São Paulo para milhares de contribuintes, em sua esmagadora maioria, pessoas físicas, dos quais parcela importante de funcionários públicos, de todas as classes sociais, que nos últimos 30 anos pelo menos, tiveram bens destruídos total ou parcialmente, desapropriados ou foram vítimas de atos de ilegalidade do Poder Público. E vidas foram ceifadas ou brutalmente alteradas por via direta ou decorrente da ação de agentes públicos em acidentes, crimes, atos de negligência, imperícia ou impudência dos últimos.

Preocupados com o Estado e não com os cidadãos, diversos juízes, incluindo desembargadores e ministros, quando decretam essa forma de medida, sempre atribuem sua decisão ao "poder geral de cautela".

No caso em questão, sob alegação de que há erro de cálculo de R$ 83 milhões de reais para cima, o Estado de São Paulo pretende postergar e decisão de pagamento de precatórios. São Paulo é o segundo o maior devedor de precatórios do país, atrás apenas da Cidade de São Paulo.

De acordo com quadro resumo de estoques de precatórios elaborado pela Procuradoria Geral do Estado e Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, de 31 de dezembro de 2013, a dívida soma R$ 16,2 bilhões em 6.110 casos definidos pela Justiça. Estima-se quantidade similar em ações que tramitam na Justiça. Como diversos casos dos denominados precatórios alimentares envolvem o funcionalismo público, é razoável supor que haja ao menos meio milhão de pessoas na fila, aguardando o pagamento da indenização ganha no Poder Judiciário.

Na capital paulista, a dívida totalizava 18,2 bilhões em dezembro de 2011, de acordo com o balanço patrimonial consolidado da Prefeitura Municipal. A média da ingresso de novas sentenças precatório na cidade não difere muito do que acontece com o Estado, de R$ 1,6 bilhão ano de precatórios a pagar.

Portanto, a situação torna obrigatória a seguinte discussão junto à Opinião Pública: Até que ponto o Estado será protegido pela cautela em desfavor daqueles que morrem esperando o pagamento de créditos devidos e transitados em julgado? Afirmar que existe uma fila preferencial em pagamento é um insulto ao entendimento do homem médio, tendo em vista os irrisórios valores que são autorizados em sede de levantamento judicial.

Os credores de precatórios são contribuintes do Estado, e, mais uma vez, são ofendidos com medidas que retardam e postergam decisões judiciais definitivas.

Afinal, como todos temos ciência, os tributos devem ser pagos e o Estado de São Paulo muito se empenha nessa tarefa. Empenha-se tanto que cobra dos contribuintes juros acima da SELIC, aprovada em lei manifestamente inconstitucional.

Quanto aos precatórios, socorre-se o Estado do poder geral de cautela, da impenhorabilidade dos bens públicos, das estapafúrdias alegações de excesso de onerosidade aos cofres públicos. Se o Estado fosse adimplente, não teria porque se discutir juros e correção. A dívida é alta por conta da falta de pagamento, em desobediência direta ao artigo 37, caput da Constituição Federal, principalmente em relação aos princípios da legalidade, moralidade e eficiência. Dispõe a Constituição Federal em seu artigo 5º inciso XXXV, que não será excluído da apreciação do Poder Judiciário, não só a lesão de direito mas também a ameaça de lesão ao direito.

Percebe-se claramente que a lesão a direitos fundamentais já ocorreu e é inaceitável a concessão de uma liminar que se revele impraticável na execução da ação principal.

É importante que coma máxima urgência o STF apresente a modulação dos efeitos de sua decisão, para que os cidadãos/contribuintes/credores possam ver (para crer) a Justiça aplicada aos casos concretos julgados pelo Poder Judiciário. 

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