Efeito repristinatório

Para Janot, Supremo não deve mexer em uso da Taxa Referencial para corrigir FGTS

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2 de junho de 2014, 7h01

Para a Procuradoria-Geral da República, a ação que questiona o uso da Taxa Referencial para corrigir o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço não deve ser conhecida e, no mérito, ser julgada improcedente. A tese foi apresentada ao Supremo Tribunal Federal em parecer da quinta-feira (29/5). A questão é tratada em Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada pelo partido Solidariedade para alegar que o uso da taxa, que rende menos que a inflação, para corrigir o índice do Fundo de Garantia fere o direito constitucional à propriedade e ao FGTS.

De acordo com o partido Solidariedade, a aplicação de um índice que rende menos que a inflação à correção do índice do FGTS faz com que o fundo, direito de todo trabalhador, não seja corrigido de acordo com a perda de valor da moeda. Ao longo dos anos, isso acarretou em perdas financeiras aos trabalhadores. Na inicial, o partido pede que o Supremo declare o uso da TR no FGTS inconstitucional e que defina um índice de correção que faça com que o Fundo renda de acordo com a inflação.

Efeito repristinatório
No parecer da PGR, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirma que o pedido do Solidariedade é que o STF substitua um texto legal por meio de uma decisão judicial. Isso seria, de acordo com o documento, uma invasão de competências que poderia levar o tribunal a tomar uma decisão inconstitucional.

O pedido do Solidariedade é que o Supremo reconheça a inconstitucionalidade da regra por omissão parcial, já que haveria “realização incompleta do direito à preservação o valor aquisitivo dos saltos de contas vinculadas ao FGTS”.

Só que, segundo Janot, obedecer ao pedido levaria o Supremo a um paradoxo: pronunciar a nulidade de uma regra para deixar regra nenhuma no lugar, transformando a omissão parcial em omissão total. E se por acaso tentasse suprir essa lacuna legislativa, incorreria em violação ao princípio da separação dos poderes.

É o que Janot chama de efeito repristinatório negativo. O efeito, por regra geral, é quando um ato é revogado por outro e um terceiro ato revoga o ato de revogação. Ou seja, volta-se à situação original definida pelo primeiro ato.

Mas no caso da TR não há situação anterior. Quando da criação da taxa, o índice anterior, o BTN, foi extinto. Caso a lei que criou a TR seja declarada inconstitucional, o BTN não voltaria a vigorar, segundo a Janot. Aconteceria um "vácuo normativo completo".

Para o procurador-geral, a questão tratada na ADI do partido é eminentemente política e deve ficar nessa esfera. Rodrigo Janot afirma que o uso da TR para corrigir o FGTS tem sido feito há mais de 20 anos e, caso o Supremo dê razão ao Solidariedade, as execuções poderiam chegar a 35 anos. “A revisão de parte sensível do sistema deve considerá-lo globalmente, sob pena de o tornar insustentável. Daí a importância de manter esse debate na arena política, onde é possível rearranjo institucional do acordo político em torno do regime do FGTS.” 

Semelhança
Discussão parecida aconteceu quando o Supremo foi instado a julgar a constitucionalidade do valor do salário mínimo (que em 1996, ano do julgamento, era R$ 212), pois era alegadamente insuficiente para suprir as necessidades básicas definidas pelo artigo 7º da Constituição Federal. Mas, seguindo voto do ministro Celso de Mello, o tribunal concordou com a alegação e com o mérito da questão. Entretanto, não conheceu da ação, justamente para não incorrer em substituição inconstitucional do Legislativo.

Envolvidos
A União, por meio da Advocacia-Geral da União, contesta o pedido. Afirma que a TR não é usada apenas para a correção do FGTS, mas é aplicada a uma série de outros contratos, inclusive do Sistema Financeiro de Habitação, destinado a pessoas de baixa renda. O Solidariedade afirma que a Caixa, gestora do FGTS, se apropria indevidamente da diferença entre a TR e a inflação. A Caixa afirma, no entanto, que essa diferença é vinculada, e que quase 80% dessa verba vai para programas do governo federal.

O Banco Central também contesta a ação. Afirma que não existe direito fundamental a correção monetária, e que a fixação de índice de correção do FGTS compete ao Legislativo, e não ao Judiciário. O BC também alega que o direito de propriedade das contas do FGTS está sujeito à função social da aplicação desses recursos.

Clique aqui para ler o parecer da PGR.

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