Inferno de Dante

Cronologia revela falta de motivos para Justiça negar semiaberto a Dirceu

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24 de julho de 2014, 14h50

O sistema judiciário brasileiro é pródigo em exemplos de casos em que se verifica falta de rigor no manejo das regras. Mas também não faltam exemplos de exagero e crueldade — em geral, quando o promotor atende pelo nome de “clamor público” e o alvo das sanções ganha aparência de inimigo público, de forma a justificar o estado de exceção.

Sob o comando do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Joaquim Barbosa, o sistema judicial arrastou por mais de seis meses a análise do pedido de trabalho externo do ex-ministro José Dirceu, preso em regime fechado desde o feriado de 15 de novembro de 2013. O respeito ao cumprimento da pena em regime semiaberto só ocorreu depois que o presidente do Supremo anunciou sua aposentadoria e renunciou à relatoria da Ação Penal 470.

A cronologia do caso mostra como o ministro Joaquim Barbosa, a Vara de Execuções Penais e o Ministério Público do Distrito Federal se apoiaram numa série de boatos para protelar a regularização do semiaberto de Dirceu.

Em 11 de abril de 2014, a própria Procuradoria-Geral da República defendeu o direito do ex-ministro ao semiaberto. Para o procurador-geral Rodrigo Janot, todos os requisitos formais — como a apresentação de proposta de trabalho à Justiça e os termos que explicam a atividade a ser desenvolvida — foram atendidos. O parecer ressaltou ainda que o sistema prisional de Brasília investigou e não encontrou qualquer prova sobre um suposto telefonema de Dirceu dentro da Papuda. Segundo Janot, na avaliação do Ministério Público Federal, não são necessárias “novas medidas” para apurar o caso.

Quase um mês depois, em 9 de maio, o ministro Joaquim Barbosa negou o pedido, alegando que Dirceu ainda não cumpriu o mínimo de um sexto da pena para ter direito ao benefício. A decisão do então relator foi criticada pelo próprio procurador-geral, pela OAB, e por juristas e entidades ligadas ao sistema carcerário. A decisão de Barbosa poderia afetar a vida de quase 80 mil detentos que estão no semiaberto com direito ao trabalho. A defesa do ex-ministro entrou com agravo para que a decisão fosse levada ao Plenário do Supremo. Os advogados também apresentaram pedido de habeas corpus para garantia do direito assegurado pela Constituição.

O agravo da defesa só foi a Plenário depois que Barbosa renunciou à relatoria. O ministro Luis Roberto Barroso foi sorteado como novo relator. No Pleno, o direito de Dirceu foi reconhecido por 9 votos a 1. O presidente Joaquim Barbosa, ciente da derrota que teria perante seus pares, se ausentou da votação.

Preso por 7 meses e meio, Dirceu foi o único réu condenado ao semiaberto a ficar todo o período preso em regime fechado enquanto Barbosa esteve à frente de relatoria da AP 470. Não teve direito aos benefícios previstos em lei, o que denota a clara intenção política em mantê-lo detido em tempo integral. Para manter Dirceu preso, Barbosa também cassou o direito de outros réus condenados na AP 470 ao regime semiaberto.

No julgamento dos Embargos Infringentes, em fevereiro, Joaquim Barbosa já havia admitido que elevou as penas na condenação por formação de quadrilha para assegurar que Dirceu e os demais petistas cumpririam pena em regime fechado. Derrotado pela maioria do Supremo, que absolveu os réus, Barbosa não desistiu de seu objetivo até o limite de sua precoce aposentadoria. Deixou a Presidência isolado dentro da corte e, no meio jurídico, criticado por todos aqueles que entendem que o julgamento e a execução penal da AP 470 foram “um ponto fora da curva” na história do Supremo e do próprio Estado Democrático de Direito.

Confira a cronologia:

18/12/2013 – O escritório de advocacia de José Gerardo Grossi formaliza a proposta de trabalho para José Dirceu. O cargo é para organização e manutenção da biblioteca jurídica, eventual pesquisa de jurisprudência e colaboração na parte administrativa, das 8h às 18h, com uma hora para almoço. O salário é de R$ 2,1 mil mensais. 

19/12/2013 – A defesa de Dirceu requer à Vara de Execuções Penais (VEP) do Distrito Federal autorização para trabalho externo de Dirceu, com base no fato de que a pena de Dirceu se enquadra no regime semiaberto, e de que a lei garante o direito ao trabalho externo; Dirceu possui documentação pessoal em ordem; nenhum aspecto negativo de suas condições pessoais foi vislumbrado pelo STF durante o julgamento ao qual foi submetido; há uma proposta formal de trabalho. 

17/1/2014 – A Folha de S.Paulo noticia que o secretário do governo da Bahia, James Correia, teria conversado com Dirceu pelo celular no dia 6 de janeiro. A história já havia sido publicada no dia 7 de janeiro pelo jornal Correio, da Bahia. A Folha apenas a reproduziu. 

17/1/2014 – Em nota oficial, o secretário James Correia nega que tenha conversado por telefone com Dirceu. Ele já havia contestado a informação dez dias antes, quando o Correio a publicou. A defesa de Dirceu também nega, em nota oficial, que tenha havido a alegada conversa.

17/1/2014 – A Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal abre investigação para apurar o caso. 

22/1/2014  – A investigação da Secretaria de Segurança Pública do DF conclui que o suposto telefonema nunca ocorreu. O Centro de Internamento e Reeducação (CIR), onde Dirceu está preso, afirma que a notícia é inverídica. 

24/1/2014 – Mesmo com a investigação negando a ocorrência do telefonema, a Vara de Execuções Penais do DF suspende por 30 dias a análise do pedido de trabalho externo de Dirceu. Alega que a investigação não ouviu o ex-ministro. 

27/1/2014 – A defesa de Dirceu recorre ao STF contra a suspensão da análise do trabalho externo. A defesa diz que:

– A suspensão se baseou em nota de jornal;
– Uma investigação já mostrou que a conversa nunca existiu;
– Ignorar a conclusão da investigação e tomar uma nota de jornal como motivo é um atentado aos direitos fundamentais;
– A Vara de Execuções Penais agiu de forma ilegal ao determinar diligências em um procedimento disciplinar, já que a Lei de Execuções Penais não lhe dá essa competência;
– Por sua idade, Dirceu tem o direito, garantido por lei, de ter o pedido analisado com prioridade.

29/1/2014 – O presidente em exercício do STF, Ricardo Lewandowski, determina a retomada da análise sobre o trabalho externo de Dirceu. Ele diz:

– Quando a VEP mandou suspender a análise, a investigação já havia mostrado a inexistência da conversa;
– A VEP recebeu o ofício expedido pela Direção do Centro de Internamento e Reabilitação afirmando que nada foi identificado que sustentasse o suposto contato telefônico;
– A VEP também recebeu despacho da Coordenadoria-Geral da Gerência de Sindicâncias da Subsecretaria do Sistema Penitenciário com a mesma conclusão.

3/2/2014 – O relator de uma segunda investigação aberta no Centro de Internamento e Reeducação (CIR) publica despacho concluindo que nada atesta a existência da conversa. O documento acrescenta que Dirceu foi ouvido e os procedimentos legais foram seguidos e observados. Por fim, o relator é taxativo: “Sendo assim, sugere-se o arquivamento do inquérito disciplinar”.

3/2/2014 – O Conselho Disciplinar do Centro de Internamento e Reeducação aprova, por unanimidade, o parecer do relator. 

3/2/2014 – Diante da votação unânime, a direção do CIR determina o encerramento do caso. 

4/2/2014 – A defesa de Dirceu encaminha a Joaquim Barbosa todas essas últimas decisões do Centro de Internamento e Reeducação. 

5/2/2014 – A procuradora Marcia Milhomens Sirotheau Corrêa, do Ministério Público Federal, emite parecer favorável ao trabalho externo de Dirceu. 

11/2/2014 – Apesar da manifestação do MPF emitida seis dias antes, o presidente do STF, Joaquim Barbosa, reverte a determinação de Lewandowski sobre a análise imediata do pedido de trabalho externo, de forma monocrática. Para justificar a decisão, Barbosa alega que Lewandowski deveria ter ouvido o Ministério Público (que já havia dado parecer favorável ao pedido de trabalho) e a Vara de Execuções Penais. Barbosa pede que a Procuradoria-Geral da República se manifeste sobre o pedido de emprego externo e, se for o caso, peça diligências sobre o caso. 

12/2/2014 – A Procuradoria toma ciência da decisão de Barbosa e não faz nenhum pedido em relação a diligências ou outras medidas.

12/2/2014 – A defesa de Dirceu entra com recurso no STF contra a decisão de Barbosa, pedindo que o caso seja levado a Plenário em caráter de urgência. A defesa diz que:

– A conversa telefônica nunca existiu, como já havia atestado a investigação;
– A suspensão da análise ocorreu mesmo após a conclusão da investigação;
– O Ministério Público tomou ciência da decisão de Lewandowski sobre a retomada da análise e não registrou qualquer recurso;
– Por ser idoso, Dirceu tem o direito, garantido por lei, de ter o pedido analisado com prioridade.

Barbosa faz silêncio sobre o pedido. Como presidente, cabe a ele determinar o que entra ou não na pauta da corte. 

13/2/2014 – A defesa de Dirceu encaminha petição a Joaquim Barbosa ressaltando que:

– A VEP suspendeu a análise do pedido de trabalho externo somente até a conclusão da investigação. Com a conclusão atestando a inexistência de falta disciplinar, não há mais motivo para a suspensão;
– O MPF já se manifestou favoravelmente ao trabalho externo. 

24/2/2014 – O juiz Bruno Ribeiro, da Vara de Execuções Penais do DF, adia o depoimento de Dirceu no processo de sindicância que apura o suposto uso do celular. Não foi dada nenhuma justificativa para o adiamento.

25/2/2014 – O Ministério Público envia ofício à Vara de Execuções Penais pedindo rigor na investigação de supostas "regalias" aos petistas. O documento recomenda que, caso sejam constatados os privilégios, que eles sejam transferidos para presídios federais.

Os promotores se baseiam em uma onda de boatos publicados dias antes pelo jornal O Globo que apontam supostas regalias a Dirceu, detido no Centro de Internamento e Reeducação (CIR), e a Delúbio Soares, preso no Centro de Progressão Penitenciária (CPP). O jornal noticiou que parlamentares visitaram Dirceu em horário não permitido e que um vice-diretor do CPP foi demitido por ter obrigado Delúbio a tirar a barba e proibir que um carro da CUT entrasse na penitenciária. Na série de boatos, também acusam Delúbio de ter comido uma feijoada no presídio no fim de semana anterior.

26/2/2014 – O Ministério Público do DF encaminha à Vara de Execuções Penais pedido, sem fundamentação legal, para quebrar o sigilo telefônico de todos os números que tenham feito ou recebido ligações, de 1º a 16 de janeiro, entre a região da Papuda e a Bahia. Além de sem fundamento, o pedido é “equivocadamente” encaminhado à Vara de Execuções Penais, já que não caberia à VEP a abertura de investigação criminal. O juiz Bruno Ribeiro engaveta o pedido por mais de um mês.

27/2/2014 – A partir das reportagens sobre as supostas regalias, o juiz Bruno Ribeiro suspende o benefício de trabalho externo de Delúbio Soares, mandando-o de volta para o regime fechado, e cobra explicações do governador do DF, Agnelo Queiroz.

11/3/2014 – Dirceu é ouvido, por videoconferência, pelo juiz Bruno Ribeiro, na presença de seus advogados e também do Ministério Público do DF, e nega qualquer regalia ou uso de celular.

15/3/2014 – Na mesma semana, a revista Veja viola a privacidade de Dirceu e publica foto do ex-ministro no interior da Papuda. A reportagem de capa denuncia, sem qualquer prova e em um exemplo de antijornalismo, que Dirceu teria uma rotina de regalias no presídio. O objetivo explícito é reforçar a onda de boatos e indispor os petistas com os demais detentos na Papuda.

16/3/2014 – A Secretaria de Segurança Pública do DF promete abrir sindicância para apurar as condições em que o ex-ministro José Dirceu foi fotografado.

25/3/2014 – O governador do DF, Agnelo Queiroz, pede que o Tribunal de Justiça do Distrito Federal analise a conduta do juiz Bruno Ribeiro por não ter apresentado qualquer indício sobre as supostas regalias aos petistas. Agnelo também argumenta que o juiz não teria "jurisdição" para questionar o governador.

25/3/2014 – A Corregedoria do Tribunal de Justiça do Distrito Federal abre sindicância para avaliar se o juiz Bruno Ribeiro cometeu falta disciplinar ao inquirir diretamente Agnelo. O magistrado tem cinco dias para se defender.

25/3/2014 – Após a abertura da investigação pelo TJ, o juiz Bruno Ribeiro anuncia seu afastamento do caso, alegando “motivo de foro íntimo”.

27/3/2014 – O TJ-DF determina a transferência do juiz Bruno Ribeiro da Vara de Execuções Penais para Juizado Especial a partir do dia 2 de abril.

28/3/2014 – Depois de se dizer impedido de julgar e com sua transferência já determinada pelo Tribunal de Justiça, o juiz Bruno Ribeiro encaminha ao presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, dois despachos contraditórios:

– Os autos que encerram a investigação sobre o suposto telefonema de Dirceu no presídio, solicitando que Barbosa decida pelo arquivamento ou punição ao ex-ministro e delibere sobre o pedido de trabalho externo;

– O antigo pedido do Ministério Público, feito mais de um mês antes, para quebrar indiscriminadamente sigilos telefônicos ainda com o objetivo de investigar o suposto telefonema. Em seu despacho, o juiz Bruno Ribeiro explicita o “equívoco” da procuradora Márcio Milhomens, do MP-DF. Ele explica que a Vara de Execuções Penais não tem competência para instaurar apurações criminais como pede o Ministério Público. A decisão caberia e teria de ser apresentada ao ministro relator Joaquim Barbosa.

1º/4/2014 – Joaquim Barbosa endossa a conduta do juiz Bruno Ribeiro e dá prazo de 48 horas para o governador Agnelo Queiroz prestar informações sobre as suspeitas de regalias aos condenados da AP 470. O pedido é feito novamente com base em reportagens publicadas na imprensa.

1º/4/2014 – Joaquim Barbosa também sai em defesa do juiz Bruno Ribeiro. O presidente do Supremo afirma que o magistrado não cometeu nenhuma ilegalidade ao se dirigir a Agnelo e pede ao Conselho Nacional de Justiça, presidido por ele próprio, que reveja a investigação contra Ribeiro e também sua transferência para outra vara no Distrito Federal.

2/4/2014 – O governador Agnelo Queiroz diz desconhecer, oficialmente, as supostas regalias e privilégios aos petistas. Em nota, afirma: “Quase um mês após ter denunciado publicamente que os presos do mensalão estariam sendo privilegiados por receberem, entre outras coisas, alimentação diferenciada e visitas fora dos dias e horários permitidos, o juiz Bruno André Silva Ribeiro ainda não apresentou ao governador Agnelo Queiroz detalhes sobre sua denúncia”.

2/4/2014 – A defesa de Dirceu encaminha petição a Joaquim Barbosa solicitando prioridade na análise do pedido de trabalho externo, uma vez que se trata de preso idoso. A petição reitera que o pedido de trabalho externo foi apresentado em 19 de dezembro do ano anterior e já obteve parecer favorável da Seção Psicossocial e do Ministério Público do Distrito Federal. Diz ainda que a investigação sobre a suposta falta disciplinar está cabalmente encerrada e que a Procuradoria-Geral da República, ciente da apuração, não solicitou diligências e tampouco apresentou argumentos contrários ao pedido de trabalho externo.

4/4/2014 – O CNJ suspende a investigação contra o juiz Bruno Ribeiro até que a Corregedoria do TJ-DF envie justificativas para a abertura do processo.

4/4/2014 – A defesa de Dirceu toma conhecimento, a partir dos autos do processo, sobre o pedido do Ministério Público, encaminhado ao STF, para quebra indiscriminada de sigilos telefônicos. Feito em 26 de fevereiro, o pedido só foi despachado pela Vara de Execuções Penais mais de um mês depois, quando as investigações já estavam formalmente encerradas.

7/4/2014 – Ciente do pedido, a defesa de José Dirceu encaminha ao presidente do Supremo uma nova petição. Reitera que o ex-ministro nunca fez uso de qualquer celular no interior do presídio e alerta para o “patente equívoco do Excelentíssimo Magistrado da VEP que, com um mês de atraso, e depois de se declarar impedido, enviou, equivocadamente, a medida cautelar [que pede a quebra indiscriminada de sigilos telefônicos] ao STF, mesmo diante da manifesta ausência de foro privilegiado do sentenciado”.

9/4/2014 – Em nova petição ao Supremo, a defesa de José Dirceu aponta que o pedido de quebra de sigilos telefônicos apresentado pelo MP-DF, além de ser indiscriminado e sem fundamentação legal, lista coordenadas geográficas que incluem o Palácio do Planalto. A defesa também anexa a declaração do secretário da Bahia James Correia negando qualquer contato telefônico com o ex-ministro.

10/4/2014 – A defesa de José Dirceu pede ao STF medida cautelar com urgência, para que o Plenário da corte determine a retomada da análise do pedido de trabalho externo. Os advogados mostram como a questão é tratada com “flagrante disparidade” pelo presidente Joaquim Barbosa, responsável pelo caso. De acordo com a petição, o ministro atendeu em menos de 24 horas a queixa do juiz da Vara de Execuções Penais contra o governador do Distrito Federal e, em menos de uma semana, Barbosa analisou e cassou decisão de Lewandowski favorável a Dirceu.  No entanto, há dois meses aguardava-se a análise de um Agravo Regimental em defesa do trabalho externo para o ex-ministro. Nota-se que o presidente do Supremo opta pelas decisões monocráticas, protelando que o tema seja analisado pelo Pleno da corte.

11/4/2014 – O procurador-geral da República encaminha ao STF parecer favorável ao pedido de trabalho externo de Dirceu. Para Rodrigo Janot, todos os requisitos formais — como a apresentação de proposta de trabalho à Justiça e os termos que explicam a atividade a ser desenvolvida — foram cumpridos. Janot destacou ainda que o sistema prisional de Brasília investigou e não encontrou qualquer prova sobre o suposto telefonema, determinando seu arquivamento. Para o Ministério Público Federal, também não são necessárias “novas medidas” — como a quebra de sigilos telefônicos pedida pelo MP-DF — para apurar o caso.

15/4/2014 – A Advocacia-Geral da União entra com reclamação disciplinar na Corregedoria do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) contra a promotora Márcia Milhomens Sirotheau Corrêa, que pediu à Justiça a quebra indiscriminada de sigilos telefônicos, incluindo nas coordenadas de latitude e longitude a região do Palácio do Planalto.

23/4/2014 – A Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados acolhe pedido para que um grupo de deputados visite o presídio da Papuda para verificar as condições da prisão. A intenção é averiguar se Dirceu desfruta de "regalias e privilégios" dentro da cadeia.

23/4/2014 – A promotora Márcia Milhomens, do MP-DF, envia petição à Vara de Execuções Penais do Distrito Federal e ao presidente do Supremo Tribunal Federal, reiterando o pedido para investigar se houve ligações telefônicas entre as áreas do Presídio da Papuda e o Palácio do Planalto. Ela alega que depoimentos prestados em "caráter informal" ao Ministério Público serviram de base para seu pedido de quebra de sigilo de celulares do Palácio do Planalto. Sem dar mais detalhes sobre os depoimentos em "caráter informal", a promotora disse que os "detentores das informações" haviam se recusado a divulgar seus nomes ou que suas declarações fossem registradas.

23/4/2014 – O advogado Rodrigo Dall’Acqua, que defende Dirceu, rebate: “Quase dois meses depois de pedir a quebra de sigilo do Palácio do Planalto, a promotora tenta justificar sua ilegalidade, alegando que possui uma denúncia anônima informal. Essa assustadora denúncia fantasma consegue a proeza de agregar os vícios do anonimato com a inconsistência da informalidade. Alguém denunciou não se sabe exatamente o que, não se sabe quando, nem como, nem onde. Pedir uma quebra de sigilo com base nessa leviandade é um atentado ao Estado Democrático de Direito."

"Curiosamente, essa denúncia invisível era mantida oculta pela promotora, que nunca mencionou sua existencia para o juiz da Vara de Execuções Penais, para a defesa ou para o STF. Só veio a aparecer depois que o Conselho Nacional do Ministério Público afirmou que iria investigar o pedido de quebra de sigilo do Planalto. Inevitavelmente surgirá a dúvida: essa denúncia fantasma existia mesmo ou foi criada para que a promotora se defenda perante o CNMP?"

"A promotora vai contra a recente manifestação do procurador-geral da República, que deu o episódio do celular como caso encerrado e pediu o trabalho externo para José Dirceu. A emenda oferecida pela promotora é mais um ato para prolongar a insustentável injustiça que sofre José Dirceu."

25/4/2014 – O procurador-geral da República dá parecer contrário ao pedido de quebra de sigilo telefônico. Para Rodrigo Janot, o pedido da promotora do MP-DF é descabido. “A pretensão de quebra de sigilo, nos termos em que foi feita, viola princípios da proporcionalidade”. Ele aponta ainda um “descompasso” entre o pedido feito e o objetivo alegado.

7/5/2014 – Quase duas semanas depois de Rodrigo Janot descartar a quebra de sigilo telefônico da Papuda e do Planalto, o ministro Joaquim Barbosa adia novamente a decisão sobre o pedido de trabalho externo. Ele solicitou à Procuradoria que se manifestasse sobre a alegação da promotora Márcia Milhomens de que o pedido surgiu a partir de uma denúncia anônima.

9/5/2014 – O ministro Joaquim Barbosa nega o pedido de trabalho externo de José Dirceu. Ele argumenta que o direito só é assegurado a quem já cumpriu um sexto da pena. Diz ainda que a oferta de emprego é uma “ação de complacência entre amigos” e que o escritório, por sua natureza de inviolabilidade, não permitiria a fiscalização do Estado.

13/5/2014 – Os advogados de José Dirceu apresentam recurso à Corte Interamericana de Direitos Humanos pedindo novo julgamento da Ação Penal 470 por desrespeito ao chamado "duplo grau de jurisdição", isto é, o direito previsto pelo Pacto de San José da Costa Rica que garante a todos o direito de recorrer em instância superior.

13/5/2014 – A decisão de Joaquim Barbosa de negar o pedido de José Dirceu é amplamente criticada por juristas e entidades ligadas ao Direito e ao sistema carcerário. O próprio procurador-geral Rodrigo Janot afirmou que a exigência do cumprimento de um sexto da pena não se aplica ao caso de Dirceu porque ele está cumprindo pena em regime semiaberto. A exigência só se aplica aos detentos em regime fechado. O jurista Ives Gandra Martins vai além: Dirceu e outros réus condenados ao semiaberto, mas que cumprem pena no fechado, deveriam pedir indenização do Estado por danos morais.

16/5/2014 – A defesa de José Dirceu entra com Agravo Regimental pedindo que o ministro Joaquim Barbosa leve ao Plenário do Supremo a decisão sobre o pedido de emprego. Os advogados argumentam que a decisão de Barbosa fere, entre outros pontos, o artigo 37 da Lei de Execuções Penais, que exige o cumprimento de um sexto de pena apenas para os presos condenados ao regime fechado. Mostra ainda que o artigo 35 do Código Penal, parágrafo 2º, que trata sobre o semiaberto, é claro ao prever o trabalho externo sem exigir o mínimo de um sexto de pena cumprida.

25/5/2014 – O PT apresenta ao STF uma Arguição contra Descumprimento de Preceito Fundamental, pedindo que a corte fixe uma jurisprudência garantindo a todo preso no regime semiaberto o direito de trabalhar fora da cadeia durante o dia, independentemente de já ter cumprido ou não 1/6 de sua pena.

27/5/2014 – O ministro Marco Aurélio rejeita o pedido do Partido dos Trabalhadores. Ao analisá-lo, afirma que a ação deveria ser arquivada porque o partido usou um instrumento "nobre", porém incorreto, para a queixa em questão. "[A ADPF] não pode ser barateada, não é 'bombril'”, disse o ministro aos jornalistas. Para Marco Aurélio, o correto é que se espere o julgamento, no Plenário do Supremo, dos recursos movidos individualmente pelos condenados que tiveram o benefício cassado ou não autorizado por Barbosa.

27/5/2014 – A defesa de José Dirceu entra com pedido de Habeas Corpus contra as decisões do presidente do Supremo Tribunal Federal, que negou o direito do ex-ministro ao trabalho externo exigindo o cumprimento mínimo de um sexto da pena. No pedido de HC, a defesa de Dirceu acentua que o ministro Joaquim Barbosa atenta contra a liberdade de um cidadão, violando direitos individuais assegurados pela Constituição e afrontando jurisprudência sobre o regime semiaberto.

28/5/2014 – O PT recorre ao Plenário do Supremo Tribunal Federal contra decisão do ministro Marco Aurélio, que rejeitou pedido liminar do partido para revogar as decisões do presidente da corte, Joaquim Barbosa, que cassou os benefícios de trabalho externo dos condenados na Ação Penal 470.

28/5/2014 – A decisão de Barbosa de revogar o trabalho externo aos réus da AP 470 é novamente criticada pelo procurador-geral da República. Para Rodrigo Janot, a mudança de jurisprudência pode causar insegurança jurídica e prejudicar presos nessa situação. “O problema que se coloca em interpretação de Direito é a segurança jurídica. Tínhamos uma interpretação, já de algum tempo, de que não seria necessário o cumprimento de um sexto da pena para que o preso pudesse alcançar o privilégio do trabalho externo. Uma modificação nessa interpretação jurídica pode causar insegurança jurídica. E, em causando insegurança jurídica, pode refletir em demais presos sim”, argumentou Janot.

Para o presidente da OAB, Marcos Vinícius Coelho, a decisão de Barbosa é ‘vingativa’: "Não deve haver vitória do discurso da intolerância e do direito penal do inimigo. Se ele é meu inimigo, não devo cumprir a lei", critica Marcus Vinícius. O presidente da OAB acrescenta: "Essa interpretação vingativa de um caso concreto não pode suscitar prejuízo a 77 mil brasileiros".

10/6/2014 – A OAB do Distrito Federal organiza ato de desagravo ao advogado José Gerardo Grossi depois que Barbosa afirmou que a oferta de emprego a José Dirceu seria uma ação de complacência entre amigos.

11/6/2014 – O presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, expulsa do Plenário do STF o advogado Luiz Fernando Pacheco, defensor do ex-presidente do PT José Genoino. Pacheco foi à tribuna e levantou questão de ordem para que o agravo com pedido de autorização da prisão domicilar fosse analisado pelo Pleno da casa. Barbosa mandou os seguranças retirarem Pacheco do Plenário.

11/6/2014 – O Conselho Nacional da OAB reage à expulsão de Pacheco do Plenário do STF. Veja nota da Ordem:

A diretoria do Conselho Federal da OAB repudia de forma veemente a atitude do presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, que expulsou da tribuna do tribunal e pôs para fora da sessão mediante coação por segurança o advogado Luiz Fernando Pacheco, que apresentava uma questão de ordem, no limite da sua atuação profissional, nos termos da Lei 8.906. O advogado é inviolável no exercício da profissão. O presidente do STF, que jurou cumprir a Carta Federal, traiu seu compromisso ao desrespeitar o advogado na tribuna da Suprema Corte. Sequer a ditadura militar chegou tão longe no que se refere ao exercício da advocacia. A OAB Nacional estudará as diversas formas de obter a reparação por essa agressão ao Estado de Direito e ao livre exercício profissional. O presidente do STF não é intocável e deve dar as devidas explicações à advocacia brasileira.

Diretoria do Conselho Federal da OAB

15/6/2014 – Completam-se sete meses desde que José Dirceu foi preso em regime fechado.

16/6/2014 – Completa-se um mês desde que a defesa de José Dirceu entrou com Agravo Regimental para que o pedido de trabalho externo fosse analisado pelo Plenário do Supremo.

17/6/2014 – Isolado e em conflito com os advogados, o ministro Joaquim Barbosa renuncia à relatoria da Ação Penal 470 antes mesmo de se aposentar. Em sorteio no Supremo, Luis Roberto Barroso assume a relatoria.

18/6/2014 – Novo relator, Barroso promete colocar o julgamento dos agravos em pauta na semana seguinte (a última antes do recesso de julho) e diz: “Quem está preso, tem pressa”.

25/6/2014 – O julgamento dos agravos vai a Plenário. O ministro Barroso vota a favor do cumprimento correto do semiaberto e libera José Dirceu para trabalhar. Para o novo relator, a exigência de se cumprir um sexto da pena não se aplica a réus condenados ao semiaberto. Sua decisão é acompanhada por todos os ministros, com exceção de Celso de Mello. Joaquim Barbosa se ausenta da votação. Em seu voto, Luis Roberto Barroso também não vê impedimento para que Dirceu trabalhe no escritório do advogado José Gerardo Grossi, outro argumento usado por Barbosa para protelar o direito ao trabalho externo.

Na mesma votação, o Plenário do STF negou o pedido de prisão domiciliar a José Genoino, mas Barroso salientou que o ex-presidente do PT terá direito a migrar do regime semiaberto para o aberto no fim de agosto, quando completerá um sexto da pena.

26/6/2014 – O ministro Luis Roberto Barroso também revê a decisão de Joaquim Barbosa e autoriza que outros réus da AP 470 tenham direito ao trabalho externo.

3/7/2014 – José Dirceu começa a trabalhar no escritório do advogado José Gerardo Grossi. O ex-ministro também passa a ter o direito a saídas temporárias, a cada 15 dias, para ficar com a família.

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