Acusação falha

Kassab é absolvido de favorecimento à Controlar

Autor

17 de janeiro de 2014, 12h10

O ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab (PSD) foi absolvido nesta quinta-feira (16/1) na ação que o acusava de dar vantagem indevida à empresa Controlar, responsável pela implantação do programa de inspeção veicular na capital paulista. O ex-prefeito e o ex-presidente da Controlar Ivan Pio de Azevedo eram acusados de crimes previstos na Lei de Licitações, ao manter o contrato da prefeitura com a empresa.

A concorrência pública para concessão do programa de inspeção e manutenção de veículos em uso do município de São Paulo foi aberta em 1995, ainda na gestão de Paulo Maluf (PP), quando foi declarado vencedor do certame o Consórcio Controlar.

Segundo o Ministério Público, porém, a Controlar nunca cumpriu três exigências do edital — disponibilidade de área total mínima de 50.000 m² para instalação dos centros de inspeção; presença de técnico especializado nos quadros da empresa; e capacidade econômico-financeira, com capital social de no mínimo de R$ 30 milhões.

Reprodução
O crime de Kassab teria sido, ainda segundo a acusação, manter o contrato de concessão, “dando causa à vantagem em favor da empresa contratada, sem autorização em lei, no edital e no instrumento contratual, durante a execução do contrato”.

Porém, o Ministério Público “não trouxe aos autos elementos indicando que a decisão do ex-prefeito violou expressamente a lei, o edital da licitação ou o instrumento contratual, como é exigido no tipo penal”, afirmou o juiz Luiz Raphael Nardy Lencioni Valdez, da 7ª Vara Criminal de São Paulo.

A defesa do ex-prefeito, feita pelo escritório Bottini e Tamasauskas Advogados, requereu a rejeição da denúncia ou a absolvição sumária, argumentando que todos os atos de investigação são nulos, porque o Ministério Público não tem poderes de investigação. Já Ivan Pio de Azevedo foi defendido pelo advogado José Luís de Oliveira Lima, do Oliveira Lima, Hungria, Dall’Acqua & Furrier Advogados.

Os advogados afirmam que não houve qualquer ato do ex-prefeito que tenha modificado ou concedido vantagem à parte contratada e que, quando o ex-prefeito determinou a execução do contrato, já estavam preenchidos todos os requisitos exigidos, inexistindo qualquer empecilho ao seu prosseguimento.

Para Kassab, o crime descrito no artigo 92 da Lei de Licitações (Lei 8.666/1993) descreve “comportamento comissivo, positivo, ativo, de modificar ou conceder vantagem”, mas ele apenas negou-se a reconhecer as hipóteses legais de caducidade do contrato, “protegendo a Administração Pública”. Ivan Pio Azevedo pediu sua absolvição sumária, argumentando que o fato é atípico, pois “não recebeu nenhuma vantagem e também não teve qualquer participação na decisão do ex-prefeito”.

O juiz Luiz Raphael Nardy Lencioni Valdez, da 7ª Vara Criminal de São Paulo, negou que haja qualquer ilegalidade no fato de a investigação ter sido feita pelo Ministério Público. “A Constituição Federal determina que a Polícia tem o dever de apurar infrações penais, mas não lhe confere exclusividade para tanto, o que também reforça o argumento de que não há qualquer vedação ao Ministério Público para exercer tal atividade”, escreveu o juiz. Ele lembrou que a questão é “sabidamente controversa” e objeto de discussão no Supremo Tribunal Federal.

Quanto aos fatos apontados, afirmou Valdez, são incontroversos e foram exaustivamente provados documentalmente e pela oitiva das testemunhas de acusação e defesa. Porém, não caracterizam infração penal, pois não ficou comprovado nos autos que a prefeitura tenha dado qualquer vantagem indevida ao contratado.

Uma das falhas na acusação é que o ex-prefeito Gilberto Kassab assinou o despacho que, no entender do Ministério Público, caracterizou o crime em 2007. Nesta data, o contrato com a Controlar estava suspenso — por ordem de 2005, para que o processo de execução do contrato fosse analisado.

As condutas descritas no tipo penal do artigo 92 da Lei de Licitações, porém, devem necessariamente ocorrer durante a execução do contrato celebrado com o Poder Público. “Trata-se de condição temporal do tipo penal. E não foi o ocorrido na hipótese”, explica o juiz. “A interpretação [do tipo penal] deve ser sempre restritiva, pois, do contrário, haveria violação ao princípio base de todo o sistema penal”, lembra Valdez, em sua decisão.

Outro ponto atacado pelo magistrado é que a decisão proferida pelo prefeito de manter o contrato não modificou uma linha do contrato de concessão nem conferiu qualquer vantagem ilegal ao concessionário.

Na decisão, o juiz Valdez também explica que o ex-prefeito não pode ser acusado por algo que não era de seu conhecimento. Isso porque dos três problemas apontados pela acusação, dois deles não foram levados oficialmente ao conhecimento do prefeito e não são tratados no despacho dele tido como ilegal pelo Ministério Público.

Ou seja, a acusação presume, sem elemento de prova, que Kassab era conhecedor de todos os detalhes da concessão cuja licitação datava de 1996 e que há dez anos vinha suspensa por motivos variados. “Tal presunção é inadmissível em sede criminal. Mais uma vez, não se está aqui no campo da improbidade administrativa ou da responsabilização política, mas na seara processual penal, onde ninguém pode ser responsabilizado por fato que foge ao seu conhecimento, apenas em razão do cargo que ocupa.” Uma vez que Kassab não violou a Lei de Licitações, não há que se falar em concorrência dolosa de Ivan Pio de Azevedo, conclui o juiz.

"Os fatos apontados na ação penal e na ação de improbidade foram reconhecidos como inexistentes pelo Judiciário. O prefeito não cometeu nenhum ilícito", resume Igor Tamasauskas, do do Bottini e Tamasauskas. "Com isso, fica esclarecida a questão e desfaz-se o mito de que houve irregularidades na atuação do ex-prefeito", completa Pierpaolo Cruz Bottini, seu sócio. 

Clique aqui para ler a decisão.

*Texto alterado às 10h35 do dia 18/1/2014 para acréscimos.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!