Crimes eleitorais

Resolução que impede MP de investigar divide especialistas

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14 de janeiro de 2014, 9h54

O Ministério Público não pode mais pedir a instauração de inquéritos policiais para investigação de crimes nas eleições de 2014. A medida é uma novas resoluções do Tribunal Superior Eleitoral publicadas em dezembro e valem só o pleito deste ano. Agora, se o MP quiser apurar a prática de crimes eleitorais deverá pedir autorização da Justiça Eleitoral. A nova norma muda o entendimento do TSE. Antes, as resoluções determinavam que o inquérito policial eleitoral poderia ser instaurado por requisição da Justiça eleitoral e do Ministério Público. Porém, para as eleições de 2014 o MP foi excluído.

No TSE, os votos que decidiram pela mudança não foram unânimes. De um lado, o relator da nova norma, ministro Dias Toffoli, defendeu que, na Justiça Eleitoral, o poder de polícia é inerente ao juiz eleitoral. “O inquérito somente poderá ser instaurado mediante requisição do magistrado, salvo em flagrante delito”.

Em relação à questão legal, o ministro afirma que a resolução reflete a jurisprudência do TSE no sentido de que o poder de polícia na matéria eleitoral é exclusiva da Justiça. E compara com o fato de que o Ministério Público não pode abrir investigação contra um parlamentar sem autorização do Supremo Tribunal Federal. “O que não pode haver é uma investigação de gaveta, que ninguém sabe se existe ou não existe. Qualquer investigação, para se iniciar, tem que ter autorização da Justiça", defende. “O que não comporta no Estado Democrático de Direito são investigações que não são transparentes, que não passam pelo crivo do Poder Judiciário, que ninguém sabe que existe e que podem ser usadas para outros objetivos que não o de fazer Justiça”, afirma.

Do outro lado e com o único voto contrário, estava o ministro Marco Aurélio que considerou que o sistema para instauração de inquéritos não provém do Código Eleitoral, mas do Código Penal, “não cabendo afastar essa competência da Polícia Federal e do Ministério Público”. Marco Aurélio apontou ainda uma incongruência no que se reconhece ao Ministério Público a titularidade da ação penal e limita a provocação pela entidade da instauração do inquérito. Desse modo, a polícia pode informar sobre o crime eleitoral, mas não pode instaurar inquérito — previsto no Código de Processo Penal — nem por provocação do Ministério Público.

Fora da corte, a resolução também divide opiniões de especialistas. Em artigo publicado na ConJur, o procurador de Justiça no Rio Grande do Sul Lenio Streck criticou a atuação do TSE e questionou se ele pode produzir leis que interfiram no poder investigatório da polícia e do Ministério Público. Para Streck, ao fazer a alteração, o TSE está protegendo de forma insuficiente bens jurídicos fundamentais, como a moralidade das eleições. “Ao proibir o MP e a Polícia de instaurarem investigações, o Judiciário protege de menos a sociedade, porque dificulta o combate à criminalidade eleitoral”, afirmou.

De mesma opinião, o advogado João José Ramacciotti Júnior disse que qualquer limitação ao direito conferido ao Ministério Público pela Carta Magna, somente poderia decorrer de emenda constitucional, e não de simples resolução do TSE. Para ele, se o Ministério Público, respaldado na Constituição, no Código Penal e no próprio Código Eleitoral, pode de ofício, investigar delitos previstos nestes Códigos, não pode tirar esse poder através de “simples resolução”.

O advogado criminalista Caio Arantes também afirmou que a medida é inconstitucional. “Essa resolução não pode dispor de forma contrária ao Código de Processo Penal e a própria Constituição. Além disso, a resolução atenta contra a função institucional do MP e da polícia judiciária”.

Silvio Salata, conselheiro seccional da OAB-SP e consultor da comissão nacional de Direito Eleitoral do Conselho Federal da Ordem concorda com o possível conflito de normas. Entretanto, ele aponta que restará, na hipótese de aplicação da resolução nas eleições de 2014, dirimir dúvidas das questões diante da competência originária dos tribunais regionais, principalmente da distribuição da atuação dos juízes da Corte e Comissão de Juízes auxiliares. “Não acredito em inconstitucionalidade da resolução já que as disposições do Código Eleitoral supletivamente utilizadas pelo ministro Dias Toffoli foram recepcionadas pela atual Constituição”, afirmou.

Já o presidente da Comissão de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo, Alberto Rollo, é favorável à nova norma. Ele entende que o Ministério Público não pode ter autonomia para instaurar inquéritos policiais de ofício — que só pode ser feito a partir de uma autorização judicial. “O MP é parte no processo e não pode ficar tomando esse tipo de providência por conta própria”, afirmou. Segundo Rollo, na maioria das vezes, o MP é parte do processo e não atua como fiscal da lei. E, sendo assim, o MP não pode agir por conta própria. Além dessa questão, Rollo afirma que a resolução tem efeito de normatizar e por isso pode tirar o poder do MP de pedir investigações de crimes eleitorais.

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