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Resolução do TSE é exótica e inconstitucional, dizem entidades do MP

14 de janeiro de 2014, 19h38

Por Redação ConJur

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As entidades de classe de representantes do Ministério Público emitiram uma nota conjunta na tarde desta terça-feira (14/1) para repudiar a resolução do Tribunal Superior Eleitoral que diz que só o Judiciário poderá autorizar a instauração de inquéritos para apurar crimes eleitorais. Para os promotores e procuradores, a regra padece de “ostensiva inconstitucionalidade”.

De acordo com a Resolução 23.396/2013, se o MP Eleitoral quiser apurar a prática de crimes eleitorais, deve pedir autorização à Justiça Eleitoral. Tradicionalmente, a instauração de inquéritos para apuração de crimes eleitorais é pedida diretamente pelo MP à polícia, sem passar pelo Judiciário.

A nova resolução faz parte das regras definidas pelo TSE para as eleições nacionais deste ano. O relator da medida foi o vice-presidente do TSE, ministro Dias Toffoli, que será o condutor do pleito, em outubro. Para o ministro, a resolução não tem nada de ilegal ou inconstitucional. Explicou que, na Justiça Eleitoral, o poder de polícia é inerente ao juiz eleitoral. “O que não pode haver é uma investigação de gaveta, que ninguém sabe se existe ou não existe. Qualquer investigação, para se iniciar, tem que ter autorização da Justiça", disse.

Mas a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), a Associação Nacional do MP Militar (ANMPM), a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) e a Associação do MP do Distrito Federal (AMPDFT) discordam veementemente do ministro.

De acordo com os procuradores, “a omissão da legimitidade do MP para a requisição deses inquéritos é inconstitucional, exótica, opaca em seus propósitos, imprevisível em suas consequências e atentatória à transparência do pleito e à própria democracia”, conforme diz a nota. Eles afirmam que o artigo 129, inciso VIII, da Constituição Federal diz que é papel do MP requisitar diligências investigatórias e a instauração do inquérito policial.

“O protagonismo da instituição na apuração de delitos contra o sistema eleitoral brasileiro é imprescindível à consecução de eleições idôneas e pautadas pela transparência, como o exigem a sociedade e os eleitores. A tentativa da aposição de obstáculos pretensamente normativos à atuação do Ministério Público no processo eleitoral constitui inequívoco estímulo a crimes como a corrupção eleitoral, o uso indevido da máquina administrativa, fraudes no alistamento eleitoral e outros delitos”, diz a nota enviada pelas associações do Ministério Pública à imprensa.

O presidente do TSE, ministro Marco Aurélio, está do lado dos procuradores. Quando da discussão a respeito da decisão, o ministro ficou vencido. Em seu entendimento, expresso em voto, as regras para a instauração de inquérito provêm do Código de Processo Penal, e não do Código Eleitoral. E o CPP, segundo o ministro, diz que o inquéiro pode ser instaurado de ofício, pela Polícia Federal, por requerimento da Justiça, ou pelo Ministério Público.

Em nota enviada à imprensa, Marco Aurélio pediu aos colegas que acolhessem o pedido de reconsideração da decisão, feito pelo Ministério Público. Ele disse acreditar “na sensibilidade do relator e do colegiado quanto ao acolhimento do pedido”, para evitar “um desgaste maior”, já que a resolução, se mantida pelo TSE, certamente será alvo de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal.

Leia a nota das associações do Ministério Público:
A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (CONAMP), a Associação Nacional do Ministério Público Militar (ANMPM), a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) e a Associação do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (AMPDFT) vêm a público repudiar a Resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nº 23.396/2013, dada sua ostensiva inconstitucionalidade, ao proibir o Ministério Público de requisitar a instauração de inquéritos policiais para apurar crimes eleitorais no pleito de outubro deste ano.

A Constituição Federal, em seu artigo 129-VIII, diz ser função institucional do Ministério Público “requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais”. Além da inteira abstração deste poder-dever do Ministério Público, a resolução afronta também os princípios constitucionais da moralidade e da eficiência.

A omissão da legitimidade do Ministério Público para a requisição destes inquéritos é inconstitucional, exótica, opaca em seus propósitos, imprevisível em suas consequências e atentatória à transparência do pleito e à própria Democracia.

Da forma como perpetrada, a exclusão propicia um duplo casuísmo, tendente a retirar do Ministério Público este tipo de requisição apenas para os crimes eleitorais e, não bastasse isso, circunscrevendo-se às eleições de 2014.

O protagonismo da instituição na apuração de delitos contra o sistema eleitoral brasileiro é imprescindível à consecução de eleições idôneas e pautadas pela transparência, como o exigem a sociedade e os eleitores. A tentativa da aposição de obstáculos pretensamente normativos à atuação do Ministério Público no processo eleitoral constitui inequívoco estímulo a crimes como a corrupção eleitoral, o uso indevido da máquina administrativa, fraudes no alistamento eleitoral e outros delitos.

As entidades representativas do Ministério Público estimam que, por constituir uma desenganada ofensa ao sistema acusatório consagrado na Constituição de 1988, sequer uma emenda à Constituição poderia fazer o que agora tenciona a mencionada resolução, como, de resto, já intentou, sem sucesso, a famigerada Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 37/2011. Assim, a eventual subsistência da aludida resolução apenas traria de volta a sombra da impunidade sobre os direitos e garantias do povo brasileiro.

Confiantes na Justiça Eleitoral, as entidades representativas do Ministério Público Brasileiro aguardam a revisão da resolução pelo Tribunal Superior Eleitoral, a pedido do Procurador-Geral Eleitoral, sob pena do inexorável questionamento de sua constitucionalidade no Supremo Tribunal Federal e sem prejuízo da continuidade do combate aos crimes eleitorais exercido pelos membros do Ministério Público, em prol da sociedade brasileira. 

Brasília, 14 de janeiro de 2014.

Leia abaixo a declaração do ministro Marco Aurélio:
Eu acredito no direito posto. A atuação do TSE, editando resoluções, não é a atuação como legislador, mas como órgão que regulamenta o direito posto pelo Congresso Nacional. No caso concreto, o Código de Processo Penal prevê que o inquérito pode ser instaurado de ofício, pela Polícia Federal, por requerimento de órgão judiciário, ou pelo Ministério Público.

Acredito na sensibilidade do relator e do colegiado quanto ao acolhimento do pedido de reconsideração, feito pelo Ministério Público, evitando-se um desgaste maior, considerada a possível ação por inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal