Financiamento político

Especialistas divergem sobre doações eleitorais de empresas

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4 de janeiro de 2014, 5h23

Especialistas em Direito Constitucional estão divididos quanto à constitucionalidade das doações eleitorais por empresas privadas. O tema está em discussão no Supremo Tribunal Federal. Até agora, quatro ministros já votaram, todos a favor da inconstitucionalidade. Apenas o ministro Gilmar Mendes sinalizou que deve votar a favor do financiamento eleitoral por empresas. O julgamento foi suspenso por um pedido de vista do ministro Teori Zavascki.

Mestre e doutor em Direito pela USP e professor da FAAP, Gustavo Rene Nicolau afirma que há “fundamento de sobra” para o Supremo vetar as doações de empresas. “A Constituição não vê com bons olhos a participação de pessoas jurídicas voltadas para fins lucrativos [nas campanhas]. O interesse e a finalidade delas é o lucro e não o interesse geral, da coletividade ou de um determinado grupo. Às vezes coincide, mas é raro”, opina.

Na avaliação de Nicolau, o voto do relator, ministro Luiz Fux, foi certeiro ao dizer que o exercício da cidadania pressupõe três direitos restritos às pessoas físicas: o de votar, o de ser votado e o de influir na vontade política por meio de instrumentos de democracia direta, como plebiscito, referendo ou iniciativa popular. “A democracia deve ser feita pela participação da pessoa física, desprovida de poder econômico astronômico ou corporativo”, defende o advogado.

Quanto à alegação de que a discussão deveria ser travada no Congresso e não no Judiciário, como defendido pela Advocacia-Geral da União, Nicolau diz não ver fundamento, pois qualquer lei editada pelos parlamentares pode ser contestada pelo STF. “Até mesmo as emendas constitucionais o STF pode dizer que são inconstitucionais. Não é porque é da atribuição do Congresso que o STF não pode decidir. Ele pode dizer que a lei x ou y é inconstitucional.”

Ele reconhece, porém, que a tese por enquanto majoritária no STF colocará a Suprema Corte em rota de colisão com o Congresso. Em dezembro, os presidentes da Câmara, Henrique Eduardo Alves, e do Senado, Renan Calheiros, disseram que o STF estava invadindo uma área do Legislativo ao decidir sobre a doação de empresas. Assim, apesar do placar de 4 a 0 até agora — já votaram Luiz Fux, Joaquim Barbosa, Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso —, ele não descarta uma virada. “Esse componente político pode virar o jogo. Está havendo uma movimentação muito forte do Legislativo.”

Caso o resultado final do julgamento seja pelo veto às doações, nada impede que o Congresso aprove uma Emenda Constitucional que as preveja, de maneira expressa, alerta Nicolau. Há inclusive um precedente. Instituída pela Prefeitura de São Paulo na gestão Marta Suplicy, do PT (2001-2004), a taxa cobrada pela iluminação pública foi julgada inconstitucional pelo STF. Meses depois do julgamento o Congresso aprovou uma Emenda permitindo aos municípios cobrar pelo serviço (EC 39).

Dessa maneira, o julgamento das doações por empresas pode ser apenas o início de uma disputa entre Congresso e STF. “Esse tipo cabo de guerra não é novo. Há muitos capítulos pela frente sobre esse assunto”.

A favor
Silvio Salata, conselheiro seccional da OAB-SP e consultor da comissão nacional de Direito Eleitoral do Conselho Federal, defende a permanência do financiamento empresarial e diz que seu fim seria uma restrição ao Estado Democrático de Direito. “Os diretores de uma empresa têm um direcionamento político, uma empresa têm direcionamento político. Uma empresa pode até patrocinar a candidatura de um diretor”.

Citando estudos de Direito Comparado, Salata afirma que é muito difícil manter as empresas fora do jogo político, e que a melhor medida seria aumentar a fiscalização sobre a origem dos recursos. Como exemplo, cita a possibilidade de punir doações ilegais com multas até cinco vezes o valor da doação. "Isso moraliza o processo eleitoral. Além do caráter pedagógico, a sanção veda a doação ilegal."

Para o conselheiro, a declaração de inconstitucionalidade traria “consequências desastrosas” ao processo eleitoral. “Vai incentivar o ‘caixa dois’. Vamos fechar uma torneira e abrir três”, diz.

Outro argumento levantado por Salata diz respeito às minorias no Congresso. Em sua avaliação, a mudança tende a favorecer os grandes partidos que contam com grandes bancadas ou número expressivo de militantes. "As minorias certamente serão prejudicadas", diz. "Os grandes partidos terão outros meios para viabilizar suas campanhas. E os pequenos?", questiona. 

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