Embargos Infringentes

Condenados no mensalão não formaram quadrilha, decide STF

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27 de fevereiro de 2014, 13h01

A maioria do Supremo Tribunal Federal decidiu que oito condenados na Ação Penal 470, o processo do mensalão, não cometeram crime de formação de quadrilha. Com o placar de seis votos a cinco, o entendimento que prevaleceu na sessão desta quinta-feira (27/2) foi de que os envolvidos não se reuniram para a prática de crime — condição para que a formação de quadrilha fosse caracterizada.

Os ministros Luís Roberto Barroso, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Teori Zavascki e Rosa Weber votaram pela absolvição do crime de quadrilha e, portanto, pelo provimento dos Embargos Infringentes. Vencidos, então, os ministros Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Celso de Mello votaram pela condenação dos réus.

Na prática, o entendimento diminui a pena estabelecida pelo Plenário no julgamento do caso e permite que fiquem de fora do regime fechado o ex-ministro José Dirceu e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, cujas condenações transitadas em julgado somam menos de oito anos de prisão.

Também foi descartada a imputação de crime de quadrilha ao publicitário Marcos Valério e a seus ex-sócios, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach, além dos ex-dirigentes do Banco Rural Kátia Rabello e José Roberto Salgado. Todos já estão no regime fechado, mas a defesa conseguiu diminuir a pena fixada. O ex-presidente do PT José Genoino, também beneficiado, já havia sido condenado ao regime semiaberto.

Carlos Humberto/SCO/STF
Argumentos
Segundo Fux (foto), relator dos infringentes, a formação de quadrilha existe mesmo se os envolvidos se reuniram a princípio para fins legais. Para ele, os condenados associaram-se em um “projeto deliquencial” e sabiam da divisão de tarefas dos demais integrantes para manipular o Legislativo.

O ministro Teori Zavascki foi o primeiro a ler o voto nesta quinta-feira (27/2). Ele apontou a diferença entre formação de quadrilha e cooperação para o crime e decidiu que, no processo do mensalão, houve reunião de pessoas para práticas criminosas. "Um crime cometido por três ou cinco pessoas não significa que tenha sido cometido em quadrilha", disse o ministro. Ele votou pela absolvição dos réus.

Em seguida, e com o mesmo entendimento de Zavascki, a ministra Rosa Weber disse que continuava convencida de que não houve crime de formação de quadrilha. Segundo ela, formação de quadrilha requer que a união de pessoas se faça para a prática de crime. Ela aceitou os recursos pela absolvição dos réus pelo crime de formação de quadrilha por atipicidade de conduta. A partir daqui, mesmo faltando os votos de três ministros, a maioria no STF já havia decidido pela derrubada do crime de quadrilha.

"Chega de ironia e de blasfêmia", disse o ministro Gilmar Mendes ao votar com a certeza de que houve o crime de formação de quadrilha. Para ele, a gravidade dos fatos atenta contra a paz pública, por isso as penas deveriam servir para retribuir o mal causado e impedir a prática de novos crimes. O ministro afirmou ainda que o Brasil saiu "fortalecido" do julgamento do mensalão.

Gil Ferreira/SCO/STF
Durante o voto, Gilmar Mendes (foto) comparou o caso do mensalão ao do deputado federal Natan Donadon, condenado à prisão pela prática dos crimes de formação de quadrilha e peculado em 2013 na Ação Penal 396 e que teve o seu mandado cassado pela Câmara. "Certamente seríamos forçados a conceder Habeas Corpus de ofício ou levar ao Juizado de Pequenas Causas", ironizou.

Logo em seguida, o ministro Marco Aurélio afirmou que houve formação de quadrilha, mas votou pela diminuição da pena. Ele fundamentou o voto no sentido de que houve a "permanência, estabilidade e entrosamento” quanto à prática do crime.

Marco Aurélio criticou a atual composição da corte que, segundo ele, fez “do dito pelo não dito”, já que, na primeira fase do julgamento — com os ministros Ayres Britto e Cezar Peluso —, os réus foram condenados por formação de quadrilha. E agora, com os ministros Luís Roberto Barroso e Teori Zavascki, a decisão da maioria levou à absolvição do crime.

No mesmo sentido, Celso de Mello votou pela condenação dos réus por formação de quadrilha — crime que, segundo ele, por sua simples existência, constitui "agressão permanente contra a sociedade civil". O ministro disse que os réus são "delinquentes, agora condenados travestidos então da condição de altos dirigentes governamentais".

Por último, o presidente da corte, ministro Joaquim Barbosa, disse que foi formada uma “maioria de circunstância” para acabar com o julgamento anterior. Segundo ele, o objetivo foi de “reduzir a nada” o trabalho que fora feito. Ele disse que os crimes contra o sistema financeiro nacional de corrupção ativa e passiva e peculato estão provados e documentados. “Como sustentar que isso não configura quadrilha?”, questionou.

Barbosa chamou de “argumentos espantosos” aqueles que entenderam que não houve formação de quadrilha e que se “basearam apenas em cálculos aritméticos e em estatísticas totalmente divorciadas da prova dos autos, da gravidade dos crimes praticados e documentados", afirmou. Em relação ao “entendimento implícito" dos ministros de que para haver a formação de quadrilha os membros devem viver do crime, Barbosa afirmou então que esse tipo penal só poderia ser cometido por "desempregados" ou "marginais".

Nelson Jr./SCO/STF
Embargos Infringentes
Os oito réus tiveram direito aos Embargos Infringentes porque, no julgamento sobre o mérito da AP 470, haviam conseguido ao menos quatro votos a favor da absolvição especificamente para o crime de quadrilha. A maioria dos advogados seguiu o argumento de que não há provas de quadrilha nos autos e que os clientes se reuniram para atividades lícitas, seja um partido ou uma empresa. Marcelo Leonardo (foto), defensor de Marcos Valério, afirmou que as agências de publicidade DNA e SMP&B desenvolviam trabalhos regulares, com propagandas premiadas.

Ainda está na pauta do STF a análise de Embargos Infringentes que questionam a condenação por lavagem de dinheiro do ex-deputado João Paulo Cunha (PT-SP), do ex-assessor do PP João Cláudio Genu e de Breno Fishberg, ex-sócio da corretora Bônus Banval — que, segundo o Ministério Público Federal, foi usada para a prática de lavagem.

Bate-boca
O julgamento havia começado na quarta-feira (26/2) e a sessão foi encerrada com quatro votos a favor da absolvição e apenas um contrário. Na ocasião, o presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, abriu um bate-boca no Plenário após o ministro Luís Roberto Barroso apresentar tese de que o crime de quadrilha já prescreveu.

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