Fornecimento de gás

Redação contratual define natureza de cláusula take or pay

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17 de fevereiro de 2014, 13h51

Repetidamente, nos primeiros meses do ano, a cobrança da cláusula “take or pay” motiva debate entre consumidores e fornecedores.

Amplamente utilizada no fornecimento de gás, a cláusula “take or pay” tem por embasamento a diferença de volume, entre o volume consumido e o volume contratado. No Brasil, esta diferença é apurada anualmente, pelo fornecedor, na primeira quinzena de cada ano e, sucessivamente procede a cobrada do consumidor.

No segmento de gás esta obrigação é muito difundida, mas não ficam restritos ao gás natural, outros produtos, principalmente os gasosos, tais como: hidrogênio, oxigênio, etc., utilizam-se desta disposição.

Os juristas Luis Alberto Ambrósio e Adriano Schnur (2005, p. 80), entendem que “cláusula de “take or pay” é um mecanismo contratual que assegura o pagamento de uma quantidade mínima de gás natural, independentemente do seu consumo. Ou seja, o importador é obrigado a efetuar o pagamento de determinada quantidade mínima de gás natural, mesmo que este não seja efetivamente consumido no período estabelecido contratualmente. O pagamento pelo gás natural não consumido deverá, por sua vez, ser efetuado dentro do prazo estabelecido no respectivo contrato de compra e venda de gás natural.”.

Na mesma linha, entendimento do parágrafo 4º do artigo 1º da Lei 10.312, de 27 de novembro de 2001, esclarece que: “Entende-se por cláusula take or pay a disposição contratual segundo a qual a pessoa jurídica vendedora compromete-se a fornecer, e o comprador compromete-se a adquirir, uma quantidade determinada de gás natural canalizado, sendo este obrigado a pagar pela quantidade de gás que se compromete a adquirir, mesmo que não a utilize.”.

Assim, nos contratos de compra e venda de gás, o fornecedor tem a obrigação colocar à disposição do consumidor certo volume de gás, e o consumidor, por sua vez, tem a obrigação retirar a totalidade volume contratado.

A não efetivação da referida obrigação pelo consumidor, ou seja, de retirar (consumir) a totalidade do volume contratado, dá ensejo a obrigação acessória de pagar. Esta obrigação acessória é a chamada Cláusula de “take or pay”.

Como obrigação, a eficácia da cláusula de “take or pay” será sempre dependente da eficácia da obrigação principal. Portanto, a cláusula de “take or pay” é um dispositivo condicional, uma vez que apenas produzirá efeitos quando ocorrerem às hipóteses expressamente previstas.

Levando as condições do mercado de gás natural, vislumbram-se duas possibilidades de classificar a cláusula de “take or pay” no ordenamento jurídico brasileiro, ou seja, como cláusula penal ou cláusula indenizatória.

Cláusula penal
Sobre cláusula penal, o Código Civil Brasileiro dispõe nos artigos 408 e seguintes que “incorre de pleno direito o devedor na cláusula penal, desde que, culposamente, deixe de cumprir a obrigação ou se constitua em mora.” E ainda, “a cláusula penal estipulada conjuntamente com a obrigação, ou em ato posterior, pode referir-se à inexecução completa da obrigação, à de alguma cláusula especial ou simplesmente à mora.”.

No caso de ser cláusula penal, o Código Civil Brasileiro dispõe que, para exigir a pena convencionada não é necessário que o fornecedor alegue prejuízo.

Segundo acordão do Tribunal de Justiça de São Paulo, a cláusula de “take or pay” traduz-se com uma cláusula penal, ou seja: “A previsão de consumo mínimo de gases, take-or-pay, não afronta a ordem econômica, mas pode configurar abuso, que, se real, reprime-se, porque não passa de cláusula penal. No caso, ausente má-fé da credora, mantém-se rejeição da reconvenção da devedora e mantém-se rejeição da alegação de vícios imputados ao preço e à forma de pagamento. Todavia e em face do consumo mínimo, repele-se pretensão a multas compensatórias fundadas nos mesmos números e em rescisão facultada ao exclusivo alvedrio da fornecedora. Reduz-se a parcial o decreto de procedência da ação e reforma-se a disciplina das verbas de sucumbência.”.

Dentre os requisitos da cláusula penal, a cominatória atende aos requisitos, pois de acordo com a ilustre jurista Maria Helena Diniz (1998, p.599), entende-se por cláusula penal cominatória “aquela pela qual na celebração do contrato, os contratantes estipulam a aplicação de uma penalidade àquele que não cumprir a obrigação de praticar um ato ou abster-se de alguma coisa.”.

Cláusula indenizatória
No caso de cláusula indenizatória, a qual é adotada por alguns países, o “take or pay” tem a característica indenizatória, visto que essa cláusula é aplicada nos contratos de compra e venda de gás, entre os produtores e fornecedores (distribuidores). Portanto, essa obrigação é simplesmente refletida nos contratos entre os fornecedores e os consumidores.

Desde que começou a ser abraçada nos Estados Unidos, na década de 60, a cláusula take or pay tem sido aposta em contratos pelo mundo afora, e reproduzidas aqui no país.

Mas foi na década de 70 que a cláusula de “take por pay” ganhou destaque em contratos de compra e venda. Em virtude da escassez de gás, os produtores procuraram tais cláusulas para protegê-los das oscilações econômicas e assim, manter a demanda do mercado durante a baixa.

O Código Civil prevê que a indenização é proporcional à extensão do dano. Assim sendo, o fornecedor ao aplicar o “take or pay”, estará simplesmente compensando do valor que terá que desembolsar, pois terá que pagar o “take or pay” ao produtor. Deste modo, de forma simplória, se o consumidor não consome o fornecedor não consome e o produtor não vende.

Isso posto, a aplicação da cláusula “take or pay” continuará gerando controvérsias, pois para alguns se trata de penalidade e para outros é indenização. Mas, na verdade, o que irá definir a natureza jurídica da cláusula de “take or pay” será a redação do instrumento contratual.

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