Justiça Tributária

Covardes e omissos não podem ingressar no serviço público!

Autor

  • Raul Haidar

    é jornalista e advogado tributarista ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

10 de fevereiro de 2014, 15h36

Spacca
Embora não pareça, estamos em um Estado Democrático de Direito. As regras que devem prevalecer sobre todas as outras são as que formam a Constituição. Seguem-nas as contidas nas demais leis. Qualquer um pode criticar o que bem entender. Isso faz parte do jogo. Mas quem não aceita as regras, paga o preço.

Mas nós, que temos como compromisso batalhar pela Justiça Tributária e à disposição um espaço privilegiado como este , temos uma responsabilidade um pouco maior.

Não podemos apenas reclamar. Na questão específica da carga tributária, demonstrou-nos o colega Arnaldo Jabor em sua coluna no jornal O Estado de S. Paulo de 8 de janeiro de 2013: “Não adianta anunciar catástrofes; é preciso ensinar a população a se defender do Estado vampírico.”

Pois é nisso em que já se transformou a pátria amada: um Estado que suga o sangue de seus cidadãos comuns, permitindo que alguns outros, que deveriam ser servidores do povo, ,imaginem-se portadores de catalepsia ou porfíria. Nessas doenças, a pessoa fica com os sinais vitais quase imperceptíveis, enorme palidez, sensibilidade à luz solar, etc.

Foi quase uma vampira que eu vi certa vez numa repartição: ao examinar petição para ser juntada em processo administrativo, seu olhar estava perdido no infinito, como se nada daquilo lhe dissesse respeito. Olhando o representante do contribuinte com visível descaso, bateu um carimbo como se fosse o último prego que faltava no caixão de Drácula, seu mestre.

Ora, os servidores públicos deste país exercem atividades importantes e são, em regra, bem remunerados. Quando se aposentam não correm o risco de morrer nas filas da previdência e, com certa freqüência, logo arranjam cargo comissionado que lhes dá conforto maior ainda. Não deveriam ostentar o visível descontentamento pelo exercício de tão invejável emprego.

Há muitos países em que o cargo público é exercido como uma grande honraria para o servidor, independentemente da forma de seleção. Servir a Pátria é o sonho que poucos alcançam e ninguém que tenha honra pretende servir-se dela.

Não podemos mais nos omitir diante dos abusos que vemos em nosso cotidiano. Não podemos mais aceitar atos ilícitos, pois quem assim age torna-se cúmplice no primeiro momento, vítima logo em seguida e refém para sempre. Já em 1650 ensinava o padre Antonio Vieira, no Sermão do Primeiro Domingo do Advento:

“A omissão é o pecado que com mais facilidade se comete, e com mais dificuldade se conhece; e o que facilmente se comete e dificultosamente se conhece, raramente se emenda.”

O Fisco brasileiro, como já mencionamos várias vezes neste espaço, é um dos mais bem preparados do planeta. Não pode e nem precisa praticar o que não lhe permita a lei. Não se lhe permitem iniqüidades, sejam elas quais forem, pois tais servidores são dignos do respeito que os cidadãos de bem lhes dedicam.

Se o bom trabalho do fisco pode viabilizar um crescimento de nossa economia com adequada observância das leis vigentes, eventuais iniqüidades podem gerar péssimas conseqüências. Monteiro Lobato, em sua obra Mundo da Lua, deixou-nos interessante recado:

“A história da civilização cabe dentro da história do fisco. Grandes convulsões sociais, como a revolução francesa, tiveram como verdadeira causa as iniqüidades do Fisco.”

Contribuintes e servidores não são inimigos e não podem assim se comportar. Quando eventualmente surgir questão que deva ser levada ao Judiciário, este não pode se acovardar, pois sua função é fazer Justiça.

Ocorre, com certa freqüência, que as partes estejam equivocadas, pois a lei tributária dá margem a dúvidas. Como já ensinou o professor Ives Gandra da Silva Martins, (Gazeta Mercantil, 30/04/2008):

“A função do Poder Judiciário é fazer justiça, e não assegurar a arrecadação, principalmente quando a qualidade do crédito exigido é contestável.”

Contribuintes e seus representantes não podem ser covardes e, menos ainda, cúmplices de atos ilícitos. Quem tiver vocação para a omissão e o acomodamento, não deve se tornar servidor público, pois essa carreira envolve alta responsabilidade e é valorizada não só pelo que representa para o país, mas principalmente pela qualidade de seus integrantes, submetidos a rigorosos concursos.

Pouco se torna necessário dizer sobre os membros do Judiciário, ante as garantias de que dispõem: vitaliciedade, etc.

Quanto aos membros do Legislativo e Executivo, cabe-nos, através do voto, corrigir o que está errado. O eleitor que vota de forma irresponsável, elegendo pessoas cultural ou, pior ainda, moralmente despreparadas, estes são os grandes culpados pela nossa tragédia, ou, nas palavras de Jabor, pelas nossas catástrofes anunciadas.

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    é jornalista e advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

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