Ultra vires

Tribunal se opõe a juiz que intimou alemães para depor nos EUA

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2 de fevereiro de 2014, 10h31

Um juiz americano pode intimar cidadãos estrangeiros para depor em um processo que corre em um tribunal federal dos EUA? Para o juiz David Herndon, de Illinois, a resposta é sim. Ele intimou 13 cientistas do laboratório alemão Boehringer Ingelheim International GmbH – dez pesquisadores alemães e três americanos residentes da Alemanha – a comparecer em seu tribunal para depor.

Mas o juiz não encontrou apoio suficiente em um tribunal superior para manter sua ordem. O tribunal de recursos de Chicago, Illinois, decidiu, por dois votos a um, que o juiz excedeu sua autoridade, ao ordenar que os depoimentos, que deveriam ser feitos em Amsterdã, Holanda, fossem transferidos para seu tribunal, nos EUA.

De acordo com o site Courthouse News Service, a Boehringer recorreu ao tribunal de recursos porque, além da intimação de cidadãos alemães e de americanos residentes na Alemanha, o juiz impôs uma multa de quase US$ 1 milhão à empresa. Segundo o juiz, o laboratório foi multado porque falhou na apresentação de provas antes do julgamento. A Boehringer teria cometido abusos no processo de “discovery”.

O tribunal de recursos discordou: “Um juiz federal só tem poder de intimar um cidadão americano, que reside em outro país, para comparecer em seu tribunal e depor, apenas se o testemunho do cidadão não puder ser obtido, de alguma outra forma admissível [em outro país] – e esse não é o caso aqui, porque o depoimento seria conduzido em Amsterdã”, escreveu o Juiz Richard Posner, pela maioria.

Se a lei não ampara o juiz para intimar cidadãos americanos que moram na Alemanha, muito menos o autoriza a intimar cidadãos alemães. “Estrangeiros que não estão nos Estados Unidos estão além do poder de intimação de qualquer tribunal americano, mesmo que seus depoimentos ou testemunhos não possam ser obtidos, de uma forma admissível, em qualquer outro lugar”, declarou a decisão.

Posner afirmou que tudo o que o juiz de primeira instância pode fazer com isso é arrumar uma encrenca nas relaações Estados Unidos-Alemanha. “Suponha que a Boehringer reclame ao governo alemão ou mesmo ao Departamento de Estado dos EUA que a ordem do juiz é ultra vires e  que viola a soberania da Alemanha. Nós precisamos disso?”, ele perguntou.

Porém, o juiz David Hamilton apresentou um voto dissidente e ficou do lado do juiz de primeiro grau. “Amplas fontes persuasivas do Direito mantêm que um tribunal pode ordenar funcionários, diretores e administradores de uma empresa estrangeria a comparecer à corte para fazer depoimentos nos Estados Unidos”, ele escreveu.

Embora o juiz tenha ido um pouco mais longe, ordenando à Boehringer que enviasse pessoal não executivo para depor nos Estados Unidos, a legalidade da ordem é passível de debate, conforme precedentes estabelecidos, ele argumentou.

O caso se refere a uma ação movida contra o laboratório, por causa do Pradaxa, um medicamento anticoagulante usado para prevenir acidente vascular cerebral (AVC), que rendeu mais de US$ 1 bilhão à empresa, apenas em 2011. Agora está rendendo dores de cabeça jurídicas para o laboratório, por causa de um rótulo supostamente enganoso.

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