Passado a Limpo

O caso do processo administrativo do extravio dos selos do Correio

Autor

  • Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy

    é livre-docente em Teoria Geral do Estado pela Faculdade de Direito da USP doutor e mestre em Filosofia do Direito e do Estado pela PUC-SP professor e pesquisador visitante na Universidade da California (Berkeley) e no Instituto Max-Planck de História do Direito Europeu (Frankfurt).

18 de dezembro de 2014, 7h00

Spacca
Arnaldo Godoy [Spacca]Em 1920 o Consultor-Geral da República apreciou requerimento de então funcionário do Correio, que pedia restituição de valores que recolhera, para garantir ressarcimento do erário, no contexto de uma auditoria que se fez no Correio da cidade de Uberaba (MG).

Havia se apontado algumas diferenças, em desfavor do Correio, que o responsável teria se apressado em recolher. Ao que consta, percebeu-se o desaparecimento de selos. Ao longo da sindicância apurou-se que os selos desaparecidos os foram perdidos acidentalmente pelo servidor. Este detinha muito respeito da repartição. Comprovou-se que os selos não teriam sido aproveitados por terceiros, bem como não se constatou emissão de vales postais falsos ou simulação de depósitos. Verificou-se também que não teria havido prejuízos para a Administração.

Como consequência, e aplicando juízo de equidade, o Consultor-Geral opinou pela devolução dos valores ao requerente, nos exatos termos do parecer que segue:

Gabinete do Consultor-Geral da República. – Rio de Janeiro, 22 de março de 1920.

Exmo. Sr. Ministro de Estado da Viação e Obras Públicas – Restituo a V.Exa., com o parecer solicitado no aviso n. 429, de 22 de agosto do ano passado, o requerimento em que Afonso Vieira, ex-tesoureiro da Sub-Administração dos Correios de Uberaba, pede restituição da quantia de 2:202$, recolhida à Delegacia Fiscal do Tesouro Nacional no Estado de Minas Gerais, como indenização de selos de depósito, naquela importância, desaparecidos.

Os fatos são estes: a 26 de fevereiro de 1916, a Administração dos Correios naquele Estado ordenou fosse balanceada a Tesouraria de Uberaba. Verificaram-se então, diferenças para menos: de 2:202$ na existência de selos de depósito e de 195$030, de selos ordinários e fórmulas de franquia postal.

Recolheu, por isso, o então tesoureiro, aquelas quantias à Delegacia Fiscal.

Isto posto, atendendo a que dos papeis que instruem o requerimento, se verifica que:

a) aquelas importâncias foram depositadas até ultimação do inquérito administrativo aberto para apurar a responsabilidade do extravio; b) o inquérito concluiu ter sido “claramente constatado que os selos foram acidentalmente (sic) perdidos pelo requerente”; c) afirmando ainda “ter ficado ressalvada a honradez do suplicante, cujo conceito na repartição é tido em alta conta”; d) o pedido de restituição não compreende a importância dos selos ordinários e formulas de franquia, mas tão somente a dos selos de depósito; e) estes não foram aproveitados por terceiros; nem o poderiam ter sido senão pelo requerente ou seus prepostos, se acaso tivessem procedido a emissão de vales postais falsos ou simulação de depósitos da Caixa Econômica Postal, o que não ocorreu; f) a repartição não teve prejuízo, nem correu perigo de o sofrer, – sou de parecer que, por equidade, pode ser deferido o requerimento.

Reitero a V.Exa. os meus protestos de elevada estima e mui distinta consideração.

James Darcy.

Autores

  • é livre-docente pela USP, doutor e mestre pela PUC- SP e advogado, consultor e parecerista em Brasília, ex-consultor-geral da União e ex-procurador-geral adjunto da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.

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