Realidade atual

Reforma trabalhista deve destruir mitos para enfrentar novos desafios

Autor

  • Eduardo Pragmácio Filho

    é sócio do escritório Furtado Pragmácio Advogados doutor em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) pesquisador do Getrab-USP e autor do livro "A boa-fé nas negociações coletivas trabalhistas".

3 de dezembro de 2014, 7h59

Passado o embate político das eleições presidenciais brasileira, há um indicativo de o novo (velho) governo empreender reformas importantes para a modernização do país. Fala-se muito das reformas política e tributária, mas pouco se fala da imprescindível reforma trabalhista, que deve ocorrer em três grandes eixos, no âmbito do direito individual, do direito coletivo e do direito processual.

A septuagenária legislação trabalhista brasileira, consolidada em plena ditadura estadonovista, foi concebida em um cenário social, político e econômico bem diferente da atualidade, pois se baseou, inicialmente, nos mitos da hipossuficência genética dos trabalhadores, da grande empresa e do crescimento econômico contínuo, revelando à época uma legislação extremamente protecionista, derrubando os dogmas do liberalismo contratual da igualdade dos entes contratantes e da liberdade da fixação do conteúdo do contrato de trabalho.

Atualmente, com o advento da globalização econômica e a expansão de um modelo flexível de acumulação do capital provocador da dispersão da produção e da empresa, diante ainda da queda do socialismo e a hegemonia do capitalismo, que concorre consigo mesmo, sem olvidar a crise do Estado Moderno e a ineficácia das normas estatais, o direito do trabalho no mundo se encontra em crise e essa crise também é sentida no direito do trabalho brasileiro. A reforma urge!

Uma verdadeira reforma trabalhista brasileira, no primeiro eixo, deve modificar a legislação obreira, com a adoção de um moderno Código do Trabalho, para deixá-la menos imperativa e detalhista, em que não há espaço para os atores sociais preencherem o conteúdo da norma, para torná-la mais dispositiva e aberta, privilegiando a negociação coletiva e um núcleo-duro dos direitos fundamentais, deixando que empregado e empregadores, por meio de sua representação sindical, preencham o “vazio da lei”.

Essa nova codificação também estaria em consonância com o avanço da tecnologia e seu impacto no contrato de trabalho, protegendo a empregabilidade e não somente o emprego, fomentando a formação profissional, protegendo as minorias e universalizando o trabalho decente, além de observar os direitos fundamentais específicos e inespecíficos dos trabalhadores, dialogando com a carta constitucional vigente.

Quanto ao direito coletivo do trabalho, no segundo eixo, a reforma deve ser mais profunda, alcançando um nível constitucional, pois é necessário afastar-se das nefastas influências corporativistas e autoritárias, fincadas na unicidade sindical, na organização por categoria e na contribuição compulsória, que ainda remanescem na carta política. É imprescindível se alterar a Constituição vigente e adotar no novo código a plena liberdade sindical, privilegiando o pluralismo e a livre organização dos entes sindicais, inclusive no nível da empresa, a negociação coletiva e o diálogo social.

Por fim, no terceiro eixo, a proposta seria revogar toda a CLT no âmbito processual e se criar um rito trabalhista no CPC, unificando o direito processual, adequando-se às novidades do processo comum que está à frente do processo trabalhista em vários aspectos, sendo a execução um bom exemplo, evitando-se, do mesmo modo, a incerteza que paira atualmente em se saber quais ritos se aplicam ao processo trabalhista, se o rito da CLT ou o do CPC.

Essa nova realidade que se apresenta não pode ser alheia nem estranha ao objeto e ao âmbito do direito do trabalho, é necessário fazer um “update” da dogmática jurídica laboral, uma “implosão” de seu edifício dogmático, para fazer frente aos novos desafios que a líquida sociedade pós-moderna provoca: é preciso destruir mitos para reconstruir identidades. Saudações a quem tem coragem.

Autores

  • Brave

    é mestre em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), sócio do escritório Furtado, Pragmácio Filho & Advogados Associados, professor adjunto da Faculdade Farias Brito, em Fortaleza (CE) e autor do livro “A boa-fé nas negociações coletivas trabalhistas”.

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