Racionalidade da jurisdição

AGU defende competência das turmas do Supremo para julgar parlamentares

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2 de dezembro de 2014, 15h40

Não há qualquer inconstitucionalidade na transferência da competência penal originária do Plenário para as turmas do Supremo Tribunal Federal. É o que defende a Advocacia-Geral da União em parecer enviado à Ação Direta de Inconstitucionalidade que discute o caso no STF, ajuizada pela Mesa Diretora da Câmara dos Deputados.

Segundo o parecer da AGU, a Constituição Federal, no artigo 102, diz apenas que cabe ao Supremo julgar os crimes comuns cometidos por parlamentares. Não há qualquer menção à distribuição interna desses casos, desde que eles sejam julgados pelo STF.

A transferência da competência penal do Supremo para as turmas foi feita por meio de uma emenda regimental de julho deste ano. Seguindo proposta do ministro Luis Roberto Barroso, o tribunal decidiu desafogar os trabalhos do Plenário evitando que os onze ministros se reúnam para discutir casos concretos. O espírito da ideia é que o Pleno se dedique apenas a casos com repercussão geral e a ações de controle de constitucionalidade.

Na ADI, a Câmara dos Deputados reclama do que diz ser uma diferenciação entre classes de parlamentares. É que a emenda fala que os deputados e senadores passarão a ser julgados pelas duas turmas, mas os presidentes das Casas continuam a ser julgados pelo Plenário. Segundo a inicial da ação, a emenda regimental viola a regra de que todos os mandatos parlamentares “têm o mesmo valor representativo”.

O motivo real da reclamação, entretanto, é a facilidade com que os parlamentares podem ser condenados com os julgamentos pelas turmas. Os colegiados são compostos por cinco ministros, e as discussões costumam ser bem mais rápidas e harmônicas do que no Pleno. E como são cinco ministros, uma maioria de três votos é suficiente para condenar um deputado à cadeia e determinar a perda de seu mandato.

Pelo menos foi isso o que o presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), disse ao presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski, quando esteve em seu gabinete, dias antes de ajuizar a ADI. Ele e mais 12 líderes partidários foram lá expor sua preocupação depois que o deputado Protógenes Queiroz (PCdoB-SP) foi condenado a dois anos de prisão e à perda de seu mandato.

Iguais e diferentes
No parecer enviado ao Supremo, a AGU rebate a argumentação de que o princípio da isonomia foi violado com a emenda regimental. “O princípio da isonomia permite o tratamento igualitário para os que se encontram na mesma situação, permitindo a desigualdade para os desiguais”, argumenta o texto.

A única ressalva para o tratamento desigual, segundo a AGU, é que “essa distinção se coadune com a ordem constitucional vigente” e que o critério “seja razoável”. “Diante desse cenário, afigura-se plenamente razoável a diferenciação efetuada pela norma regimental sob invectiva, cujos critérios norteadores mostram-se consonantes com aqueles adotados pelo Constituinte Originário. Ademais, não há óbice normativo que impeça a utilização, por ato normativo infraconstitucional, de critério diferenciador já consagrado na Carta Magna.”

Racionalização da jurisdição
Em informações prestadas ao caso, cujo relator é o ministro Gilmar Mendes, o presidente do Supremo contou que a aprovação da emenda regimental  “faz parte dos permanentes esforços de todos os integrantes desta corte na resolução da crise de funcionalidade há muito verificada nos trabalhos do Plenário do STF”. A causa dessa crise, como escreve o próprio ministro Lewandowski, é o “fluxo avassalador de processos àquele órgão”, que leva ao congestionamento do tribunal.

Na ADI, a Câmara dos Deputados afirma que a emenda regimental não poderia transferir o julgamento dos casos penais para as turmas. A interpretação é de que o artigo 5º da Constituição não permite a distinção entre mandatos legislativos. Por isso a emenda regimental seria um “extravasamento da competência normativa atribuída à Corte Suprema”.

Em seu comunicado ao ministro Gilmar, Lewandowski diz que a emenda não pretende diferenciar processos por sua maior ou menor importância, muito menos pela dos réus. “É fruto de uma diretriz programática de racionalidade e funcionalidade atualmente compartilhada pelos membros desta Casa no sentido de que seja reservado ao Plenário, precipuamente, o julgamento dos casos de repercussão geral e dos processos de natureza objetiva”, escreveu o presidente.

A AGU defende a argumentação do ministro Lewandowski. Afirma  que a Constituição Federal não trata das competências e atribuições dos órgãos jurisdicionais e administrativos do Supremo. Ao contrário: diz no artigo 96, inciso I, que os tribunais são competentes para eleger seus próprios representantes e elaborar seus regimentos internos, “dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos”.

Por isso, conclui a AGU, elas podem ser definidas pelo Regimento Interno do tribunal. E no artigo 3º, o RISTF diz que “são órgãos do tribunal o Plenário, as turmas e o presidente”. “Essa diferenciação estabelecida no âmbito da distribuição de competências e atribuições mostra-se essencial para a racionalização da prestação da atividade jurisdicional e encontra-se acobertada pela competência constitucional atribuída aos tribunais para elaborar seus regimentos internos”, diz o parecer.

Clique aqui para ler o parecer da AGU e aqui para ler as informações prestadas pelo ministro Lewandowski

ADI 5.175

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