Regras paulistanas

Plano Diretor tem novas diretrizes, mas efeitos dependem de alguns fatores

Autores

  • Franco Musetti Grotti

    é sócio da área empresarial do escritório Pinheiro Neto Advogados.

  • Fábio Rocha Pinto e Silva

    é mestre e doutor em Direito Civil (USP) doutor em Direito Civil em dupla titulação (Univ. Panthéon-Assas Paris II) presidente da Comissão de Crédito Imobiliário e Garantias do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (Ibradim) delegado do governo brasileiro perante o grupo de trabalho de reforma das garantias da Uncitral/ONU (2015-2018) relator do GET-Garantias (Ministério da Economia) do anteprojeto de reforma das garantias reais no Código Civil participante dos grupos 4 e 5 do IMK responsáveis pela redação da MP 1.085/21 e do PL 4.188/21 advogado atuante na área de Direito Imobiliário e de Financiamento Imobiliário e sócio de Pinheiro Neto Advogados.

30 de agosto de 2014, 9h09

O Plano Diretor é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana dos municípios, exigido para aqueles com mais de 20 mil habitantes, conforme o artigo 182 da Constituição Federal. A Lei Federal 10.257/2001 (Estatuto da Cidade) regulamentou os artigos 182 e 183 da Constituição Federal, instituindo diretrizes para a elaboração dos Planos Diretores e estabelecendo o prazo de 10 anos para a sua revisão.

Em São Paulo, o último Plano Diretor, instituído pela Lei Municipal 13.430/2002, teve vigência de 12 anos. Com a sanção da Lei Municipal 16.050/2014, no dia 31 de julho, passa a viger o novo Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo (Novo PDE), após prolongado processo de revisão na Câmara Municipal. São instituídas novas diretrizes para a organização e o aproveitamento do solo urbano, em especial o macrozoneamento da cidade e novos parâmetros urbanísticos.

Da mesma forma que o plano anterior, o Novo PDE não tem o objetivo de regular o microzoneamento de São Paulo, que permanece a cargo da Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (LPUOS – atualmente Lei Municipal 13.885/2004), e dos Planos Regionais Estratégicos das Subprefeituras. A partir de agora, deverá também ter início o processo de revisão da LPUOS e dos Planos Regionais.

O Novo PDE tem entre seus objetivos mitigar o padrão de urbanização periférica, reverter a perda populacional das áreas centrais e causar seu adensamento, promover a habitação social e combater o déficit habitacional, promover o uso do transporte coletivo público e orientar o desenvolvimento imobiliário nas áreas dotadas de infraestrutura. Trata-se, portanto, de norma de organização do espaço que pretende efetivamente dirigir o desenvolvimento da cidade, mediante a adoção de limitações e incentivos.

Há, de um lado, áreas que o Novo PDE pretende desenvolver e adensar. As áreas localizadas nas proximidades dos eixos atendidos pelo transporte coletivo público passam a contar, mediante o pagamento de outorga onerosa, com o coeficiente de aproveitamento máximo igual a quatro vezes a área do terreno, mesmo parâmetro disponível em áreas das Operações Urbanas Consorciadas Faria Lima e Água Espraiada, e que permitiu o adensamento das regiões das Avenidas Faria Lima, Luís Carlos Berrini e Chucri Zaidan. Dessa forma, incentiva-se o crescimento da cidade orientado pela expansão do transporte coletivo público.

São estabelecidas, entretanto, novas diretrizes para o aproveitamento dos terrenos servidos por infraestrutura de transporte: há limite máximo do número de vagas de garagem, para empreendimentos comerciais e residenciais, e limite mínimo do número de unidades, no caso dos residenciais (a chamada cota-parte máxima de terreno). Há também claro incentivo ao desenvolvimento de empreendimentos de uso misto, pretendendo isentar o empreendedor do pagamento da outorga onerosa correspondente às áreas destinadas ao comércio no pavimento térreo de edifícios residenciais e ao trânsito livre de pedestres (fruição pública).

Tais incentivos poderão resultar em incremento adicional do potencial construtivo disponível e pretendem orientar uma mudança no perfil dos novos empreendimentos a serem desenvolvidos próximos ao transporte coletivo público, maximizando o adensamento, com unidades pequenas, desestimulando o uso de veículo próprio e estimulando as edificações mistas e abertas à rua.

O Novo PDE também traz incentivos à chamada Macroárea de Estruturação Metropolitana, que abrange, entre outros, os entornos dos rios Pinheiros, Tietê e Tamanduateí, incluindo a zona central de São Paulo, e a Avenida Jacu-Pêssego, na Zona Leste. Nessas áreas não há mudança imediata dos parâmetros urbanísticos, o que dependerá de leis específicas, em cada caso, destinadas a instituir novas operações urbanas ou áreas de intervenção urbana, com investimentos do Poder Público. Previu-se que as novas leis devam ser encaminhadas progressivamente à Câmara Municipal no período de 2015 a 2018. As primeiras áreas contempladas consistirão, provavelmente, nos chamados Arco Tietê e Arco Tamanduateí, que incluem o entorno do Rio Tietê entre a Vila Leopoldina e o Tatuapé, e o entorno do Rio Tamanduateí.

De outro lado, há áreas de urbanização consolidada e não atendidas pelo transporte coletivo público que o Novo PDE pretende conter, com diversas limitações: a manutenção dos parâmetros de Zonas Exclusivamente Residenciais; a redução dos coeficientes de aproveitamento básico e máximo, em geral; a eliminação de regras mais permissivas do antigo Plano Diretor; e a limitação de altura das edificações em oito pavimentos, exceto nas quadras já verticalizadas, verificadas conforme regra definida no Novo PDE. As restrições à edificação e ao adensamento poderão tornar os empreendimentos mais custosos e as unidades mais caras nessas áreas, como tem sido noticiado.

Finalmente, foram contemplados, de maneira mais detalhada que no plano anterior, mecanismos de promoção da função social da propriedade urbana previstos na Constituição Federal e no Estatuto da Cidade, como a demarcação de Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS), destinadas à moradia popular, a regularização fundiária, a outorga onerosa do direito de construir e a instituição de regras de parcelamento, edificação ou utilização compulsórios dos imóveis urbanos pelos seus proprietários, combatendo a ociosidade. Tais mecanismos devem permitir maior facilidade na implantação dos objetivos do Novo PDE pelo município, ao mesmo tempo em que pretendem superar o desafio de viabilizar a promoção de habitações sociais, especialmente pela iniciativa privada.

Os empreendimentos atualmente em análise pelo município, protocolados anteriormente à publicação do Novo PDE e que não sofram modificações significativas, poderão continuar a ser analisados de acordo com antigo plano diretor. Espera-se, portanto, que o Novo PDE passe a influenciar os lançamentos imobiliários de São Paulo, de maneira relevante, apenas em meados de 2016.

A aprovação do Novo PDE não representa a solução imediata dos problemas urbanísticos de São Paulo. Os efeitos no urbanismo e no mercado imobiliário dependerão também da superação de outros desafios, em especial a revisão da LPUOS, a aprovação das operações e intervenções urbanas previstas e o licenciamento de novas obras de transporte coletivo nos prazos divulgados. Resta ainda aguardar a reação do mercado imobiliário e da sociedade aos incentivos constantes da lei, para que os objetivos almejados possam ser efetivamente verificados.

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