Justiça Tributária

Impostos, latas de lixo e cozidos nos Poderes da República

Autor

  • Raul Haidar

    é jornalista e advogado tributarista ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

25 de agosto de 2014, 10h42

Spacca
Justiça é dar a cada um o que é seu. Em matéria tributária, não existe Justiça no Brasil. Nada disso é novidade e não precisamos nos alongar no assunto.

Pagamos tantos tributos que por aí dizem que temos mais de 50 impostos. Talvez esse número seja maior se incluirmos as taxas que nossos governantes criam a cada momento.

Impostos mesmo são 13: sete da União, três dos estados e três dos municípios. Dentre os que pertencem à União, o que seria mais justo até hoje não entrou em vigor, porque nem Legislativo  nem Executivo sabem o que é justo. Trata-se do imposto sobre grandes fortunas.

Também são previstos outros dois impostos de competência da União, um deles em caso de guerra externa. 

Os impostos são totalmente injustos quando atirados às latas de lixo ou usados nos cozidos.

As latas de lixo ou os cozidos são federais, estaduais ou municipais. Nenhum nível de governo deixa de possuir as primeiras ou preparar as iguarias que compõem os segundos.

A União atira ao lixo uma grande parte de nossos sacrifícios, que furta com o codinome de impostos. Esses furtos não resultam apenas da corrupção que atinge a todos os Poderes.

O governo federal transforma impostos em lixo quando os enterra em obras inúteis ou inacabadas, distribui incentivos desnecessários ou admite incompetentes. Tais comportamentos são crimes gravíssimos. Torna-se necessário que sejam tipificados, embora os leitores já os conheçam.

Na área federal, obras de infraestrutura paralisadas, superfaturadas ou inúteis são exemplos de latas de lixo. Basta mencionar a transposição das águas do São Francisco, os estádios de futebol construídos onde não há jogos, pontes que ligam nada a nenhum lugar etc.

Os incentivos fiscais federais são uma “zona”, com o devido respeito às meretrizes. Exemplo disso são as benesses concedidas à indústria automotiva, que, mesmo com o aumento das vendas e a diminuição de seus tributos, continua a formar cartéis, o que fica evidenciado pelo fato de qualquer carro popular chegar a custar o dobro do que carros muito melhores fabricados em outro país. Se as vendas diminuem, as montadoras despedem empregados, cortam fornecedores ou escravizam suas vendedoras, apelidadas de concessionárias. Tal indústria tem uma única finalidade: enviar lucro para as matrizes.

A União também atira impostos ao lixo quando cria varais rotulados de ministérios, para receber cabides onde se penduram morcegos que se alimentam de nosso sangue.

Estados seguem as lições de Brasília: muitas obras são inúteis, mal acabadas e superfaturadas. Há estradas onde o asfalto é uma pincelada de tinta preta sobre a terra. Criam-se hospitais sem equipamentos, médicos, enfermeiros, medicamentos ou esparadrapos. Também contratam gente sem concurso, assessores incompetentes, ignorantes e vagabundos.

Nos municípios, as latas de lixo também estão cheias e os cozidos são muito indigestos, mas apreciados. Para isso foram criados quase 6 mil municípios pequenos. Não se consegue pagar salários a  mais de 60 mil pessoas cuja maioria vai ao emprego uma vez por semana.

Nessas cidades multiplicam-se os delitos: servidores trabalham em propriedades do prefeito; merendas escolares são desviadas, superfaturadas ou entregues em quantidade e qualidade inferiores às contratadas. Tem mais: uso abusivo de veículos, construções em terrenos particulares, creches horríveis, professores com salários irrisórios etc. Mais ainda: festas religiosas, folclóricas ou de peões profissionais, cujos custos deveriam ser suportados pelos crentes das seitas, pelos apreciadores dessas fantasias ridículas ou ainda pelos patrocinadores das festas de peão que ali faturam e quem goste do sofrimento de animais que pulam em decorrência da dor produzida por instrumentos de tortura — cordas apertadas na região  genital, chicotadas, ferimentos por esporas, fogos de artifício, gritos histéricos de idiotas de chapéu e o som ensurdecedor do local.

Nos grandes municípios, as latas de lixo são maiores e os cozidos, mais indigestos.

Empresas e secretarias municipais repletas de servidores sem concurso ou treinamento possuem equipamentos superados.

Não há creches, escolas, postos de saúde ou salários decentes para professores, médicos e servidores que trabalham. Mas pintam-se faixas nas ruas com pavimentos de má qualidade, com tintas e acabamentos piores. Fazem pistas de skate em praças e assim possibilitam que jovens coloquem vidas em risco, quando rolam pelas ruas. Sobram verbas para atividades de duvidosa utilidade: museus vazios de obras e visitantes, teatros onde ninguém comparece, centros culturais onde só estão presentes ícones da ignorância. Nesses monumentos ao nada, há funcionários contratados para a ociosidade. Ocorrem outros ilícitos cuja descrição não cabe neste espaço.

Sabemos para que servem latas de lixo e o que se atira nelas. Cozidos são curiosas misturas de ingredientes: carnes bovinas e suínas, partes de frangos e, em alguns casos, de peixes e crustáceos. Colocam-se vários legumes, tubérculos, cebola e alho. Acrescentam-se temperos: sal, pimenta,  gengibre em pó, coentro, alecrim etc. Se fizer algum mal, nem o IML identificará a causa mortis.

Isso define como são criadas as formas de colocar nas latas de lixo ou no cozido aquilo que pagamos a quem chamamos de governo. Aí fica a pergunta que já foi feita: vale a pena pagar impostos no Brasil?

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    é jornalista e advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

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