Processo de inclusão

Estado deve dar condições para que cota de deficiente seja preenchida

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17 de agosto de 2014, 9h15

Muito se fala sobre a aplicabilidade da Lei 8.213 de 24 de julho de 1991 que regulamenta a contratação de deficientes físicos. Referida lei dispõe no artigo 93 que as empresas com 100 ou mais empregados estão obrigadas a preencher de dois a cinco por cento dos seus cargos com beneficiários reabilitados, ou pessoas portadoras de deficiência, respeitando a proporção que consta no próprio artigo.

A título exemplificativo, uma empresa que conta com 3 mil empregados na sua base (verificada através da emissão do Caged), deverá contratar 150 pessoas portadoras de deficiência física. É preciso levar em conta, ainda, que a multa imposta no caso de não preenchimento da cota é elevada e, regra geral, acaba comprometendo o caixa da empresa, para não dizer todo o seu provisionamento e, dependendo da sua estrutura e situação financeira atual, o prejuízo pode ser de tal monta que resulte no encerramento de suas atividades. Portanto, é preciso que a questão referente ao cumprimento da cota seja analisada de forma ampla, levando em consideração não apenas a obrigatoriedade da pessoa jurídica de direito privado, mas, também, a importância da inclusão do deficiente físico na realidade da empresa através da existência de planos específicos de inclusão, bem como a obrigação do Estado em prover condições que viabilizem o cumprimento da cota.

Quanto ao desafio da inclusão, merece destaque a necessidade do deficiente de superar suas barreiras pessoais decorrentes da limitação física, independente do grau de comprometimento que a mesma traz. Tais barreiras vão desde a dificuldade pessoal do deficiente físico proveniente da baixa auto estima, além do estado depressivo que em muitos casos o atinge e, deste modo, tira dele o ânimo para superar suas limitações o que, inevitavelmente, resultará na desistência de suas funções profissionais. Além da questão pessoal, as barreiras também são aquelas que dizem respeito à arquitetura da empresa, bem como da falta de acessibilidade do deficiente, além do baixo nível de escolaridade, dentre outros fatores.

Tudo isso dificulta, para não dizer que impede a efetiva contratação de deficientes físicos, mas, além da contratação, são fatores que vão contra a permanência do deficiente como empregado da empresa que o contratou, razão pela qual o processo de inclusão deve inserir todos os empregados que com o deficiente físico estejam envolvidos, a fim de proporcionar uma conscientização geral de todos os seus colaboradores.

Um estudo recente feito pela Delegacia Regional do Trabalho (DRT-SP) aponta que das 7,7 mil empresas que necessitam cumprir a cota no Estado de São Paulo, com a obrigação de contratar de 2% a 5% de funcionários com deficiência, apenas 4 mil tiveram condições de efetivar a contratação. Outro dado importante é que 35,7 mil já foram contratados, mas, para que a lei seja cumprida, esse número tem de chegar a 132 mil indivíduos empregados. Ou seja, em tese, há quase 100 mil vagas no mercado.

O outro aspecto que deve ser destacado é quanto à obrigação do Estado em participar de todo este processo de inclusão, buscando, ao lado da iniciativa privada, oferecer opções para que a cota de deficientes seja preenchida. Refiro-me a medidas que vão desde o estabelecimento de parcerias com empresas direcionadas para este fim, acompanhando efetivo do Estado sobre o cumprimento das medidas direcionadas, gestão do Governo Estado sobre tais medidas e, em última análise, a imputação de responsabilidades ao órgão estatal pela inobservância de tais preceitos. Doutra banda, se o Estado fiscaliza o cumprimento da cota através de procedimentos realizados pela DRT-SP (somente no primeiro trimestre de 2014 foram 2.694 empresas foram alvo da fiscalização), há também que exercer sua função social, proporcionando medidas que tornem possível a contratação, e não visando unicamente a arrecadação que decorre da aplicação da multa imposta pelo não cumprimento, em torno de R$ 1,1 mil por pessoa não contratada.

Daí porque a participação do Estado no cumprimento da cota é obrigatória e a ele compete em primeiro lugar conferir efetividade ao disposto na Lei 8213/1991, estabelecendo planos específicos de ação que possam permitir a inclusão do deficiente físico e, com isto, tornar o cumprimento da cota em uma realidade possível.

Seguindo esta premissa, merece destaque a atuação do Poder Judiciário, tendenciosa em aceitar os pedidos formulados nas ações ajuizadas perante a Justiça do Trabalho, para que seja anulada a determinação de pagamento da multa aplicada pelo não cumprimento da cota, quando for demonstrado que a empresa dispendeu de todos os esforços para que tal preenchimento acontecesse.

Neste contexto, decisões recentes foram proferidas neste sentido, como ocorreu, por exemplo, em decisão proferida recentemente pela juíza da 62ª Vara do Trabalho de São Paulo que, tendo recebido como garantia o valor referente à multa imposta, determinou o cancelamento do auto de infração. E nem se diga que se trata de uma forma de burlar o cumprimento da lei, mas, sim, de exigir do Estado que participe ativamente de medidas que viabilizem o cumprimento da lei, ou que o texto legal seja alterado de forma a tornar o cumprimento da cota uma realidade aceitável tanto para a iniciativa privada, como para o próprio deficiente físico.

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